O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quarta-feira, junho 13, 2012

O ABUSO SEXUAL E PSICOLÓGICO DAS MULHERES


PORQUE SÃO AS RELAÇÕES HOMEM MULHER DOENTIAS…


Parece mentira digo-me, mas há muitas mulheres e jovens ainda com medo de se enfrentarem, de se confrontarem com a sua realidade por vezes dramática de abuso psicológico por parte dos companheiros ou de violência doméstica e algumas, mesmo sendo já bastantes conscientes da sua prisão afectiva/sexual, não o são da sua cisão psíquica e emocional ou mesmo da sua falta de identidade/liberdade de serem inteiras. Elas não sabem o que está na base desse seu pendor para o sofrimento à partida, o porquê da sua sujeição, que vem de mãe para filha, e, apesar de não saberem bem o que as condiciona, nem verem claramente o que as atormenta, elas sentem o peso dessa tradicional e quase “natural” agressão de que são vítimas por parte dos homens em geral, dessa asfixia no casal, essa dor funda que se agudiza, essa ferida, comum às mulheres…mas não têm forças nem capacidade de se libertarem…

É um enorme peso atávico o que as prende a esses automatismos de fraqueza e “aceitação”…

Por mim seria normal pensar que essas mulheres pudessem ou quisessem dar um primeiro passo para se libertarem da prisão das relações doentias de dependência ou de violência psíquica…mas a verdade é que há muitas mulheres válidas e cultas que estão, para além da dependência económica, presas a um companheiro deprimido ou narcísico, dominador ou explorador ou mesmo agressivo, e que são incapazes de se libertarem e darem expressão ao seu ser verdadeiro e mesmo ao ver claramente o que as fere, o que as diminui e faz mal…elas não conseguem sair desses laços!

Normalmente as mulheres vivem relações sufocantes que as aprisionam, e o mais comum é, por medo de perder o amor, repetem esse padrão uma vida inteira, seja por hábito ou por cansaço ou ainda por incapacidade de se libertarem, elas continuam a sofrer todo o tipo de afrontas e ofensas impostas pelos companheiros…elas abdicam de si e da sua liberdade, da sua expressão e identidade por causa de um filho, da casa, marido ou companheiro, as vezes homens-filhos…que buscam uma mãe…e muitos odeiam a Mulher…

O ano passado soube de uma médica na casa dos 40 que era permanentemente perseguida pelo companheiro entre o trabalho e a casa e que ele não a deixava um só momento viver fora da sua alçada e embora ela tenha buscado auxílio terapêutico, não conseguia deixar de sentir medo e viver aterrorizada pela opressão e vigilância que ele lhe fazia, ao ponto de gerar violência…e sei também ainda hoje soube, de outras mulheres inteligentes, até psicólogas ou escritoras… que têm relações asfixiantes e nada conseguem fazer para se libertar…o que nestes casos me parece inconcebível à partida. Porque elas não são “empregada domésticas”, nem mulheres pobres que os maridos exploram e são bêbados e lhes batem e nem mesmo sendo elas hoje em dia quem sustentam as casas o deixam de fazer e ainda lhes têm mais raiva e ódio…Mas estas mulheres não têm a cultura das outras, nem a instrução e falta-lhes a capacidade e meios de se libertarem; elas não têm alternativas e sendo essa a grande maioria, mulheres pobres ou classe média baixa, não têm as mesmas possibilidades que as mulheres cultas ou intelectuais, que no entanto vivem sujeitas ao mesmo padrão das mais pobres e não se conseguem libertar também.

Sim, eu sei o peso da educação secular e a forma com as mulheres de todas as classes foram educadas ou mantidas social e culturalmente presas a preceitos e conceitos que as diminuem e subjuga…e mesmo hoje que parece haver grande liberdade para as mulheres no mundo, os ditames estão lá e os sinais da sua escravidão também. Mesmo que intelectualmente sejam capazes de se olharem e verem os problemas ou de equacionar os seus dramas, elas são incapazes de sair dos impasses e de serem elas próprias a conduzir as suas vidas, sacrificando a sua liberdade interior e a sua verdade ao casamento ou à relação de dependência tantas vezes, mórbida ou violenta. E isto é transversal a todas as sociedades e culturas…


O que é que pesa então sobre as mulheres em geral, que carga é essa, que cegueira, que faz com que elas acarretem todo esse sofrimento e abdicação de si sem nada poderem fazer e abdicam de si e de uma dignidade em nome dos filhos e da família? Que família é essa onde a mulher é assim tratada? O que esperamos nós desses filhos que vivem esse exemplo…não será por isso que tudo se torna vicioso e doentio e assim temos a sociedade que temos…


Como fugir a esse destino que parece ser inexorável e irreversível para a grande maioria das mulheres?

Como fugir ou contornar as leis e os preconceitos que a sociedade incutiu no seu espírito e as marcou, como fugir aos ditames de uma sociedade patriarcal e as suas leis que as cindiram, que as dividiram em duas... sabendo que essa divisão na maior parte das mulheres é absolutamente inconsciente... Como fugir a esses padrões em que a mulher foi educada, presa por todos esses parâmetros por que se rege a sociedade falocrática, que vive do imperativo do sexo, um sexo de afronta… e de que a nossa cultura, filosofia ou religião estão impregnadas e que permitem ainda essa exploração da mulher, alimentando a prostituição, incrementando essa divisão antiga, a separação da mulher como coisa como se fosse a coisa mais natural do mundo…Sim, as igrejas fazem isso e dessa maneira contribuem para que a mulher de uma maneira ou de outra seja sempre dominada e dependente? Não raramente vêm padres e bispos falar da família de da culpa da mulher…

E tudo o que a mulher sente e vive na pele muitas vezes é essa dor estranha que vem dessa cisão de si mesma em duas mulheres, esse medo e por outro lado essa luta pelo “seu” homem que mantém preso sob a ameaça da “outra”…E este enredo e rivalidade entre mulheres repete-se a toda a hora e em qualquer lugar no planeta…

È a “primeira-dama” francesa que se vira contra a primeira mulher do presidente Hollande, apoiando um seu opositor. As mulheres sempre umas contra as outra ao mais alto e ao mais baixo nível…

Porque há sempre uma mulher que têm direitos, sendo ela a propriedade do homem, pois se comprometeu e assinou um contracto, assinou um papel, sacrificando -se ao homem e ao sistema, que são os filhos e a casa e as demais obrigações... (e não digo que ela como mãe não ame os filhos e até o marido) mas é sempre partida dentro de si porque apenas uma metade dela que tem direito a sobreviver e lhe dá a legitimidade de esposa e a outra parte é reprimida, rejeitada, e a outra, é a mulher oculta de si...e que ela teme na “outra” fora e a espelha em tudo o que ela queria secretamente e nunca ousou fazer…que nunca foi capaz de ser porque a mulher tem medo de se exprimir na sua inteireza: ela pode até já saber como se sente dividida ou suspeita de uma outra que é ela mesma, mas que sempre apontou fora como persona não grata, e agora falta-lhe a coragem de ser inteira, até porque está perdida de si há séculos…e ela continua a ver a sua sombra na mulher perversa que lhe rouba o seu marido ou lhe tira o filho …como a mulher perversa inveja a mulher legítima que queria e não pode ser…

A mulher moderna não sabe como começou essa divisão, não se lembra…e por isso não tem consciência!

Ela não sabe, não se lembra…Sim, não se lembra de todo como é que perdeu essa inteireza e essa alegria que surgia quando era menina, essa espontaneidade de adolescente, essa ânsia no coração que a despertava do sonho, não sabe e não se lembra que aos poucos perdeu essa sua parte instintiva, sensual, ardente e selvagem, a que corresponde a sua força, a sua alegria...pois sempre que a manifestava e se soltava era olhada com desprezo e julgada como um mal provável, uma ameaça para a família ou para a sociedade... e assim a menina mulher aprendeu cedo a reprimir-se, a esconder essa parte de si, sim, essa parte de si mais profunda e autêntica, para poder ser exemplo de “uma boa menina” e ficar ao serviço da família e do homem ou do estado...então ela fez tudo e tudo de si deu... deu-se no corpo e no sexo, deu-se em esforço e sacrifício tentado ser o que dela esperavam...mas não se pode dar a ela mesma porque ELA - a força da Natureza em si ou a Deusa, - não estava lá...

Então um dia a mulher acorda do seu cansaço, da sua tristeza ou amargura, da sua raiva ou da sua nostalgia, ou pela idade ou por uma doença fatal e súbita ou pelo desgosto da perda…da desesperança de obter aquilo que uma vida inteira não obteve: o reconhecimento do seu valor, da sua força, da sua coragem, da sua entrega, do seu sacrifício…e desaba…

Sim, ela cansou-se de tal modo que teve um esgotamento, uma grave depressão…e acordou, sim, finalmente percebeu que está vazia dela mesma...que há um enorme buraco no seu coração, uma enorme ferida de rejeição de si...e começa a buscar os seus pedaços, os seus fragmentos e assim, já quando tudo parece perdido, ela ergue-se como a Fénix…e começa a renascer das cinzas de si mesma...porque ela morreu…e vê que se deu sem se dar, que se abriu sem se abrir, que amou sem se amar…e que o seu coração sempre esteve partido em dois…em esforço e sacrifico, à família, aos filhos e a tudo o que exigiam dela…o marido ou o companheiro que a tolhia e lhe dizia: “tu não és esta ou tu és aquela” e que sempre a acusou de não fazer nada…de ser uma inútil ou uma incompetente, uma isto e uma aquilo, afinal…pois a mulher sempre foi o bode expiatório do homem…sempre foi e fez o que o homem quis…e porque hoje começa a enxergar um pouco mais e a não fazer tudo o que o homem quer…ela volta a ser perseguida e queimada nas novas fogueiras que não são da Inquisição, mas de um publico e de uma sociedade ávida de explorar a desgraça alheia e a miséria humana, através das vizinhas, alcoviteiras, revistas, televisão e cinema…


Esta é a história de mães e filhas, de avós e tias…de irmãs talvez…histórias que se repetem e se repercutem ainda em todas as telenovelas e filmes…e que afinal na realidade são mesmo assim ainda…


rlp



2 comentários:

Anónimo disse...

Susana Balán, no livro Diferentes Formas de Amar fala sobre estes paradoxos na educação das meninas.

Acho que no inconsciente feminino é impregnado que sem o homem não somos capazes.

Eu estou solteira e sempre recebo olhares de pena por não ter um namorado e isto das próprias mulheres, como se ter um homem fosse o objetivo principal de uma mulher. Sem falar que a própria mulher acha que lhe querem roubar o "troféu", o homem.
Neste pensamento, até a mais culta das mulheres (que tb n entendo o pq de se subjugar a um relacionamento doente) n se sente inteira sem um homem (ao contrário de um homem).

rosaleonor disse...

É isso mesmo Else...mas ter essa consciência é um enorme avanço para nós...também sempre fui só e senti na pele esse olhar...como se não fosse uma mulher completa em mim. Mas ganhei a batalha. E esta devia ser uma "guerra" santa para nós...sermos Mulheres Integrais em nós mesmas, independentemente de haver ou não um homem ou um filho na nossa vida. Na minha não há...E sinto-me inteira em mim!


Obrigada por comentar!
um abraço
rosa leonor