A MULHER COMO PROJECTO:
"(...) É um trabalho grandioso a ser feito. Isto leva-me a pensar e obter resposta a uma pergunta que me fazem muitas vezes que é se tenho projectos. Sim, tenho. Eu sou o meu projecto. Cada uma de nós é o seu próprio projecto." (uma leitora) Zélia Cristina
Eu escrevo sobre a mulher em geral, basicamente sobre a Mulher em si, tendo em vista a mulher integral, a mulher que de alguma forma busca ser inteira e juntar as partes de si que foram separadas e que correspondem a estereótipos que a sociedade patriarcal criou para melhor dividir e manter a mulher fragmentada, frágil e dependente do homem e ao seu serviço.
Durante muitos anos falei da Deusa Mãe, na Deusa na Mulher...e de um passado histórico que foi branqueado e dizia respeito a Sua Gloria e Poder na Terra...
Escrevi sobre a urgência de restaurar uma consciência do Feminino Sagrado, do poder e da importância dessa Grande Deusa Mãe na História, e como Ela foi banida da religião e filosofias e da cultura ocidental pelos patriarcas.
Falei e escrevi principalmente e desenvolvi essa visão da cisão da mulher em duas...dessa divisão na psique da mulher e em como por essa razão a mulher sofreu todo o tipo de aviltamentos e foi explorada e usada ao longo dos séculos, como objecto de prazer e de reprodução apenas, baseando-se nessa cisão-divisão. Falei e escrevi como as mulheres foram anuladas e coisificadas pelos homens, reduzidas as esposas e concubinas, vistas ora como "santas" umas e as outras - as que não se submetessem ao casamento e a lei do homem consagradas a família e aos filhos, sem voto na matéria - as putas, por não terem um senhor ou um dono, nem posses, seriam assim condenadas a prostituição logo à partida...as mulheres pobres e solteiras...as mulheres criadas em casas senhoriais engravidadas e abandonadas pelos patrões a quem roubavam os filhos (e criavam filhos bastardos ou filhos da puta..).
Muitas escritoras, antropólogas e activistas contribuíram para que a Deusa voltasse à consciência da Mulher e assim, avançámos neste caminho da Deusa...Toda essa informação circulou e difundiu-se de forma exponencial. As mulheres de todo o mundo contribuíram para isso e muitos movimentos e círculos de mulheres se formaram nesta ultima década...
Mas algo se perdeu...algo falhou...mais uma vez a Matriz de controlo se aproveitou de todos esses movimentos para os desviar e dar um cunho superficial e artificial, criando em paralelo grupos e círculos cujo interesse é na verdade dominar e controlar as mulheres, usá-las e mantê-las na ignorância de si mesmas através de uma aculturação (orientalização ou recuo a sociedade indígenas e práticas antigas) desses mesmos rituais e cultos que foram outrora apanágio de liberdade e consciência. Muitas mulheres se aproveitaram disso para se servirem a elas nos seus propósitos egoístas e comerciais...perdendo-se assim o sentido do sagrado e a consciência do verdadeiro propósito. E tal como dizia ontem uma amiga:
"As teorias de uma espiritualidade new-age vão gradualmente infiltrando os seus tentáculos no redespertar do Sagrado Feminino. De cada vez que se abre uma rede social lêem-se breves frases que actuam como um lenitivo nas dores da Mulher mas que não oferecem cura profunda nem inflexão de consciência. A formula é repetitiva: "torna-te a Deusa que és" , "Eu sou como a Deusa", sem alongamento no que é a Deusa ou a Mulher e na relação que uma pode ter com a outra, menos ainda na tarefa persefoniana de ter uma vaga ideia do que se é sem longa análise entre muito tempo perdida em labirintos.
Escreve Jean Shinoda Bolen em "As Deusas e a Mulher Madura":
"Se meditares acerca de uma deusa ou imaginar um diálogo com ela, esta parte sábia de ti torna-se mais consciente e acessível na vida do quotidiano. Aquilo que tem o nosso foco, tem a nossa energia. Aquilo que imaginamos que vai acontecer, precede o nosso desenvolvimento.
Quanto mais quisermos conhecer um arquétipo de mulher sábia, tanto maior a probabilidade de que ele surja em nós; e quanto maior for o número de mulheres interessadas neste processo, tanto maior será a certeza de que o arquétipo da Deusa voltará à nossa cultura."- Ananda Krishna Lila
É evidente que uma coisa não existe sem a outra, mas a enfase e o foco hoje deve estar na Mulher em si e na Consciência que ela deve despertar e não tanto em servir a Deusa ou seguir qualquer ritual ou culto antigo...
Embora todas essas manifestações possam estar ligadas, para mim urge neste momento esse acordar da consciência feminina em cada mulher, a mulher moderna, pois trata-se da mulher como individuo, a mulher de per se, individualmente, e dentro do contexto em que a mulher actual vive o que mais me interessa. Por isso penso que apenas repetir ritos e vestes e costumes do passado já não me faz muito sentido embora possa ser importante para muitas mulheres começar por ai, pelo exterior - porque é belo e dignificante e revelador para a mulher participar de grupos de mulheres se isso for vivido a partir do coração, mas mais importante que tudo isso para mim, é a Mulher ACORDAR em si mesma, para o seu potencial de mulher integral, a mulher iniciada por natureza (por isso foi dividida, para não ter acesso a essa consciência) que só tem de despertar por e para si mesma, e unir as partes de si que foram fragmentadas e ultrapassar a cisão que a dividiu em duas mulheres antagónicas (a santa e a puta)...pois é isso que a Deusa faz: UNE AS MULHERES DENTRO E DEPOIS FORA. Une as partes cindidas e torna a mulher integral e una em si mesma. Só assim poderemos ultrapassar a dicotomia que nos estrangula e sufoca e nos faz viver umas contra as outras como reflexo da nossa divisão intrínseca...
Por isso o meu trabalho reside como FOCO na consciência psicológica, no saber de si...sem o qual a mulher pode saber muito da Deusa...mas nada de si mesma!
É preciso unir estas duas formas de saber...
Por todas essas razões hoje interessa-me muito mais agora uma Consciência emergente dessa Deusa Viva manifestada na mulher como agente de um mundo em decadência, do que as Deusas do passado ou os seus altares, a Deusa como mero culto e ritual; interessa-me sim a Deusa como fonte de consciência na Mulher, da mulher activa e desperta que age neste mundo e faz a diferença pela sua consciência. Eu sei que me repito, mas é preciso enfatizar isto...
Portanto, como pergunta a minha amiga, "O que falhou, uma vez que o movimento existe? Faltou a profundidade da consciência, que é sempre o facto sine qua non. Falham os mantras, as terapias, as orações de e pela paz, a arte, porque no fundo essas experiências elevam-nos o ego de forma momentânea, são uma transfusão de esperança, mas quando esgotada a experiência voltamos ao estado de alma anterior- ao desgaste do quotidiano e ao embate da realidade da vida." **
Sim, falhou a integração desse saber...não houve um verdadeiro despertar...
Compreender isto é fundamental...sem esta compreensão, todos os discursos e as teorias ou as melhores intenções podem ser muito bonitas mas na prática acabam quase sempre em divisão e antagonismo...porque não houve qualquer mudança nem despertar da consciência.
As mulheres sem essa consciência de si enquanto mulheres também acontece que ao agruparem-se tudo o que acabam por revelar a curto prazo é o seu antagonismo e rivalidades. Sem essa consciência e trabalho feito dentro, sem essa coesão interior, esse amor da mulher por si mesma, o que acaba por se manifestar nos grupos e nos encontros de mulheres, são os complexos e traumas de mães e filhas e irmãs que umas e outras reflectem sobre as outras e ao fim de pouco tempo odeiam-se todas...ou vão formar outros grupos com desconhecidas para se afirmarem na sua descompensação emocional e psicológica.
Ressalvo sempre mulheres sérias e honestas que fazem um trabalho de pesquiza e de estudo muito sérias e dedicadas...mulheres de alma e fé, com trabalho feito, adultas e responsáveis, mas o que eu mais vejo ao meu redor é tacita e taticamente as mulheres unirem-se em grupos (e grupúsculos) umas contra as outras, disfarçadas de deusas e buscando protagonismo e importância...
Para além disso temos de ter em conta que a mulher em geral, a mulher comum, essa continua presa e condicionada à sua família, ao casamento, ao homem e aos filhos ou a sua afirmação social - profissional...isso é que o seu centro e a sua vida, mesmo mal tratada ou porventura abusada, humilhada, continua a alimentar os outros que a exploram (muitas vezes maridos e filhos) e as deixa exangues e a si desprezam-se, submetem-se ao Sistema aos padrões, e desprezam igualmente as outras mulheres à sua imagem - acusam-nas de tudo, desconfiam delas...não querem saber senão do seu enredo e da sua grandeza ou miséria...das suas dores e prazeres e não se abrem a uma verdadeira consciência...mas eu falo das mulheres que por suposto querem e dizem querer
DAR UM SALTO de consciência, fazer a diferença, DIZER NÃO ao que as esmaga e inferioriza, seja o marido, o filho ou o patrão, o irmão ou o pai...isso ela não faz...
Seja como for sem essa consciência da sua cisão-divisão o mundo feminino, como diz este autor que citarei de seguida, sem o equilíbrio emocional ..."o iniciado"...neste caso devia dizer, a mulher, a iniciada ...pode criar uma ilusão de iluminação e o seu mundo pessoal desmoronar-se...
As mulheres sem essa consciência de si enquanto mulheres também acontece que ao agruparem-se tudo o que acabam por revelar a curto prazo é o seu antagonismo e rivalidades. Sem essa consciência e trabalho feito dentro, sem essa coesão interior, esse amor da mulher por si mesma, o que acaba por se manifestar nos grupos e nos encontros de mulheres, são os complexos e traumas de mães e filhas e irmãs que umas e outras reflectem sobre as outras e ao fim de pouco tempo odeiam-se todas...ou vão formar outros grupos com desconhecidas para se afirmarem na sua descompensação emocional e psicológica.
Ressalvo sempre mulheres sérias e honestas que fazem um trabalho de pesquiza e de estudo muito sérias e dedicadas...mulheres de alma e fé, com trabalho feito, adultas e responsáveis, mas o que eu mais vejo ao meu redor é tacita e taticamente as mulheres unirem-se em grupos (e grupúsculos) umas contra as outras, disfarçadas de deusas e buscando protagonismo e importância...
Para além disso temos de ter em conta que a mulher em geral, a mulher comum, essa continua presa e condicionada à sua família, ao casamento, ao homem e aos filhos ou a sua afirmação social - profissional...isso é que o seu centro e a sua vida, mesmo mal tratada ou porventura abusada, humilhada, continua a alimentar os outros que a exploram (muitas vezes maridos e filhos) e as deixa exangues e a si desprezam-se, submetem-se ao Sistema aos padrões, e desprezam igualmente as outras mulheres à sua imagem - acusam-nas de tudo, desconfiam delas...não querem saber senão do seu enredo e da sua grandeza ou miséria...das suas dores e prazeres e não se abrem a uma verdadeira consciência...mas eu falo das mulheres que por suposto querem e dizem querer
DAR UM SALTO de consciência, fazer a diferença, DIZER NÃO ao que as esmaga e inferioriza, seja o marido, o filho ou o patrão, o irmão ou o pai...isso ela não faz...
Seja como for sem essa consciência da sua cisão-divisão o mundo feminino, como diz este autor que citarei de seguida, sem o equilíbrio emocional ..."o iniciado"...neste caso devia dizer, a mulher, a iniciada ...pode criar uma ilusão de iluminação e o seu mundo pessoal desmoronar-se...
“No mundo feminino, a evolução do iniciado poderá cair completamente se as emoções e os sentimentos deste último não forem suficientemente equilibrados. Dito de outra maneira, nós não podemos simplesmente continuar a avançar sobre a via da iluminação se nunca chegarmos a um certo equilíbrio emocional. Sem amor nem compaixão, e sem um corpo emocional de boa saúde, o mental humano pode até fazer-nos crer a todos que tudo está bem. Ele pode até criar a sensação que o adepto chegou mesmo á sua iluminação, enquanto na verdade todo o seu mundo pessoal se desmorona.”***
*** in Drunvalo Melchizedek – O antigo segredo da Flor da Vida
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2 comentários:
Se observarmos a cultura e sociedade actuais, e à semelhança de todas as outras áreas da vida, faz sentido que também esta tenha sido apropriada por narcisistas sem escrúpulos. É a "deusa" narcisista que tem estado a ser promovida e vendida... E são assim as "deusas" em carne que se apresentam nos grupos: a "deusa-rainha", adorada e venerada pelas restantes mulheres, superior a elas e a quem DEVEM vassalagem, e hai de quem não a prestar! (É, aliás, interessante observar as imagens que promovem os cursos e encontros, onde é frequente termos a "deusa" no centro do grupo rodeada de mulheres embevecidas que bebem cada palavra, tipo Jesus e os apóstolos...).
Enquanto houver Tempo e existirem mulheres, haverá MUITO trabalho a fazer certamente. Na "nova era" fake, "novas" versões estranhas que já se conhecia surgirão, e sem vigilância e sentido crítico, (sem quem desmistifique!), essas versões vão-se tornando nas "soluções espirituais" dominantes e predominantes, precisamente porque a "new age" não se questiona, não olha a meios para atingir fins, e não se contém (daí a palavra tentáculos ser tão adequada), o que, curiosamente, nos leva de novo também ao narcisismo...
Beijinho grande e força para continuar sempre!
Sónia
Obrigada Sónia pela sua perspicaz observação e acréscimo ao meu texto - muito grata pelo seu testemunho...e por me incentivar e dar apoio. Precisam-se mulheres lucidas pois temos de destrinçar todo este novelo em que tantas mulheres se deixaram enrolar...
abraço grande
rl
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