O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

sexta-feira, agosto 01, 2014

UM ESBOÇO AÉREO

I-REFLEXÕES...

Oh amo-te tanto, tanto, tanto, mas  tanto, que te odeio...

O amor e o ódio:

São as duas faces da mesma moeda...ninguém odeia verdadeiramente ninguém sem primeiro a amar...e quanto mais amar mais odiará, para isso basta-lhe a dúvida ou a suspeita de poder ser abandonado ou ser traído...
No amor em geral e diante da ideia da perda ou da traição, não raramente o amante que se sente enganado ou preterido, diz odiar o rival mas na verdade não faz mais do  projectar nele o ódio que sente do amante tentando preservá-lo da destruição iminente ou da culpa porque querer salvaguardar ainda a posse desse amor...
Enganamo-nos todos filosófica e culturalmente ao querer pensar que o amor é apenas amor e que o ódio é apenas o ódio...mas não. No caso, e em geral,  até pode o amor ser só um ideal a atingir e se pensa que o que se imagina é o que se sente ou ser só um mito e vivermo-lo como tal e assim o equacionamos...e com o qual nos engarmos com ideais mansas e poéticas mornas; assim como não queremos ver ou aceitar o ódio como parte integrante do amor pela sua intensidade ou ainda não querermos ver que o ódio à partida (sem amor)  possa ser a grande falta de um amor, desejo de amor que se não teve ou não tem...e que sendo de alguém que nos rejeitou daí ter nascido o ódio, seja à mãe - primeiro objecto de amor -  ou ao pai, ao irmão...e esse ódio é posteriormente projectado  no próximo, na humanidade em geral...tal como no rival e por isso se diz e tenta manter esta assimetria: "ama o próximo como a ti mesmo", mas se o ser humano não conhece senão a face do ódio... como amar...senão só com ódio?
Claro que há uma carga enorme e pejorativa, castradora da ideia do que é ódio...que é uma rejeição mental do visceral...como da MULHER ctónica, e da Natureza instintiva...abissal, da Morte...

Porque é que Sócrates teria afirmado que:

"se deve temer mais o amor de uma mulher, do que o ódio de um homem"?

Porque a mulher não há dúvida está muito mais perto dessa intensidade dramática, desse paroxismo que é o amor/ódio  do que o homem que racionaliza e divide...enquanto a mulher não, ela sente a totalidade, faz a síntese e só pode ser a expressão dessa totalidade.

E tal como diz Ovídio: 
 
"Quem põe ponto final numa paixão com o ódio, ou ainda ama, ou não consegue deixar de sofrer." e ainda aí temos na mulher o melhor exemplo do que ele diz ...e para o exemplificar temos Nietzsche a afirmar...que:
 
"onde não intervém o amor ou o ódio, a mulher sai-se mediocremente."
 
Quer dizer, só é total e grande - não medíocre - a Mulher que ama e odeia com a mesma intensidade...

E para concluir este meu esboço aéreo sobre o amor... diz Rochefoucauld:

"Se julgarmos o amor pela maior parte dos seus efeitos, ele assemelha-se mais ao ódio do que à amizade."

Portanto e de forma muito grosseira  temos á vista essa síntese AMOR/ÓDIO como verdadeira e derradeira paixão e a amizade apenas uma forma de amor nobre e morna enquanto que o amor-ódio é a grande paixão pela qual vale a pena viver e morrer...
Sim e pela qual morreram e se suicidaram imensos poetas e pares amorosos da história romântica, muito mais perto da verdade humana do que estas teorias todas recentes e "modernas" que espartilham o amor em preceitos dourados, limpos e ascéticos...como a ideia do amor incondicional etc. que tresanda a catolicismo nova era...

ADENDA:

Isto não é uma apologia do ódio per se, mas observar que quase  ninguém quer ver que é preciso amar muito para odiar...e odiar é apenas a outra face do amor...quem ama pouco nem  sabe odiar porque esse amor pouco mais é que nada...e daí à indiferença também é um nada...que é o que quase toda gente "ama"...nada; e não confundir o que eu digo com o vulgar da bestialidade da violência doméstica e da violência do homem predador da mulher ou dono da mulher enquanto tal e que muitas vezes em nome desse suposto "amor" que não é senão posse e ...ódio...diz matar por amor...
Vamos subir a fasquia um pouco mais alto!
Pode-se matar ou morrer de amor...por não ter o amor que se ama mas por AMOR E NÃO POR ÓDIO e aqui está o cerne do maior paradoxo desta Humanidade....
Paradoxo sagrado que a mente não pode converter em lógica ou razão...pois pertence à unidade á eternidade: é a nossa ferida maior da encarnação e que é a separação/cisão do Ser/alma que nasce na Terra e almeja pelo par como pela sua própria perfeição-totalidade e a projecta no outro e vê-se a braços com a dualidade...

rlp

PS
alguém quer discordar de mim?

2 comentários:

Simone Índio disse...

A quem diga que o ódio é a outra face do amor. Eu diria que são metades da mesma face. Pensar em outra face significa dizer que enquanto o amor está exposto, o ódio está oculto.A meu ver onde um sentimento está exposto, o outro está disposto e o que mantém a chama acesa do ódio é o amor e vice versa. Quanto maior o amor que foi ferido, decepcionado, maltratado,maior o ódio colhido...a famosa batalha entre Eros, o Deus do amor, e Tânatos, a personificação da morte. Os dois compõem partes fundamentais do psiquismo humano onde nada pode acontecer sem afetar o outro. Portanto o ódio não tem uma existência autônoma,ele se manifesta como desdobramento do Amor. Mas, o que não os deixa integrar é o falso sentimento de incompletude que carregamos,o qual nos move para conquista de amores e afetos.Quando encontramos um amor acreditamos que a partir dali, estamos completos...dessa crença surge o duelo entre o bem e o mal, entre o amor e o ódio. A divisão desses dois aspectos de nossa personalidade nos mutila pois negamos a utilização do ódio, da ira como agentes de mudanças eficazes, pois perdemos a referencia de que o ódio só é maldade quando é oriundo da inveja ou quando o reprimimos e ele se transforma em agressões. A crença na incompletude é a origem da divisão desses dois aspectos de nossa natureza. Como chegar na
origem as vezes é muito difícil pois, parte de nossa inteligência é automaticamente bloqueada quando negamos um desse aspectos, talvez um caminho seja DESAMAR um pouquinho para restabelecer uma certa harmonia entre o amor e o ódio.
Termino com uma pérola de Cruz e Souza, Últimos Sonetos...

“Ódio são! Ódio bom! Sê meu escudo contra os vilões do amor, que infamam tudo,das sete torres dos mortais pecados”

rosaleonor disse...

Excelente complemento minha amiga, muito obrigada pela sua lucidez!