O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quarta-feira, janeiro 22, 2003

Os livros e os gatos são mesmo os nossos melhores amigos...




ENTRE LIVROS


Extraordinário este diálogo ou monólogo de um livro que fala de si mesmo...





(...)

A Elzinha, então, aparecia por detrás da Virgem, como se esta tivesse criado vida, e tomava seu lugar no trono ricamente guarnecido de rosas; onde era coroada senhora e mãe dos céus. Eu sentia uma inveja enorme dela, e rezava para que a santa de verdade não descobrisse isso. E procurava mil defeitos na Elzinha, como estar grande demais para o papel. Sim, era isso, e no ano seguinte estaria maior ainda, e então seria hora de ela abandonar o trono.

(...)
de Ana Maria Gonçalves

Em "Ao lado e à margem do que sentes por mim"


Às cegas (excerto)

(...)

"Sente-se a forma, quase inteira na palma da mão; ou incontível. Depois toca-se suavemente o exterior, a textura, os dedos suavemente percorrendo os acidentes do papel e suas mínimas imperfeições. E no interior os decalques, os espaços vazios e as sobras ocas, as entrelinhas e os pensamentos em suspense.
Abre-se em leque e ouve-se o sussurro das películas que se sobrepõe, rentes ao ouvido, a intensidade e velocidade do som controladas pela habilidade das mãos. Pode-se então deitar ao chão, de uma altura cuidadosa, antes percebida pela robustês ou fragilidade do toque. E deliciar-se com o baque, geralmente único, possivelmente prolongando-se no eco do que não quer se deter. Guiado por onde ele termina, recolhe-se novamente.
Embriaga-se da leitura. Sorve-se o aroma dos antigos guardados, a herança dos velhos alfarrábios, a matéria-flora de que é feito. A matéria-mineral ou sintética de que é adornado. Inala-se os conhecimentos acumulados, o ar fresco dos ambientes abertos, até quase perder o ar, na tentativa de retê-los por mais e mais tempo.
Alguns quase pedem para serem degustados, devorados, à velha maneira simples do uso das mãos ao invés de talher. Talvez na ponta dos dedos impregne-se algo junto à pouca saliva.
E então lê-se. Às cegas, e como se fosse o corpo do ser amado: em braile."


Texto de Ana Maria Gonçalves


TIRADO DO UDIGRUDI

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