O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quarta-feira, junho 10, 2015

A mulher presa dentro de si...



"Por dentro, eu sempre me persegui.
Eu me tornei intolerável para mim mesma.
Vivo numa dualidade dilacerante.
Eu tenho uma aparente liberdade, mas estou presa dentro de mim."

...
- Clarice Lispector


A dualidade da mulher tem muito que se lhe diga, não se trata de uma dualidade bem e mal apenas como toda a gente a vive, ao nível moral, mas de uma divisão interna que cada mulher sofre ao ser dividida entre a ideia secular da "santa e a puta" - ao ser condicionada a um comportamento X ou Y - e de todo o julgamento social da sua pessoa que é feito a partir dessa cisão interior e que dilacera a mulher por dentro ao ter de  cumprir um papel que corresponda a um dos dois estereótipos dominantes nesta sociedade patrista e falocrática.

A Mulher tem pois de integrar a sua totalidade, ser una, quer seja a mulher amante quer seja a mãe  e a esposa - ela tem de fazer a sua escolha sem ser conetada ou condenada a ter de ser "a puta" ou a ser "a santa" de acordo com os conceitos judaico-cristãos que julgam o seu comportamento de acordo com esses moldes...A Mulher é una em si - mas a Igreja católica dividiu a mulher sensual e sexual livre, e separou-a da mulher esposa e mãe, obrigando ambas a ser apenas uma parte de si mesmas. Porque o que a Igreja classificou de pecado foi o sexo e o prazer da mulher individualmente, tirando à mulher solteira esse prazer e a liberdade de usufruir e escolher um parceiro/a. Qualquer mulher que se não submetesse ao contracto de casamento era considerada prostituta...
Portanto à  mulher não lhe foi permitido ser apenas uma, ela foi sempre obrigada a ser uma ou  a "outra"  - a esposa fiel e submissa - ou  a "outra" a depravada (a amante). Esta dicotomia da mulher é de fundo religioso à partida mas também é de cariz psicológica, porque toda a mulher se sente mal na sua pele ao ter de escolher, entre ser uma ou ser outra em vez de ser apenas ela própria sem se sentir presa aos conceitos que a delimitam nas suas escolhas; a mulher vive uma vida inteira dividida e  todo ao longo de uma vida se vê confrontada  e com o medo de ser olhada e censurada como uma puta,  se se divorcia ou separa, se abandona o marido ou se apaixona por outro homem etc, em vez de poder viver a sua natureza instintiva e sensual/sexual e a sua necessidade maternal ao mesmo tempo sem culpa e sem pecado e em liberdade e de ser apenas uma Mulher Inteira, livremente vivendo os vários aspectos  da sua natureza.

A mulher que consegue integrar as duas mulheres biblicas - "a virgem e a pecadora"  do nosso catolicismo, e da prisão/condenação moral e social que foi a das nossas mães e avós e de que todas nós recebemos como  herança partes dessa dualidade dilacerante de que fala a escritora - deixa de sentir essa divisão e vive a integridade do SER MULHER em si, sendo livre e sem ter de dar contas a ninguém ...e é por isso que ando aqui a pregar há anos...

rosa leonor pedro

1 comentário:

Ná M. disse...

"A dualidade da mulher tem muito que se lhe diga, não se trata de uma dualidade bem e mal apenas como toda a gente a vive, ao nível moral, mas de uma divisão interna que cada mulher sofre ao ser dividida entre a ideia secular da "santa e a puta" - ao ser condicionada a um comportamento X ou Y - e de todo o julgamento social da sua pessoa que é feito a partir dessa cisão interior e que dilacera a mulher por dentro ao ter de cumprir um papel que corresponda a um dos dois estereótipos dominantes nesta sociedade patrista e falocrática. "

SIM, EU SINTO A VERDADE DE SUAS PALAVRAS. GRATIDÃO QUERIDA