domingo, março 11, 2018

A noção de propriedade...



Os homens receavam o prazer das mulheres...

"A noção de propriedade, de "ter", começa nessa apropriação sexual: os homens "têm" mulheres, parte corpo que lhes falta para poderem "ter" filhos.
O que se passou nessa longa noite humana, que nós tentamos sondar, que as mulheres nos descreviam?
As máscaras caíram, e o luar entrou nas tendas, nas cabanas, nas casas. As mulheres viram as faces dos homens: podiam ser (eram) seus filhos.
A compaixão não era oposição: com-paixão. Mas os homens rejeitaram-na.
- Precisamos nos inscrever no real, não poderemos limitar-nos a inscrever-nos no corpo das mulheres.
De manha, os homens desviaram os olhos. Como poderiam eles encarar as mulheres que tão completamente os tinham amado?
O que aconteceu nessa longa noite?
- Porque tornaste necessária a dor, em vez do prazer? - perguntou a mulher.
Foi escolhida a configuração que deu origem á submissão matrimonial, á prostituição e ao sadismo.
Foi escolhida a configuração que valoriza a força física, fantasmática, esforçada, simbólica. Os homens trabalhavam as terras, os homens passaram a ter os instrumentos, os homens passaram a estar armados - contra as mulheres, uns contra os outros.
Foi escolhida, dessa longa noite de luta e de amor, de produção de uma nova espécie, a configuração que baseia o chamado casamento monogâmico: que não é um acasalamento entre uma mulher e um homem, mas uma relação entre dominador e dominada.
Os homens disseram: o prazer clitoridiano não serve para nada; nem as carícias nem os gestos sensuais.Tudo isso é excessivo, e ilegítimo. Descobriram a paternidade.
Os homens receavam o prazer das mulheres.
Como podiam aceitar a junção de um prazer "gratuito", com a relação de produção de crianças, seu esforço recém descoberto?
A mulher banhada em lágrimas velou o rosto.

In "A Morte da Mãe" de Maria Isabel Barreno

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