A HISTÓRIA DA ROSA ...
"Sei da história de uma rosa. Parece-te estranho falar em rosas quando estou ocupada com bichos? Mas ela agiu de um modo tal que lembra os mistérios animais. De dois em dois dias eu comprava uma rosa e colocava-a na água dentro de uma jarra estreita para abrigar o longo talo de uma só flor. De dois em dois dias a rosa murchava e eu a trocava por outra. Até que houve determinada rosa. Cor-de-rosa sem corantes nem enxertos porém do mais vivo rosa pela natureza mesmo. Sua beleza alargava o coração em amplidões. Parecia tão orgulhosa da turgidez de sua corola toda aberta e das próprias pétalas que era com uma altivez que se mantinha quase etecta. Porque não ficava totalmente erecta: com graciosidade inclinava-se sobre o talo que era fino e quebradiço. Uma relação íntima se estabeleceu intensamente entre mim e a flor: eu a admirava e ela parecia sentir-se admirada.
E tão gloriosa ficou na sua assombração e com tanto amor era observada que se passavam os dias e ela não murchava: continuava de colrola toda aberta e túmida, fresca como flor nascida. Durou em beleza e vida uma semana inteira. Só então começou a dar mostras de algum cansaço. Depois morreu. Foi com relutância que a troquei por outra. E nunca a esqueci.
O estranho é que a empregada perguntou-me um dia à queima-roupa : "e aquela rosa?" Nem perguntei qual. Sabia. Esta rosa que viveu por amor longamente dado era lembrada porque mulher vira o modo como eu olhava a flor e transmitia-lhe em ondas a minha energia. Inteuira cegamenteque algo que se passara entre mim e a rosa. Esta - deu-me vontade de chamá-la de "jóia da minha vida", pois chamo muito as coisas - tinha tanto instinto de natureza que eu e ela tínhamos podido nos viver uma a outra profundamente como só acontece entre o bicho e o ser humano. "
"ÁGUA VIVA" de clarisse lispector
O FEMININO ESSENCIAL
Estarão as mulheres preparadas para fazer emergir de si o feminino?
Estarão elas preparadas para dar ao tempo uma alma nova
soluções novas para os novos problemas, estarão elas capazes de despertar o feminino no homem
sem o castrar?
Estarão elas capazes de perdoar?
É o lado terrífico da Grande Mãe que vão integrar,
um passado de memorização que vão vingar?
Ou a salvadora, a que perdoa e compreende, a que sabe
que sempre a mulher é o futuro do homem
e o homem o futuro da mulher,
quando cada um deles se esgotar, quando perdidos um do outro
se esquecerem da completude do par.
Quem é a mulher de hoje? Será que sabe o que já foi?
Aquilo que é ou pode vir a ser?
Será que a mulher sabe e aceita o útero como matriz da vida,
princípio que lhe dá forma, alma, razão de ser?
(...)
in OS PORTAIS DO TEMPO
DE aNTÓNIA DE sOUSA
PUBICADO POR: "THE ART FOR ALL - PROJECT"
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