quinta-feira, dezembro 14, 2006

“Desde que o mundo é mundo, nós, mulheres, somos vítimas da ditadura da beleza. Era de se esperar que, com os movimentos sociais e a independência que adquirimos ao longo do século passado, estivéssemos livres para, finalmente!, conviver em paz com nossos corpos; mas, ao contrário, nunca estivemos expostas a tal bombardeio de imagens artificiais e tipos físicos inexistentes. “
CORA RONAI

GALLIANO:
O PALHAÇO QUE TRANSFORMA AS MULHERES EM PALHAÇOS...




A DITADURA DA "BELEZA"...

“O massacre da auto-estima”

(…)
Do alto desses tempos supostamente "civilizados", olhamos com desdém para as torturas a que eram, ou ainda são, submetidas as mulheres em sociedades antigas e/ou "primitivas": os espartilhos vitorianos e os pés deformados da China foram apropriadamente lembrados há dias, aqui mesmo no GLOBO, na página sete, por Leonardo Drummond -- que não se esqueceu de contrapô-los às atuais costelas cirurgicamente removidas, que tanta gente considera uma forma "normal" de afinar a silhueta.
A isso se poderia acrescentar um vasto catálogo de horrores contemporâneos, das argolas que continuam a esticar os pescoços das mulheres de Burma às pernas serradas e espichadas das chinesas que, com isso, ficam mais altas e "atraentes", tanto para os homens quanto para o mercado de trabalho.

É fácil percebermos que há algo errado em pessoas de resto normais, e eventualmente bonitas, que se submetem a cirurgias em que seus ossos são removidos ou serrados por razões puramente estéticas; chega a ser difícil acreditar que isso aconteça aqui, agora, num mundo cientificamente esclarecido. Mas a maioria das dietas a que se submetem tantas mulheres insatisfeitas com seus corpos e os remédios que tomam para se manterem magras não são menos prejudiciais do que os procedimentos cirúrgicos que nos horrorizam; nem é menos profundo o grau de infelicidade que as move a comportamentos tão destrutivos.

Muito pior do que o que se vê no corpo é o que vai pela alma, e que não se vê.

Esta trágica infelicidade não se restringe mais a umas poucas pessoas, mas se espalha, como praga, por toda a sociedade. Num mundo cada vez mais obeso, a imagem da beleza é, paradoxalmente, cada vez mais esquálida. A própria idéia do que é beleza, aliás, anda tão inequivocamente atrelada a pele e ossos que já não se concebe beleza acima do peso "ideal". Isso seria compreensível, até certo ponto, em termos de saúde -- se este magro "bonito" não estivesse muito, mas muito além do que a imensa maioria das mulheres pode alcançar naturalmente. E não fosse doentio.

(…)
EXCERTO DE ARTIGO CORA RONAI
(O Globo, Segundo Caderno, 23.11.2006)

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