O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

terça-feira, abril 30, 2013

Non cogitat Qui non experitur “


A EXPERIÊNCIA É SEMPRE SOFRIMENTO...

“O medicamento e a droga forte da presença humana tinham mais uma vez aliviado a sua angústia...” - In Denário do Sonho - Marguerite Yourcenar


Hoje acordei com a ideia presente de como as pessoas em geral me apontam uma certa desumanidade…Como exemplo, não corresponder às suas expectativas de afecto ou amor diante de doenças ou da morte, não dar atenção às pessoas enfermas – mesmo sendo amigos ou familiares – ou quando elas passam por um momento conturbado ou de luto ou por momentos duros face a certos incidentes na vida… Não, não dou muita atenção a dor física, mas à dor das almas e estou sempre disponível para quem as sofre…e para falar delas sem mentiras nem disfarces…
Quando muito poderia ser uma boa psicóloga, mas nunca seria enfermeira nem médica porque a dor física do outro me dói no corpo também…Talvez por isso me afasto delas…mas não do sofrimento real.
Realmente isto fez-me pensar -  dado uma amiga, que muito estimo -  ter-me confrontado com isso diante do luto da sua mãe, ou de outras pessoas se afastarem de mim (virtualmente) por eu não ter telefonado a saber da sua saúde ou de as não ter ido visitar ao hospital…tal como as que vão fazem disso alarde.
Sim, de acordo com as regras, isto fez-me pensar que não sou uma “boa pessoa”…nem “bem-educada”, ou sequer uma pessoa interessada nas "desgraças alheias"…e então, caí em mim…e reflecti bastante acerca do porquê de eu ser assim. É um facto. Eu não sinto as coisas desse modo, como toda a gente diante do sofrimento alheio. Não. E não foi difícil encontrar a resposta para mim. Para mim apenas, porque sei que essas e umas tantas outras pessoas vão discordar de mim e pensar-me ainda pior do que já pensavam, já  para não falar de uma pessoa materialista dialética   ou comunista, ou mesmo cristã e que me leia...
Temo que este texto não possa sujeitar-se a esses tipos de leituras...básicas e ultrapassadas.

Mas eu vou-vos dizer na mesma como sinto…
Para mim o sofrimento é absolutamente natural e faz parte integrante da vida. É mesmo um motor importantíssimo para acelerar o conhecimento de nós mesmas/os, seja a nível psicológico pelo enfrentar da nossa Sombra como o nosso lado mau, seja o sofrimento causado pelos sentimentos de abandono na infância ou de rejeição, ou de relações e amores traídos, feridas de maus tratos, lutos etc..  
Eu sinto e desde sempre um grande sofrimento na vida. Não um sofrimento físico, na verdade, mas penso que é precisamente porque não fujo aos sinais da doença que fisicamente nunca sofri muito…mas eu sofro animicamente (mesmo que me digam que a alma não dói) por tudo e por nada.  E sofro não porque me agarro ao sofrimento das coisas que me fazem sofrer. Sofro pela alienação da Humanidade de um alto propósito. Sofro pela mentira das pessoas e como se mata e tortura no mundo seres humanos. Sofro a ignomínia da Guerra e as violações das mulheres em todas elas e fora delas. Sofro a falta de verdade e autenticidade dos seres que me rodeiam. Sofro a falta de integridade e de verticalidade. Sim, sofro na minha alma e no meu coração diante de um mundo que não é…o que sonhei nem o que idealizei…e minimizo as dores pessoais e privadas, não por descurá-las, mas porque as sofro também na pele…Sei-as todas e conhece-as bem. Elas são-me no entanto secretas e intimas…e sei que só nós as podemos resolver em consciência encarando sem medo nem mentiras as suas causas.

Já lutei e fiz tudo em tempos quando ainda era jovem para idealmente sanar os males que eu via fora de mim…mas vi depois que ninguém muda o mundo sem se mudar a si primeiro. E estou tão habituada ao sofrimento profundo e a vivê-lo das entranhas, a vivê-lo sozinha e sem que ninguém saiba ao certo o que tenho ou não tenho, que para mim o sofrimento é a coisa mais natural do mundo e até tenho um certo pudor em o revelar… ( talvez eu já não o diga  porque sei que nada nem ninguém neste mundo nos vale…e isso eu aprendi a minha custa e não me queixo - embora as vezes ainda me doa, confesso…) Por isso nem me passa pela cabeça a esse nível intervir agora sobre o sofrimento alheio…porque afinal vim a descobrir que sofrer, sofrer em si, conscientemente…saber o porquê desse sofrimento é uma coisa sagrada…é uma alquimia preciosa, uma oportunidade única para se ir mais fundo e rezar…
No entanto eu sou tácita e secretamente solidária com as dores do mundo e o sofrimento alheio, mas não parece, admito. As pessoas querem actos, palavras de conforto…caridade, formalismos, provas de afecto etc. e eu não as tenho. Isso até é fácil…sei até de quem o faz sem sentir nada …porque é suposto…
Não digo nada talvez porque sei que a verdadeira ajuda vem de dentro e a não ser uma intervenção divina, sim, digo um amor sublime que nos eleva acima da dor …nada mais o faz…Podemos tomar remédios e drogas, mesmo essa “droga forte da presença humana” que alivia tanto a nossa dor, mas só por Graça (a Lei da ressonância vibratória: um momento um estado e um lugar) que se manifesta de graça…e que nos transporta acima dela…nos sentimos livres da dor e do medo. Essa é a minha experiência.
Por isso para mim o verdadeiro sofrimento é uma oração à vida, uma oportunidade de me transcender, de transformação, no sentido de me elevar acima da dualidade humana…e a minha experiência de vida mostrou-me que quanto mais eu sofro e vou fundo dentro de mim mais subo e me consagro à existência mais pura onde dor e prazer se misturam numa epifania do Ser…absoluto. E que essa é a Magia da vida, o casamento sagrado entre os dois lados de mim…E aceitar a dor tanto com o prazer e na mais profunda emoção que é um misto de dor e prazer   viver essa transcendência de si mesmo enquanto pessoa dividida e ser dual…é deixar de viver só na superfície e nas aparências que tanto nos enganam. A alegria a existir plena e ela ser pura …vem  dessa fusão do ser e não por oposição à dor nem pela negação do sofrimento.

Isto não é a apologia do sofrimento em  si, como estão a pensar, mas só  por si colocar uma ênfase necessária num dos aspectos mais incríveis da vida e de que todos andamos afastados com medo justamente de sofrer, de saber, de conhecer o Mistério da Vida como o nascer e o morrer …E porque nos alienamos do ser essencial à mínima dor, ao menor sinal de sofrimento, tomamos comprimidos e drogas e calamos o que em nós quer sair e gritar, quer nascer…é claro que eu não falo do sofrimento físico proveniente da doença já instalada…porque sei que a doença é uma consequência da nossa inconsciência de ser e suportar a dor como sinal até do que está mal no corpo ou na mente e do caminho que trilhamos ser muitas vezes uma traição a nós mesmas/os e à nossa alma e nós continuamos a enganarmo-nos. A dor física é sinal de que algo vai mal no nosso sistema complexo, de um ser humano que separa e divide a alma do corpo e do espírito e vive em disfunção total…apenas no plano material e da mente.
E como diz Marguerite Yourcenar num seu livro: “É impossível pensarmos nas adjurações da sabedoria alquímica que introduzia igualmente a fisiologia no coração do conhecimento: Não aprender, mas sofrer. Ou uma formulação latina análoga Non cogitat Qui non experitur “

rosaleonorpedro

4 comentários:

Else disse...

Não vejo nada como sofrimento e sim, como aprendizado.
Todo ato tem consequências (inclusive a doença) e é responsável e maduro aceitarmos isto.

Muitas vezes as pessoas não procuram uma companhia e sim, um apoio ou escape em nós, este não é um bom caminho.


rosaleonor disse...

Sim, podemos ver como aprendizagem apenas o sofrimento e numa sociedade que fomenta o escapismo e o tudo o que hedonista o sofrimento que é aprendizagem parece uma coisa atroz, mas para quem gosta de aprender e saber mais fundo o sofrer é só a vida a passar por nós...
obrigada Else...por estar aí...
abraço

rlp

Else disse...

Boas comemorações a todas no Walpurgisnacht!

rosaleonor disse...

oBRIGADA ELSE!