e o espaço é uma grande muito quieta
onde os nossos olhos penetram
no não sabermos até onde
ali
além
no além onde tudo acontece
Oh
oh espaço de tudo ser tão ligeiro e impalpável
e sermos nós a respiração da
teu bafo ritmado
imperceptível distância
Oh augusta majestática dignidade do silêncio
Oh impassibilidade da tua mecânica celeste
Oh organismo primeiro de todos os fins secretos
da compreensão das coisas
Oh inorgânico organismo dos seres
que se devoram
Oh diz
a quem servimos nós de pasto
Canto-te
como quem pronuncia o Mantra esotérico do teu nome
Canto-te e grito
para que a poeira que se infiltra em todas as
coisas se erga de ti como um plâncton
Oh Madre
matriz das criaturas inferiores que rastejam
a teus pés cobertas de pó
esse pó que a cada momento ameaça submergir-nos
Oh aranha enorme tecendo tua teia de pó
Oh que desintegras tudo e tudo tu constróis
Ah como nós lambemos tuas duras mãos
Oh que fustigas nossos olhos com tua sombra
Enorme
Oh que deixas tanto espaço para o silêncio
das mil pétalas
dos mil braços esplendorosos em seu abandono
dos murmúrios
dos afagos
sangue derramado sobre o mundo
Oh
Porque és sempre tão premente?
e sempre estás ausentemente
na tua constância em todas as coisas?
Oh sono
Oh morte tão desejada e longa
mágica povoada de átomos
milhões de espíritos enchem o teu sopro
E penetras em nós como uma bala
E tudo morre quando tu chegas
E tudo se dilui e se transforma em ti
alada presciência de tudo acontecer
tão longe de nós e tão antigamente
e tudo nos ultrapassar com soberana indiferença
ante os nossos olhos cegos pelo teu negrume
Oh
brilha para dentro de mim
Acende teus luzeiros em meus olhos
Ergue teus braços oh prenhe de tudo
Oh vaso
Oh via láctea de nos amamentares com teu leite
de sombra
Oh úbere e pródiga
Aleita tua ninhada faminta
Grande fera luzidia
Grande mito
Grande deus antigo
Oh urna onde todos dormimos
Oh
Meus olhos choram já de tanto prescrutar-te
E canto-te
Canto-te
Para que tu existas
E eu não veja mais nada além de ti
E nada mais deseje senão que venhas outra vez
levar-me para dentro do teu ventre
de nunca mais haver
E nada mais haver que
Oh tu definitivamente além
Ana Hatherly
Poemas de Eros Frenético e Contemporâneos
um calculador de improbabilidades
Quimera
1 comentário:
Ainda entre vivos, embora desaparecida.
Abraços
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