O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quinta-feira, julho 25, 2019

A ILUSÃO DO MUNDO CIVILIZADO



A VIDA CIVILIZADA EXIGE UM ESTADO DE ILUSÃO


“A sociedade é uma construção artificial, uma protecção contra o poder da natureza. Sem a sociedade sentir-nos-íamos a navegar no mar bárbaro e tempestuoso que a natureza é. A sociedade é um conjunto de circunstâncias herdadas que atenua a nossa humilhante passividade face à natureza. Podemos alterar essas circunstâncias, com mais lentidão ou maior rapidez, mas nenhuma alteração na sociedade poderá mudar a natureza. Os seres humanos não são a primeira escolha da natureza. Nós somos apenas uma das inúmeras espécies sobre a qual a natureza exerce indiscriminadamente o seu poder. A natureza tem uma matriz original de que só vagamente nos apercebemos.
A vida humana começou pela fuga e pelo medo. A religião emergiu de rituais de expiação, feitiços para aplacar os elementos punitivos.
(...) 
O ser humano civilizado esconde de si próprio o grau a que está subordinado à natureza. Se a elevação da cultura preenche a sua alma, o conforto da religião conquista a sua fé. Mas basta um simples encolher de ombros por parte da natureza e tudo fica um caos. Fogos, inundações, relâmpagos, tornados, furacões, erupções vulcânicas, tremores de terra – por todo o lado e a toda a hora. As catástrofes atingem tanto os bons como os maus. Mas acontece que a vida civilizada exige um estado de ilusão. E a ideia da benevolência suprema da natureza e de Deus é o mecanismo mais poderoso para a sobrevivência do ser humano. Sem ele, a cultura regressaria ao medo e ao desespero.”



CAMILLE PAGLIA, in MULHERES LIVRES HOMENS LIVRES, Quetzal 2018



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