De RAQUEL VAARELA - historiadora
O dono da padaria portuguesa diz que vive em concorrência, não pode pagar muito mais do que o salário mínimo, e quer os trabalhadores disponíveis a qualquer hora para ele, se não a empresa fecha e os trabalhadores perdem o emprego. O dono da padaria portuguesa tem que pagar o lucro do proprietário de terra que faz trigo; o lucro da empresa de transportes que o transporta para a cidade; o lucro da Galp onde a empresa mete gasóleo; o lucro da EDP; o lucro da Bosh que lhe vendeu... o forno e os frigoríficos; o lucro dos accionistas bancários que vivem da dívida pública via impostos ao Estado que paga o dono da Padaria; o lucro do banqueiro que lhe emprestou dinheiro. Cansados? Ele ainda tem que pagar pelo menos o lucro a mais 100 empresas (fruta, leite, sumos, vidros, janelas, pinturas, alumínio, limpeza…). E todo este lucro vem do meio de uma relação entre um pão e o consumidor. Chama-se capitalismo, fazer dinheiro com serviços básicos e elementares, ou, na versão ideológica não científica «o sistema económico» – assim, o «sistema», até parece cientifico e eterno, estilo lei da gravidade. O corajoso empreendedor vive aterrorizado com medo de ser esmagado pela concorrência e ficar endividado ao banco a quem pediu dinheiro, com juros, para intermediar o consumo de pão e sumos. O banqueiro também tem medo porque pediu ao outro banqueiro mais dinheiro, a juros também. O dono da padaria quer ter menos medo, o banqueiro não gosta de sustos, flexibilidade é bom mas só se for para os outros, para nós segurança, máxima! E qual é o selo de emprego para a vida do dono da padaria? Os 500 euros que paga aos seus trabalhadores. O dos banqueiros já sabemos, somos nós os contribuintes. Emprego para a vida está-lhes garantido pelo Estado, que lhes protege as dívidas. Não se vá dar o famoso «risco sistémico». Mais seguro ainda, explicaram, é se os trabalhadores da Padaria Portuguesa ficarem lá até às 11 da noite – nem com o padeiro dormem as mulheres! Amor, isso é?! Deixa-me pensar…Vida própria? Família, lazer, pieguisses… Pagam 400 euros de casa, 100 de passe social e vão mendigar o cabaz social e a tarifa social da electricidade e a isenção das taxas moderadoras ao Estado, dobrando-se na frente da assistente social, que lhes vasculha a vida, humilhando-se – a isto chama muita gente, defendendo a assistência social, «dignidade», ou seja trabalhar e não conseguir sequer comer e pedir ao Estado comida, no século XIX. Perdão, queria dizer XXI.
Marcelo Rebelo de Sousa tira selfies. Dá abraços e pede paz social.
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