O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

sexta-feira, agosto 10, 2012

Vamos lá então perceber as mulheres...(mas muito pouco mesmo)


Nota: este texto não é uma crítica à peça nem a autora, que tem todo o mérito em desmascarar todo um status quo e é imensamente divertida e válida…
Tenho pena é que não tenha minimamente noção da mulher para lá destes estereótipos, alguns muito bem caricaturados…e aqui eu vou apenas relevar isso...


“Vamos lá então perceber as mulheres...
mas só um bocadinho".  

de MARTA GAUTIER

(ISTO NÃO É UMA CRÍTICA )

Por mera curiosidade fui ver a peça a Cascais com o intuito de verificar se o que eu penso …é mesmo o que eu penso ou se havia alguma esperança de ouvir uma mulher falar de mulheres…mas não, a peça é só falar das mulheres para os homens…para os maridos, filhos, pais ou tios, talvez amantes…mas como eu não sou casada e sou bastante mais velha do que as meninas da peça, as do liceu ou do balneário e das da maioria da plateia e não sendo mãe nem avó...achei piada a todos aqueles clichés que concernem uma geração actual de mulheres mas também de uma certa classe social e isso era bem patente na plateia...e por isso a peça é ainda o olhar de e para uma certa classe, para os tiques de mulheres oriundas de outras famílias que não são como “a nossa” e com pergaminhos sociais ou tradições literárias etc. E aí temos a única tipologia (social, não feminina) da “porcalhota”, da, já não me lembro o quê, enfim da “isto” e a “daquilo”,  que nos marca na adolescência, sendo em suma o espelho/leitura da menina “filha de família” etc. que é muito livre e se liberta em parte das bitolas sociais e familiares e ousa expor todas as mazelas da mulher circunscrita a um determinado quadro, pelo menos tem essa ousadia na liberdade de dizer o que as mamãs e a vós não diriam…(enfim, não sendo este caso dado ser filha de uma escritora bastante “livre pensadora” também).

Mas isso, esses tiques e possidonismos eu entendo muito bem, o que eu não entendo é que afinal da mulher, da mulher ela mesma, não se diga nada...nem se saiba nada...Sim, da mulher que não seja a mulher (objecto, não a abjecta) em função do homem, do filho, do amante e do Pai ou do nome de família etc. É evidente que a peça não tem esse intuito e só quer divertir...

E assim o que está bem expresso nesta peça...é o que a mulher é (não sendo) nesta sociedade...uma coqueluche, a esposa, ou uma “porcalhota”, uma pobrezinha, com mau gosto, ou uma puta, “a outra” a que só aparece (tabu) no fim, com música de boite, e uma muito má encenação da mesma…Porque uma puta raramente é loura e magra…porque sendo loura e magra chega sempre depressa a qualquer lado sem precisar de o ser…

O que esta mulher jovem expressa e dá afinal  exemplo é só o de um condicionamento mental psíquico das mulheres que nesta sociedade sofrem  a influência secular/cultural/religiosa, de uma sociedade patriarcal que as esvazia de si e da sua natureza instintiva sensual e por mais cultas que sejam, recebem uma influência determinante ou marcante, religiosa social  e parental, que as divide sempre e as inibe de serem o que sentem e ainda dependendo da sua classe social, vivendo presas em conceitos e preconceitos tão entranhados que nem se dão conta que o são,  e que estes se reflectem depois em  comportamentos descompensados, estridentes, excessivos,  que são secularmente atribuídos como típicos da mulher, (toda a mulher é uma histérica)  sem se saber a origem profunda dessa fragmentação psíquica e emocional que vivem todas as mulheres - porque se trata de uma fragmentação da identidade feminina dividida em estereótipos há séculos…Como sabem...e eu repito...a esposa e a prostituta...

Sim, no meio disto tudo onde está a mulher? A mulher-Mulher, a mulher real, com M grande…Não, ela não está lá porque é do Homem que se trata sempre…

Ela explica-se…e sempre e só para o homem (a autoridade: o pai o avô o marido?), mas ela anseia liberta-se e afirma-se perante o homem que tem os seus direitos a ser…louca, e porque sabe que ele não a percebe, que ela é um poço sem fundo de incongruências e irracionalidades, sim isso ela expressa bem, acaba apenas por ser tudo o que a acusam, os homens. Mas ela pede: "deixem-me fazer o que eu quero", senão menina mimada e histérica, faz uma cena…e vai gritar para a janela - como todas as mulheres filhas do papá (o papá aqui não é forçosamente o próprio pai…que este pode ser ausente ou  "presente") - que ela é louca…

Sim, também vi como riam as mulheres e talvez os homens na plateia, que estava cheia e os espectáculos estão sempre esgotados, e vi e ouvi o “histerismo” (não é punitivo, nem julgamento!) das mulheres ao se verem (ouvirem) espelhadas nos seus humores e desamores, absurdos e desordens em voz alta pareciam extremaente nervosas...prenúncio de mulheres sem identidade, sem profundidade, sem existência própria...e que não têm vida para lá desses estereótipos.

Porque as mulheres não existem senão em função do homem-pai-filho etc.

Onde está pois aí (ou onde quer que seja) a verdadeira mulher, a substância do SER MULHER EM SI? 

Tem a mulher vida e significado sem ser mãe e esposa?

Só posso responder por mim, e como toda a vida vivi por mim e em busca de mim...vali-me de mim em mim...e eu sou EU MULHER sem mais, sem precisar de me nomear outra coisa qualquer, ou ser através do outro...sem que o olhar do outro (seja ele qual for o “outro/a) me validasse...porque por ser eu mesma aprendi que tenho conteúdo em mim, essência, valor, força e poder e que a minha vida vale por mim mesma, sem ter sido mulher de, nem filha de ninguém… e TANTOS NOMES ME QUISERAM DAR…depois, tantos…e eu não aceitei nenhum…nem agora aceito. Porque UMA MULHER NÃOS E DEFINE POR NOMES, UMA MULHER É…uma mulher é um Todo em si, uma mulher é Deusa...

E enfim eu fiquei realmente - não posso dizer perplexa porque já calculava que assim fosse - mas mesmo assim admirada por ter diante de mim a confirmação de tudo o que eu penso e tenho escrito, por ter diante de mim o quadro exacto, a expressão de todas essas insuficiências/amputações da Mulher e a aceitação passiva da sua “inexistência”. E sobretudo de ela não se perceber nada, mas absolutamente nada do que é A MULHER EM SI, uma Mulher inteira!
rlp

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