O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quarta-feira, março 13, 2024

COMO É QUE ISSO ACONTECEU?



A MORTE DA MÃE

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A falta da Mãe…a Mãe inicial, a que ama, a que cuida, a mãe que ampara, a mãe que alimenta e resguarda a sua cria - acabou por criar filhos sem mãe o que gerou o ódio a violência e a guerra no mundo… Os Filhos sem mãe, criaturas que não recebem a nutrição maternal nos primeiros meses de vida, tornam-se violentos e incapazes de viver em sociedade e por isso muitos ou são criminosos e assassinos… tal como os mamíferos, notadamente como acontece com os macacos, segundo uma análise recente cientifica, quando abandonadas pelas mães ou estas morrem eles ainda bebés, adultos eles tornam-se agressivos e não sabem copular…
Parece que essa foi a nefasta forma como a Igreja usou para controlar a Mulher e a Mãe e dominar os homens. Separar a criança da mãe logo que ela nasce para a baptizar e livrar do pecado do sexo e do corpo da mulher...

Assim se destruiu e continua a destruir a importância da Mãe, na sua função soberana, sobretudo nas maternidades, em que as crianças ficam separadas das mães, assim como depois em casa dos pais  dormem  em quartos separados do casal; o pai tem a prioridade de posse sobre a mãe em detrimento do filho - os humanos são os unicos mamíferos que se separam das crias enquanto ainda são pequenas... Assim, a Mãe e a mulher vão perdendo o valor da relação criança mãe, o par inicial, em nome da ordem estabelecida e as normas do sistema de dominação. 

Lembremos o mito grego em que Zeus engole a deusa Metis para lhe roubar a gravidez da filha Atena que ameaçava tirar-lhe o seu trono quando crescesse; Atena acaba por nascer saindo da cabeça de Zeus ou da sua perna. Aí cultural e historicamente acabou o reino da Rainha Mãe para o reino do Deus Pai. Este Mito assemelha-se ao Mito de Edipo com diferentes contornos, mas sempre a culpa a condicionar o ser humano. Esta é a mensagem que passa num universo masculino de culto do pai e onde a mulher e a Mãe passa a ser desprezada/anulada. Portanto, ligando os mitos a  psicologia dita das “profundidades”, desde Freud a Jung, os famosos psicólogos que dominam pelo o intelecto masculino, geram igualemnte a culpa e o medo do incesto que domina nessas psicologias que são as das pessoas "cultas" de hoje, que com a sua arte e cultura, os seus filmes (realizado por artistas escritores e intelectuais actuais) não há dúvida que a Mulher não tem presença e a Anima passa para o homem segundo Jung e nem sequer existe uma referência maternal. A sua importância é sonegada. Ela é apenas a amante sexual potencial do pai e do amante, o futuro herói que irá preenche-la e tomar conta dela, dominando-a, e sem que ela tenha ou possa ter vida própria senão em função dele.
E é curioso notar que em filmes de guerra assim como nos filmes de aventuras e ficção, o padrão afectivo e familiar dominante é filha/pai e isso é actualmente uma constante subliminar…enquanto que o rapaz se torna no herói e tudo faz para agradar ao pai que o submete e diminue, também a rapariga, aparece sem mãe, e a defender o papá, marcados ambos com o abandono do pai (que os roubou à mãe) ou decepcionados por ele não ser como o projectam ou por não lhe dar a atenção que eles buscam, mas é sempre o Pai que acaba por ser o seu grande herói, amor ou fixação…Isto é deveras estranho, mas faz parte da nossa cultura patriarcal, em que o amor da Mãe é substituído pelo do Pai dominador e que nada tem a ver com o nasciturno senão uma breve e ocasional participação, pois é a Mãe que alimente e dá vida a criança... 
Muitas séries policiais modernas em quase todas aparecem pais bondosos (e traídos pelas mulheres) com filhas que eles cuidam sem mãe. É como se de facto a mãe não existisse e não tivesse qualquer importância social e económica (de facto não tem) e explora-se o amor da filha pelo pai (tal como do filho) ou fazendo o pai ser o bom da fita e a mãe uma bêbada, prostituta ou drogada… este é sempre o tema dos filmes americanos...


COMO É QUE ISSO ACONTECEU? Como é que fomos desviadas do par inicial que alimenta e forma o ser para a Vida... Como o direito A VIDA foi substituido pela lei e pelo  PODER

Talvez este excerto do livro REBELIÃO DE EDIPO de Cacilda Rodrigañez Bustus possa esclarecer

Como A Vida foi subjugada pelo Poder, por isso - quando acordamos de manhã e ao longo do dia- o SENTIR a VIDA correr dentro de nós é da ordem do milagre.

A nossa LUTA como mulheres não serve de nada se for virada para fora, ao nivel social, a não ser que seja mantida através de um trabalho de DES-CONSTRUÇÃO de forma perseverante e incansável dentro de nós mesmas contra o que foi estabelecido pelo Sistema de Dominação, para que possa surgir novamente a ordem da Vida…
 
DIZ ELA: 

“Para construir uma bagagem conceptual e simbólica que recria e propicia (o entendimento) do que é a autorregulação da vida, é preciso uma correlativa (e constante) des-construção da ordem simbólica patriarcal, que exerce uma pressão continua e tem tudo estruturado no plano social e no individual (para nos submeter); e há que exercer uma pressão analítica no sentido contrário. É muito mais que vencer uma inercia de um modo de pensar. Deve ser ultrapassado o dogma estabelecido dessa civilização para chegar à verdade da vida humana.

A Lei do Pai tem construido uma poderosa ordem simbólica, correlativa a sua ordem social, que faz com que acreditemos que a sua lei é a lei da vida, de tal maneira que a lei e a vida estão confundidas em nosso mundo; e esta ordem simbólica e a sua confusão operam diretamente sobre o nosso inconsciente, além de operar evidentemente sobre a nossa consciência. Por isso é preciso realizar um esforço especial para sair de tal ordem simbólica, para adotar o ponto de vista da autorregulação da vida (aquilo que é da natureza da relação par mãe-criança) para ir desfazendo a confusão entre o que é a Vida em si e o Poder estabelecido.

E já que temos uma perspetiva na qual vivemos tão assumidamente, o esforço analítico e crítico de des-patriarcalização deve ser sistemático, ou pelo menos semântico. Não é gratuito afirmar que o ponto de vista da autorregulação da vida (natural) é anti-patriarcal, da mesma forma que não é gratuito ter - em relação ao corporal - a perspetiva anti-eudípica da integridade primária: se não formos contra essa possessão, não poderemos expressar-nos livremente, se não desfazemos o mito da “cara metade”, não poderemos produzir e deixar fluir o desejo. Se o processo é inevitavelmente uma des-construção do estabelecido, e já que o estabelecido se encontra completamente fundido e confundido com o que é a vida, mantendo-a parasitada com fios invisíveis, a perspetiva anti-eudípica e anti-patriarcal é uma ferramenta imprescindível para não seguir na confusão e na parasitação da nossa vida pelo Poder patriarcal”

O Mito de Edipo.

Édipo nasceu príncipe da cidade de Tebas, filho do rei Laio e da rainha Jocasta. Ao nascer, foi levado ao oráculo de Delfos onde foi profetizado que Édipo se tornaria um herói, após matar o pai e desposar a mãe, desencadeando uma cadeia de desgraças, que causariam a ruína da casa real.
Eudipização-culpabilização do filho: No Mito o filho é à nascença entregue pela mãe (Jocasta) ao Pai (Lau) para o mandar matar por causa da profecia, porém, este, não tendo sido morto, cresce e acaba por regressar a Tebas e cumprir a profecia que o pai tanto temia – ele mataria o pai sem saber e casaria com a mãe desconhecendo que era sua mãe… assim, quando ele descobriu o que aconteceu cega-se e foge para longe por se sentir culpado. Ora segundo esta autora, e na sua perspectiva, Edipo devia ter reivindicado os seus direitos e não sentir-se culpado: o mito é apontado como o fim do domínio da Mãe na cultura grega passando para o Pai o Poder em detrimento da principio da Vida…O mito anuncia assim o reino do Pai e o patriarcado e o fim do reinado da Mãe.
rlp




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