PARA MULHERES TOSCAS E FEIAS...
Texto de Flor Del Sur
"Hoje eu quero falar para as mulheres sujas. Para as mulheres desgrenhadas, sem modos, sem eira nem beira. Sem berço , sem origem nobre. Para as mulheres quaisquer. Aquelas que não bailam feito ninfas na floresta encantada. Aquelas cuja pele não tem a cor aveludada de pêssego maduro. Antes , se estendem feito terra arada, com veios rústicos , pedras, gravetos. Hoje quero falar para as mulheres pagãs, ainda que possam ser religiosas, são sempre vistas como erradas , hereges, ...mundanas, inadequadas ao meio. Eu quero falar para as mulheres sujas e loucas, com hálito forte de fumo, terra e gritos sufocados. Para as mulheres sem olhos brilhantes e bem delineados, sem bocas carnudas carmim, antes tem a pele dos lábios ressecada e ferida por beijos cínicos , sem amor. Sem amor. Que amor ? Para estas mulheres cujo amor romântico foi uma ilusão tola, tosca, sem vida . Antes seu amor foi o prazer das crias bem alimentadas, uma muda de chá que vingou. Um passeio à beira do mar, com roupa e tudo. Com respeito e anseio... Por Yemanjá. Quero falar para as mulheres com vincos profundos no corpo e na alma. Com marcas estranhas e cicatrizes ... Cicatrizes - muitas invisiveis a olho nu, e reluzentes no silêncio e no escuro do coração . Quero falar para as mulheres sem graça , sem pernas roliças, sem seios redondos . Quero falar para as mulheres sujas, medonhas, banidas da sociedade pura e bem comportada. Quero falar para as mulheres cravejadas de histórias e memórias de uma realidade cruel. Escrevo agora para as mulheres que apesar de tudo, de terem sobre o corpo as marcas das opressões , de sonhos inconfessáveis , de segredos pesados de lágrimas ... Para elas eu quero dizer, que se existe um amor que valha a pena viver, é um amor que possamos aprender a sentir por si mesma , com tudo que se tem. Tudo . E inclui até mesmo o nada que sobra ao fim do dia. Esse é um amor sagrado e digno. Então aprendemos que sim, somos todas Deusas. E podemos erguer um altar ás Deusas Mundanas. E honrar nossa presença na Terra. Recuperar a fagulha divina da terra, que tinge nossos pés descalços e profanos, e dotados de uma indescritível sacralidade. Intento o amor para dentro, num olhar direto e fiel a si mesma. Eis uma história de amor bonita para se escrever no diário da existência ."
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