O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quarta-feira, junho 08, 2005

UMA ANTÍTESE INVENTADA
(...)
Entendo que essa antiga e venerável missão das prostitutas é uma ética congenitalmente feminina que só por um desvio de uma religião patrística foi reservada às sacerdotisas do amor a fim de cindir a humanidade feminina na projecção do abominável e do sublime masculino. Uma antítese inventada por esse ser eminentemente melodramático que é o homem, sem a mínima verosimilhança no cosmo da realidade da mulher que não destingue o espírito da carne. Eis porque as mulheres honestas sempre no fundo invejaram as prostitutas e vice-versa.” (...)

In A MADONA de Natália Correia


“JÁ HÁ TRINTA MIL PROSTITUTAS EM PORTUGAL”

Este é o título de um jornal diário de ontem...

Há 30 mil mulheres desgraçadas, sem recursos nem apoios humanos e sociais, de famílias mais ou menos miseráveis, de baixo estrato social e mental, sem qualquer auto-estima ou consciência humana e cívica, praticamente sem escolaridade, com excepção da mais famosa prostituta portuguesa que é bióloga e sabe os meandros da natureza animal...e agora faz gala do seu conhecimento na Quinta das celebridades, ou as tais prostitutas universitárias que vendem sexo para Ter carros e roupas de marcas, todas estas mulheres são vítimas, mesmo as universitárias, de estruturas seculares falocráticas, de mentalidade machista, frutos de sociedades patriarcais de domínio masculino exclusivo!

Sim, ninguém me venha a mim dizer que há prostitutas que trabalham por prazer...ou vocação...como os moralistas, conservadores e os católicos acham, pois são estes os directamente culpados desta dicotomia ou divisão estrutural que a mulher sofreu ao longo de milénios e disso beneficiam directa ou indirectamente! São eles que acham que está bem assim e que esse papel corresponde a uma realidade atávica da mulher...
Dizem a “mais antiga profissão do mundo” e não é verdade! Há um erro histórico e cultural, absolutamente redutor e falso, que fez da mulher apenas um instrumento de prazer ou de procriação.
A dominação de metade da humanidade por outra metade nem sempre foi a regra do mundo. Houve sociedades igualitárias e pacíficas em que a mulher e o homem eram respeitados como seres diferentes mas complementares e cada qual cumpria a sua parte em harmonia. Quando essas sociedades foram invadidas por bárbaros vindos das Estepes e destruídas de raiz, os vencedores que matavam os homens fracos e as mulheres velhas, guardavam para eles as jovens que trocavam entre si ou ofereciam como despojos de guerra aos amigos e heróis como aconteceu com Aquiles e outras bestas da história guerreira dos homens...


Antes disso as mulheres eram livres e amantes e não havia pecado...

A Natureza e o seu culto era a força instintiva da vida mas também do divino que se cultivava e as Mulheres representavam esse amor e a dádiva da criação. O sexo era parte integrante dessa dádiva de amantes e as oferendas à Deusa no seu altar, não significavam “venda” mas gratidão pelo amor, cura ou iniciação sagrada a que as mulheres mais sábias e belas se dedicavam...
Só depois das religiões dos patriarcas do deserto, o deus macho dos invasores e os seus sacerdotes guerreiros, nomeadamente depois do cristianismo, as sacerdotisas e as mulheres sábias e livres começaram a ser perseguidas ou apedrejadas, tal como o foi Maria Madalena por Pedro o misógino e mais tarde retirado dos evangelhos o seu testemunho vivo da ressurreição de Cristo.


Para eles, toda a mulher que não é comerciável (escrava) é descartável...
Essa foi a “educação” que lhe impuseram Religião e Estado!
Toda a mulher que não se casa, se submete, e assina contrato para fabricar filhos do homem, é condenada ou suspeita de ser uma p...
Não tem salvação nem direito a uma vida digna. É sempre ameaçada. Como o é mulher moderna, livre, ou pretensamente emancipada e mesmo que seja honesta e auto-suficiente não escapa ao estigma e não deixa de ser julgada e olhada pela sociedade como uma ave rara...
Esta mentalidade dura desde que nos primórdios o cristianismo se começou a perseguir as sacerdotisas da grande Mãe e se impôs à mulher o comércio do casamento entre famílias que a vendiam ou trocavam por vacas como ainda acontece em muitas partes do mundo dito não civilizado, mas que só varia de pagamento no Ocidente, onde em vez de gado, trocam-se influências, nomes, casas e propriedades que se juntam ao património do marido ou do dono! Todas as outras mulheres, que não eram susceptíveis de interesse burguês, ou eram servas ou criadas, muitas vezes criadas para todo o serviço e as mais afoitas ou mias espertas iam para os prostíbulos ou as madames tomavam conta delas...

Era assim e continua a ser assim...
Agora as mulheres vendem-se nas estradas, nas avenidas, nos Bares...
São mais de 30 mil em Portugal...ou muito mais de 30 mil...

Mas não são só portuguesas...são eslavas, brasileiras, ucranianas africanas e moldavas...
Têm pais e irmãos e maridos que as vendem, chulos que as exploram ou Mafias que as escravizam e delas fazem tráfico...

Tudo isto é verdade em plena luz do dia e no século XXI...

Mesmo aqui diante da nossa cara ou ao nosso lado e todas desviamos o rosto indignadas... Nós mulheres, nós todas a metade explorada, aceitamos esta cisão do nosso ser em duas e essa divisão da nossa natureza que não separa a alma do corpo, mas a isso fomos obrigadas pelos patriarcas, e assim julgamo-nos diferentes das nossas irmãs que vivem as nossas metades reprimidas, as prostitutas, sem direito à dignidade, e a que se exponham nas ruas e sejam violentadas, abusadas, exploradas e às vezes mortas.


NÓS MULHERES AINDA NÃO ACORDÁMOS DESTE MÁU SONHO OU PESADELO QUE OS HOMENS PARA NÓS CRIARAM E CONTINUAMOS SUAS CUMPLICES AO ACEITAR ESTA DIVISÃO DO NOSSO SER, DO NOSSO CORPO E DA NOSSA ALMA...

CONTINUAMOS A CONVIVER COM TUDO ISTO COMO SE NÃO FOSSE NADA...


Sim, porque nós continuamos a ser, afinal de contas, as mulheres sérias e as mulheres honradas, as que nos vendemos a um marido ou a um patrão, mas não ao homem da rua, claro...

E “ELAS”, são só as prostitutas de rua e são assim porque quiseram, não é verdade???


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“ - Não és uma verdadeira mulher. Se o fosses saberias que és mais velha do que o homem.”

In A MADONA
Natália Correia

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