O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

segunda-feira, julho 10, 2023

“O feminino não é um género. É uma dimensão.”



URGENTE E NECESSÁRIO O FEMININO 


UM POUCO DE HISTÓRIA DOS SEXOS: A sociedade patriarcal valoriza há milénios e promove apenas os aspectos masculinos do ser humano, subestimando e reprimindo os aspectos femininos. O resultado é que a mulher se esvaziou de si enquanto feminino, perdeu a sua identidade mulher de raiz, a sua ligação a natureza e ao utero para se tornar num ser mental, apenas exterior e sem essência, tornando-se assim uma “cópia” caricatural do homem a muitos niveis; o homem, por sua vez reduzido à masculinidade bruta e unilateral, perde a ligação aos valores femininos do seu interior e passa a ter uma relação opressiva para com a mulher, que subestima e explora apenas como objecto sexual. 
Mais recentemente ele começa a inventar uma mulher que não é senão uma forma aparente idealizada e de plástico, dividida em estereótipos. Dai hoje assistirmos a esta  deriva LGBT e os Transgéneros, que, sem a referência da Mulher genuína, seja na mãe seja na amante, esse homem começar a sentir-se essa mulher que ele inventou, e vice-versa, uma vez que deixou de haver uma Mulher real e autentica para passar a haver uma mulher ficticia, a diva do cinema e da moda ou a boneca de silicone, fabricada em décadas pelo imaginário masculino que eles agora querem ser.

Excerto da conferência:

Assim, toda a ênfase que nós possamos pôr agora no nosso feminino profundo, na busca do nosso feminino verdadeiro, na compreensão da mulher, e tanto em homens como mulheres, é extremamente urgente. Se cada uma de nos hoje sair daqui com esta consciência que é nossa, que é vossa, que não sou eu que transmito porque ela está em nós, se eu puder acordar um pouco, ou estimular um pouco, o que for o caso.
Eu estava numa certa angústia digamos "existencial" nestes dias, não era por causa da palestra, mas foi engraçado que acordei a meio da noite e vi o telemóvel. E então tinha lá uma expressão de uma amiga brasileira, que respondeu a uma pergunta inconsciente e que teria a ver com esta palestra. E ela dizia: 

“O feminino não é um género. É uma dimensão.” É uma dimensão de consciência. E essa dimensão – se agora se fala tanto na 5ª dimensão, andamos todos a querer ascender, sem realizar sequer a terceira… fica tudo igual… os trabalhos dão trabalho…portanto, é essa dimensão do feminino que nós temos que alcançar. E ficamos todos a ganhar, não só as mulheres, como os homens também, porque os homens há muito tempo que estão desprovidos da companhia da verdadeira mulher. Em parte culpa deles, mas em parte também da mesma vitimização que as mulheres têm, da educação que se teve. Portanto, no meu livro eu falo de uma personagem absolutamente polémica, que é Lilith, e que, penso eu, por inspiração, nos ocorreu, me ocorreu,  na escolha do título “Lilith, a mulher primordial”. E há um momento em que eu pergunto: “E agora, como é que vais sair desta? O que é que te garante que ela é a mulher primordial? E como é que começamos a nossa busca?” Nós temos uma essência feminina, nós somos um ser individual, nós temos uma alma que constantemente nos está a apelar para a transcendência. O livro já foi publicado há dois anos. Felizmente, tem tido imenso sucesso. Tenho tido feedbacks fantásticos de mulheres comuns, não da área, não da área do feminino sagrado, são mulheres comuns, que vivenciaram na pele de alguma maneira esta divisão que a mulher sofre, está aqui uma mulher egípcia, e estávamos a falar um pouco nas mulheres no oriente e no ocidente… as diferenças serão assim tão abismais? Não. Não serão, por assim dizer. 
(...)
Excerto da Conferência na Casa do fauno 2022
rosa leonor pedro


UMA HUMANIDADE "FORA DA MÃE"
 
Na encruzilhada na qual a humanidade se encontra, o que precisamos de fazer se queremos acabar com este sistema de dominação e sobreviver é recuperar a verdadeira mãe, e com ela as qualidades básicas dos seres humanos,
que nos capacitam para a concórdia e nos incapacitam para o fratricídio. Recuperar a mãe verdadeira é recuperar o habitat que a rodeia. Bachofen criou um termo em alemão para o definir: é o Muttertum, sendo que o sufixo “tum” (equivalente ao “dom” em inglês) significa o sítio, o lugar da mãe.
Não se trata apenas dum espaço físico, mas antes dum conjunto de relações travadas com o seu fluxo libidinal específico, o fluido feminino-materno, o hálito materno, porque a produção do nosso sistema orgânico libidinal, desenhado para organizar as relações humanas, é a matéria-prima do tecido social humano original. O Muttertum é assim como a urdidura da tela social, como lhe chamou na sua preciosa metáfora Martha Moia: um conjunto de fios, porque um fio sozinho não consegue fazer a urdidura.
Recuperar a mãe verdadeira pressupõe então recuperar o coletivo de mulheres e a sua função coletiva dentro dum determinado grupo social. A recuperação da mãe não é uma recuperação individual (embora tenha uma dimensão individual e corporal), mas a recuperação do feminino coletivo, de todas nós. Segundo Malinowski, as mulheres trobriandesas dum clã (in The Sexual Life of Savages in the Western Melanesia) tinham um nome coletivo, “tábula”, a “tábula” é que se ocupava do parto das mulheres do clã.
Em castelhano há uma aceção do nome "mãe" que é um vestígio dessa mãe ancestral, que se encontra na expressão "salirse de madre", "sair da mãe", que seria sair do Muttertum, que nos faz amadurecer e nos torna consistentes. Há também uma aceção em que a palavra significa "fonte originária de algo" ("a mãe do vinagre", por exemplo), ou como a raiz de algo, quando dizemos que encontrámos a "mãe do cordeiro". Se um rio sai da "madre", tudo se inunda e é o desastre. Pois assim anda a humanidade, "fora da mãe", em permanente estado de esquizofrenia e cada vez com mais ataques de violência..."

Cacilda Rodrigañez Bustos


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