O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

domingo, agosto 21, 2016

mundo ainda não criou seres capazes de se amarem


O ENCONTRO CONNOSCO MESMOS/AS

 .."Amor é quando é concedido participar um pouco mais. Poucos querem o amor, porque o amor é a grande desilusão de tudo o mais. E poucos suportam perder todas as outras ilusões. Há os que voluntariam para o amor, pensando que o amor enriquecerá a vida pessoal. É o contrário: amor é finalmente a pobreza. Amor é não ter. Inclusive amor é a desilusão do que se pensava que era amor. E não é prêmio, por isso não envaidece, amor não é prêmio, é uma condição concedida exclusivamente para aqueles que, sem ele, corromperiam o ovo com a dor pessoal. Isso não faz do amor uma exceção honrosa; ele é exatamente concedido aos maus agentes, àqueles que atrapalhariam tudo se não lhes fosse permitido adivinhar vagamente.”
(...)
Clarice Lispector

Não, o mundo ainda não criou seres capazes de se amarem…


Porque sem que cada ser se conheça e se ame primeiro, ninguém se pode amar e este é o círculo vicioso do mundo! E aqui voltamos ao âmago da questão: pode a mulher mãe sem se amar a si mesma e sem que o homem a respeite amar o filho ou a filha? Sem dúvida que todas nós precisamos ser amadas e o merecemos, mas haverá algum homem nesta sociedade infame, de exploração comercial do que há de mais puro, a intimidade de dois seres, que verdadeiramente ame uma mulher? Ah! Se forem magras e elegantes…se forem bonitas e atraentes…se tiverem um peito assim e uma bunda assado…como as modelos? E vá de por silicone, vá de encher as nádegas, os lábios e as faces de plástico…vá de cortar os seios, vá de cortar o nariz os pés a ancas as mãos e não sei que mais as mulheres cortam para se parecerem com os ícones da moda e do cinema…
Como é que ainda a educação ou a falta dela, toda esta subcultura do feminino de séculos de ignorância e programação católica as escravizam ainda a padrões obsoletos que, apesar das lutas feministas que ajudaram a mudar muita coisa, não mudaram nada do essencial e a alienação da mulher em termos ontológicos é a mesma? Se antes eram “educadas” para casar, para procriar, para parir, para serem submissas aos homens e fiéis ao marido…agora substituíram isso pelo trabalho igual, pelas pílulas e a liberdade sexual; pelas estéticas e a moda e mais uma vez caíram na esparrela dos anúncios, ou dos contos do vigário; toda essa literatura romanesca com que encheram o seu vazio de sonhos de um amor romântico… pode já não ser os maridos, mas os amantes…e afinal para continuaram escravas do homem e dos seus padrões de beleza!
Sim, apesar de tudo se ter alterado nos costumes nestas últimas décadas e a confusão social pela perda de valores ser cada vez maior, e embora as mulheres trabalhem e ganhem por vezes mais do que os maridos e até parecem livres de fazer o que querem…continuam afinal emocional e sexualmente prisioneiras do homem a nível das suas células, a nível do inconsciente colectivo, pela alienação mediática e pelos filmes e por isso ainda acreditam numa espécie de príncipe encantado que agora é o milionário e no amor das telenovelas… As mulheres de hoje estão aprisionadas nessa armadilha invisível dentro delas. Pensam que são livres e não percebem as correntes que as amarram…
São centenas ou milhares de mulheres prisioneiras e no mundo inteiro milhões, mulheres presas dentro delas próprias, prisioneiras desses padrões, de um velho paradigma, amarradas a essa ansiedade feroz do amante nessa carência extrema de si mesmas que as caracteriza (diria, que as caricaturiza… porque essa mulher é uma caricatura de si mesma e do seu potencial adormecido) e que no fundo faz essa amarga solidão que as leva, em desespero de causa, a aceitar de volta homens violentos, homens que as maltratam ou a crer e a procurar novos amores e por mais que sofram e sejam traídas, enganadas e mal amadas, nunca aprendem a lição nem a sua liberdade… Serão escravas as mulheres para todo o sempre?
Será que não vemos que enquanto não nos amarmos primeiro a nós mesmas, enquanto não formos auto-suficientes e conscientes do nosso ser integral, enquanto não integrarmos as partes de nós divididas, não nos podemos libertar…
Enquanto não nos podermos amar nem respeitar a nós mesmas como seres independente, como seres singulares, unos, nenhum homem ou mulher nos poderá amar. Enquanto não nos valermos a nós próprias, o amor seja de quem for não nos serve para nada. (De algum modo e a um certo nível isto também é válido para o homem…mas a mulher é um caso mais grave, porque o homem tem mais auto-estima que à mulher quase sempre falta…) Enquanto essa consciência não acontecer esse amor que vivemos é sempre a projecção ou uma ilusão temporária de que nos compreendem e aceitam, que encontramos o sucedâneo do pai ou da mãe…e que nos amam como nas histórias de reis e princesas ou antes, de gatas borralheiras e príncipes que a breve trecho se transformam em sapos e monstros, no virar da página…
rlp
escrito em 2009

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