O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quinta-feira, agosto 04, 2022

DOR: O CONVIDADO INDESEJADO



13 DE AGOSTO DE 2019 | 
Obra de Edel Rodriguez

O grande poeta sufi Rumi ensina: "Este ser humano é uma casa de hóspedes. Todas as manhãs uma nova chegada. Uma alegria, uma depressão, uma maldade, alguma consciência momentânea vem como um visitante inesperado."

Mas de todos os visitantes que chegam sem licitação à nossa porta, a dor talvez seja a menos bem-vinda. Ele pode aparecer de repente, nos debilitando fisicamente e enérgicomente, absorvendo nossa capacidade de atender a qualquer outra coisa — e pode ser obstinado em sua determinação de nunca sair. Para a pessoa com dor, não há nada mais imediato. A dor pode sentir malévola enquanto te mantém refém. Em casos extremos, como o sofrimento bíblico de Jó, uma pessoa pode até se sentir torturada por alguma punição superior.

Muitos irão aconselhá-lo que há uma razão para sua dor e que se você pudesse apenas curar suas feridas emocionais subjacentes, a dor iria deixá-lo sozinho. Mas o corpo não é uma abstração, e a dor ri da simplicidade excessiva dessa maneira de pensar.

O corpo é o primeiro portão de pertencimento. E embora tantas pessoas se sintam em casa em seus próprios corpos, estou espantado com o quão raramente é mencionado nas muitas conversas que tenho sobre pertencer aos outros. Sua ausência em nossa consideração fala volumes. Há muitos fatores contribuintes para a desconexão corpo-alma da humanidade, mas o modelo médico ocidental é um grande defensor do desprendimento nessa dor e desconforto são considerados inaceitáveis e onipresentemente controlados com medicamentos.

Se podemos diminuir o sofrimento daqueles que precisam, então é claro que deve ser uma coisa boa. Mas a medicina moderna tem sido tão consumadamente afastada de suas origens sagradas que não vê mais como a dor pode ser vista como significativa ou mesmo benéfica. Esse paradigma nos torna não apenas intolerantes à nossa própria dor, mas intolerantes àqueles que sofrem com dor crônica.

Estamos tão obcecados em curar doenças e erradicar a dor que somos incapazes de considerar as pessoas vivendo com dor como levando vidas intactas. Mas talvez mais insidioso seja como isso nos afasta de nossa própria dor e doença miserável. Estamos tão motivados a "ficar bem" que raramente mostramos qualquer bondade acolhedora a esse convidado inesperado em nossas vidas.

Rumi diz que gritar de fraqueza é o que convida a cura a derramar em sua direção. Ele escreve: "Tudo que a medicina quer é a dor para curar." Quão forte deve ser para se permitir ser visto em sua fraqueza. E como é corajoso o outro ser inabalável indefeso. A dor me levou à prática de aparecer de mãos vazias e ainda ser adorável. Dor, lesão e doença nos pedem para considerar que nossas vidas são dignas sem justificativa.

A verdadeira cura é um processo sem amor de viver nos longos períodos de dor. Forjando para a frente na escuridão. Mantendo a tensão entre a esperança de ficar bem e a aceitação do que está acontecendo. Ter uma devoção à tarefa impossível de recuperação, enquanto está disposto a viver com a permanência de uma ferida; amizade com ele com uma tenacidade séria para encontrá-lo onde ele vive sem empurrar nossa agenda sobre ele. Mas aqui está o paradoxo: você deve aceitar o que está acontecendo, mantendo o coração pulsando para que você se torne, por mais lento e sussurrante que possa ser.

Por todas as vezes que alguém lhe perguntou como você está, e você se sentiu pressionado a dizer "estou bem" quando bem não era toda a sua verdade, eu lhe ofereço esse desejo: que isso te encontre não apenas bem, mas todas as coisas que ser humano nos pede. E para lembrá-lo que você estar vivo, em todas as suas cores magníficas e complicadas, é mais do que suficiente para o amor. Em vez de procurar incessantemente ficar bem, ou ansiar por "como as coisas costumavam ser" ou "pode ser um dia novamente", devemos estar dispostos a andar com nossa dor. Ou pelo menos estar disposto a dizer: "Isso também é bem-vindo. Isso também pertence."

Trecho de "Belonging" de Toko-pa Turner

3 comentários:

Vânia Jones disse...

Sofro de fibromialgia e fadiga crônica e sabes que quanto mais o tempo passa mais a dor se aloja e intensifica. Não há curas, e pensei q quando "tratasse" os meus traumas ou fizesse algum tipo de terapia isto até passasse só que não. O que tenho vindo a aprender é a viver com dor de dia de noite porque ela nunca vai embora. Os acontecimentos que a causaram existem e só me resta mesmo acarinhar me e ter toda a paciência do mundo comigo. Não há nada nem ninguém médicos ou terapias que ajudem. É primariamente um trabalho meu. Até a fisioterapia e a piscina de água quente cansam mas a maior das dores e a causa das físicas é a dor emocional.

rosaleonor disse...

Sim Vania, é quase dificil curar as feridas e as dores... vivemos neste mundo e ele é feito de dores e a grande mentira é dizerem-nos que há cura e felicidade e amor, quando não há...a Humanidade está doente, é doente na sua maioria e as pessoas só faz fazem mal e raramente nos amam...
Desejo-te muita força e coragem para atenuar as tuas dores e continbuar forte e a teres consciência deste mundo em ruinas...
Grande beijinho

rlp

Vânia Jones disse...

Ter consciência deste mundo gera muita tristeza Rosa. Obrigada pelo carinho beijinhos 😘