"Tu és o pássaro azul e tu és o pássaro verde; tu és a nuvem que esconde o relâmpago, e tu és as estações do ano e os oceanos. Para além do princípio, tu estás na tua infinitude, e todos os mundos tiveram em ti o seu princípio."
OS UPANISHADES
MEMÓRIA INTEGRAL
Sou uma memória integral
Carrego vidas recorrentes
na minha vida de agora
mas nada sei da memória causal
a definir-me no dia que ora passa
Habitam-me memórias de profundis
os manifestos efeitos
de existência em existência
Parto e chego
recomeço inconsciente
enquanto
as vozes abafadas
fundíssimas e subtis
incontroláveis
maniatam o livre ser
que eu me creio
Ergue-se um véu antigo
logo outros mil ocultam
histórias sem fim
cóleras águas velhos enredos
choro de alma aprisionada
intermináveis desvios
Sou uma memória integral
uma antiga colectânea
de registos infinitos
camadas sobre camadas
superimpostas
pelo passar inexorável dos tempos
Lembranças de amor e desamor
impressões vagas
sufocantes
do canto da alma
Feridas abertas mas não expostas
Sou
a criadora
da memória total
que eu sou
Sou
a zelosa guardiã
de prisões que me teci
e preservo
Património antigo não visitado
não entendido
á tíbia luz do momento que passa
Sou uma memória integral
caminhante uma vez mais
pelo mesmos gastos caminhos
De entre a luz espreitam as sombras
dos tropeços dos enganos
que engendrei
Sou uma memória integral
Sou memória
Só
Mariana Inverno
Londres, 1 de Maio de 2000
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