Do Dark Mirror de QAnon, Hope
Dezembro de 2020
POR Charles Eisenstein
"Um espelho escuro mostra características que preferimos não ver. Você contempla o rosto repulsivo na moldura do quadro, a caricatura de tudo o que é desprezível, apenas para perceber com um horror crescente que não está olhando para um retrato, mas para um espelho.
A derrota política de Donald Trump nas eleições de 2020 é uma encruzilhada para o movimento quase político agrupado vagamente em torno do mito da conspiração QAnon e, mais amplamente, em torno do próprio Trump. Porque o homem e o movimento foram um espelho escuro para toda a sociedade, é também uma encruzilhada para a sociedade.
Para aqueles que não estão familiarizados com ele, o movimento QAnon começou no início da administração Trump, quando uma pessoa misteriosa, chamando-se Q e alegando ser um membro da administração, começou a postar mensagens enigmáticas em fóruns de internet, particularmente o 8Chan. Isso consistia em insinuações e promessas de que Donald Trump estava executando um plano magistral para derrotar seus inimigos, desenraizar o Estado Profundo e restaurar a América à grandeza. Seu mantra, pelo qual os seguidores (chamados de QAnons) mantiveram a fé, era "Confie no plano". Por pior que parecesse para Trump, a vitória estava ao virar da esquina.
No momento em que escrevemos (final de novembro de 2020), parece que os QAnons não teriam escolha a não ser abandonar a fé. Não tão. Em vários cantos da mídia alternativa de direita, ainda se pode ler teorias desesperadas sobre como a aparente derrota de Trump é uma manobra para preparar seu golpe de mestre. Mesmo depois de deposto, mesmo que vá para a prisão, o mito só mudará de forma, já que é apenas o afloramento de um mito muito maior e antigo, impulsionado por forças sociais e psicológicas reprimidas. O mesmo vale para o trumpismo em geral. Portanto, é importante olhar para esse espelho escuro e ver o que foi escondido; caso contrário, enfrentaremos uma das duas possibilidades sombrias, cada uma pior que a outra. (1) Em alguns anos, um novo e mais formidável demagogo surgirá para canalizar as forças reprimidas em direção a um golpe fascista.
Eu gostaria de oferecer outra alternativa que se torna possível quando olhamos no espelho e encontramos as mencionadas forças reprimidas em sua origem. A cura, ao invés da vitória, é seu ideal formativo. Eu o chamo de mundo mais lindo que nossos corações sabem que é possível.
Uma mitologia reconfortante
É compreensível que tantas pessoas tenham celebrado a derrota de Trump, um homem que presidiu a separação deliberada dos filhos de imigrantes de seus pais, que provocou desnecessariamente a Rússia e a China, que deram passe livre para algumas das piores tendências racistas americanas, que deu luz verde a novos níveis de destruição ambiental, que impulsionou operações de mudança de regime na Venezuela e na Bolívia, e assim por diante. No entanto, também é verdade que a próxima administração Biden é abundantecom membros de Wall Street, falcões de guerra neoconservadores, funcionários de agências de inteligência, líderes de torcida do complexo industrial da prisão e representantes de Big Pharma, Big Data e praticamente Big Everything. Nem Joe Biden nem o Partido Democrata têm sido um defensor particularmente eficaz da igualdade racial, proteção ambiental, justiça econômica ou paz mundial por muito tempo. O próprio Biden conviveu com racistas declarados no início de sua carreira, foi um arquiteto-chave do encarceramento em massa, tem sido um defensor consistente das guerras estrangeiras da América e prestou inúmeros favores a Wall Street. Uma surpresa desagradável aguarda quem pensa que muito vai melhorar agora que os bandidos estão fora e os mocinhos estão dentro.
Seria conveniente se o problema com a América fosse Donald Trump, pessoas más que trabalharam com ele e ignorantes e idiotas que o apoiaram. Nesse caso, poderíamos dar um suspiro de alívio porque com a eleição uma vitória sobre o mal foi conquistada.
Ironicamente, a ideologia do QAnon é uma versão exagerada dessa mesma forma-pensamento básica. Diz que um grupo de pessoas diabólicas é responsável pelo mal no mundo, e que se eles pudessem ser eliminados, o mundo poderia ser curado. Na mitologia de QAnon, o locus do mal é o Estado Profundo, uma cabala de elite interpenetrando governo, corporações, bancos e outras instituições de elite, e o campeão do Bem é Donald Trump que, com sutileza, previsão e habilidade sobre-humanas, paga um 4D xadrez luta contra eles.
A mitologia QAnon oferece três graus de conforto. Em primeiro lugar, em um momento de colapso social e econômico, ameniza o desconforto da incerteza ao tornar o mundo compreensível. Em segundo lugar, absolve seus seguidores da cumplicidade no problema (em contraste com os sistemas reinantes de culpa, que envolvem quase todo mundo até certo ponto e não admite nenhuma solução pronta). Terceiro, oferece um herói, um salvador, um Bom Pai que acertará as coisas e sobre quem se pode projetar sua própria expressão de grandeza não realizada.
É tão tentador personificar o bem e o mal, localizar cada um na pessoa de quem quer que apareça de forma mais visível nos dramas oferecidos para nosso consumo. Um lado segura Donald Trump exatamente da mesma maneira que o outro segura George Soros e Bill Gates. Personificar o mal oferece o conforto de saber, pelo menos em princípio, como resolver os problemas do mundo. Há alguém para destruir, eliminar, derrotar, cancelar ou silenciar. Problema resolvido. O roteiro padrão de um filme de Hollywood é também o roteiro da guerra e, ao que parece, o roteiro de grande parte do discurso político atual.
Fui aconselhado a denunciar publicamente a QAnon, à qual respondo que não tenho o objetivo de denunciar ninguém. Ao esclarecer quem é amigo e quem é inimigo, a denúncia reduz o alvo à condição de inimigo. Não tomarei partido na guerra cultural, não porque acho que ambos os lados são iguais ou que todos os pontos de vista são igualmente verdadeiros, mas porque (1) acredito que os pontos cegos que ambos os lados compartilham são mais significativos e mais perigosos do que suas discordâncias, e (2) por trás do conflito está uma unidade oculta que surgirá quando todas as partes humildemente tentarem compreender a outra.
QAnon causou danos consideráveis à vida das pessoas e ao corpo político no contexto do neofascismo trumpiano e do racismo sistêmico persistente. No entanto, reduzi-lo e seus seguidores inteiramente a esses termos é cometer o mesmo erro - e obter quase o mesmo conforto - que o próprio QAnon faz ao reduzir uma situação complexa a um drama do bem contra o mal. Ao fazer isso, sacrificamos o entendimento real em favor de uma narrativa que divide o mundo em mocinhos e bandidos.
Daniel Schmactenberger expressa isso bem quando diz: "Se você sente uma combinação de indignado, assustado, emocional e muito certo com uma forte hipótese de inimigo, você foi capturado pela guerra narrativa de alguém e pensa que é o seu próprio pensamento." Visite o território inimigo, ele aconselha, e veja como é o mundo a partir daí.
Quem entre seus críticos pergunta: “Que verdade oculta busca expressão no fenômeno QAnon? Que verdade se apoia em seus mitos? ” Em um ensaio na primavera passada, cataloguei algumas verdades que permeiam o mito da conspiração da Nova Ordem Mundial (do qual QAnon é uma variante); por exemplo, que um poder desumano governa o mundo; que aqueles que chamamos de líderes são seus fantoches; essa autoridade estabelecida traiu nossa confiança. Nele eu escrevi:
O mito da conspiração representa a percepção de uma profunda desconexão entre as posturas públicas de nossos líderes e suas verdadeiras motivações e planos. Ele indica uma cultura política que é opaca para o cidadão comum, um mundo de sigilo, imagem, RP, spin, ótica, pontos de discussão, gerenciamento de percepção, gerenciamento de narrativa e guerra de informação. Não é à toa que as pessoas suspeitam que existe outra realidade operando por trás das cortinas.
O fato de QAnon estar repleto de islamofobia, racismo e outros sabores de intolerância não apaga a validade dessas intuições básicas. No entanto, ele ilustra a natureza trágica do fenômeno QAnon, que desvia uma revolta populista autêntica para sonhos vãos e divisões prontas. Essa é também, em parte, a tragédia de Donald Trump. Muito do que direi sobre QAnon se aplica ao trumpismo em geral.
A explicação simplificadora de por que tantas pessoas votaram em Donald Trump é que ele dá vazão a seu racismo, ódio e medo encobertos. Certamente, os Estados Unidos são o lar de muitos racistas inveterados, e o racismo até hoje exerce uma influência funesta na sociedade americana. No entanto, a caricatura do eleitor racista de Trump, ressentido com seu status declinante em relação às pessoas de cor e na esperança de manter seu domínio e privilégio contra as tendências sociais progressistas, deixa muito de fora. Isso não explica por que milhões de eleitores de Obama votaram em Trump em 2016 e presumivelmente em 2020. Não explica por que Trump ganhou uma porcentagem maior de votos de minorias do que qualquer candidato republicano desde 1960, enquanto seu apoio entre os homens brancos diminuiu de 2016 a 2020.
Se continuarmos a omitir todas essas coisas, temo que mais cedo ou mais tarde seremos confrontados com um aspirante a fascista que é mais jovem, mais suave, mais carismático e mais competente do que Donald Trump. Se não entendermos e abordarmos com precisão a causa raiz do trumpismo, é isso que acontecerá em 2024. Se Trump quase pudesse vencer em 2020, imagine o que tal homem ou mulher poderia realizar se as forças reprimidas que elevaram Trump se intensificassem.
Vícios e cultos
Com fome de quê? Obviamente, algo muito mais nutritivo do que o que as histórias de Q fornecem. É por isso que o QAnon e a mitologia da qual ele se baseia são tão viciantes (qualquer coisa pode ser viciantes que suprima temporariamente a dor de uma necessidade não atendida sem realmente satisfazê-la). Assim, os QAnons desceram a proverbial toca do coelho, aguardando ansiosamente sua próxima correção de um post Q, trocando amigos, alienando família, perdendo o sono, desperdiçando incontáveis horas improdutivas para obter um golpe após o outro de indignação, sentimentos de superioridade, garantia de que estão certo, e o conforto acima mencionado. Amigos e familiares falam em perder entes queridos para QAnon da mesma forma que falam em perdê-los para um vício ou seita.
QAnon realmente exibe muitas características de um culto. Ele atrai as pessoas para uma realidade alternativa, afasta-as de amigos e familiares e explora sua necessidade de pertencer. Isso os liga a um grupo de crentes, a participação no qual depende completamente do que alguém diz e acredita (ao invés da aceitação por quem ele é). No entanto, entender o QAnon e os cultos em geral como parasitas no corpo social corre o risco de ignorar as condições que convidam esses parasitas para começar. Queremos apenas suprimir o surto atual? O que será necessário para curar o corpo social em um nível mais profundo?
Cultos atacam os vulneráveis. O que torna alguém vulnerável? Primeiro, a desintegração de um sistema de crenças que dizia a uma pessoa quem ela é, como o mundo funciona e o que é real. Em segundo lugar, uma necessidade não atendida de pertencer. O candidato perfeito para o recrutamento para um culto é alguém cujo mundo desmoronou, deixando-o solitário e confuso. Não são pessoas fracas e estúpidas que caem em seitas. Qualquer pessoa que mantenha uma atitude hipócrita em relação aos QAnons e aos “teóricos da conspiração” está se iludindo.
Digo isso para remediar qualquer sentimento de superioridade que alguém possa obter lendo minha descrição dos falsos confortos da mitologia QAnon. É bom diagnosticar as patologias espirituais dos outros? Se for assim, pode ser porque nós mesmos sofremos uma versão da mesma fome que vemos no espelho escuro de QAnon. Mas, realmente, quem entre nós hoje não sofreu um colapso de significado ou uma necessidade não atendida de pertencer?
Hoje, a maioria da sociedade são os principais candidatos ao recrutamento para o culto. Nossas histórias geradoras de significado sociais estão em desordem. Cinquenta anos atrás, uma ampla corrente dominante da sociedade ocidental acreditava na marcha do progresso. O mundo estava ficando melhor ano após ano e geração após geração. Em breve, o progresso tecnológico, a democracia liberal, o capitalismo de livre mercado e as ciências sociais eliminariam os antigos flagelos da humanidade: pobreza, opressão, doença, crime e fome. Nessa história, sabíamos quem éramos e como dar sentido ao mundo. A vida fazia sentido dentro de uma narrativa linear de progresso que nos dizia de onde viemos e para onde estávamos indo.
A mitologia do progresso, da qual os Estados Unidos da América eram o paradigma mais importante, dizia-nos que a vida deveria ficar melhor a cada geração. Em vez disso, aconteceu o oposto. A mitologia do progresso nos falou de uma idade de abundância, mas hoje temos extrema desigualdade de renda e pobreza persistente ou crescente no Ocidente. Ele nos disse que seríamos mais saudáveis a cada geração que passasse; novamente, o oposto aconteceu, já que as doenças crônicas agora afetam todas as faixas etárias em níveis sem precedentes. Ele nos disse que a marcha progressiva da razão e do Estado de direito traria um fim à guerra, crime, e da tirania, mas os níveis de ódio e violência não caíram na 21 stséculo. Ele nos falou de uma era de lazer, mas a semana de trabalho e o tempo de férias estagnaram desde meados do século XX. Ele nos prometeu felicidade, mas hoje as taxas de divórcio, depressão, suicídio e dependência aumentam a cada ano que passa.
Acrescentando a tudo isso uma inegável crise ecológica, é difícil agora abraçar totalmente a mitologia do progresso como uma fonte de significado e identidade. Com o fracasso em cumprir suas promessas, a fonte de significado para a sociedade moderna agora seca.
A crise resultante de sentido, significado e identidade não apenas empurra as pessoas para os cultos e teorias da conspiração, mas também torna os sistemas de crenças tradicionais mais semelhantes a um culto. Até certo ponto, os principais meios de comunicação e mídias sociais fornecem exatamente o que o vício QAnon fez (indignação, sentimentos de superioridade, garantia de que eles estão certos ...) Eles também tendem a "atrair as pessoas para uma realidade alternativa, afastá-las de amigos e família e explorar sua necessidade de pertencer. ” Quantas reuniões de família estão arruinadas, quantos membros da família não estão mais se falando, tendo se dissociado em realidades separadas?
Permita-me um pouco de exagero retórico. Nos Estados Unidos, dois cultos dominantes aplicam as ferramentas da guerra de informação para competir pela lealdade pública: (1) o Partido Democrata, New York Times, MSNBC, NPR, culto CNN e (2) o Partido Republicano, Fox News, Breitbart culto. Cada um oferece a seus seguidores o mesmo conforto que Q: eles oferecem uma narrativa que dá sentido ao mundo em meio à mudança; oferecem um diagnóstico de problemas sociais que os justifica, e oferecem pessoas para torcer, campeões da causa da vitória sobre o mal. Eles também oferecem um sentimento de pertença. Você já teve a sensação de estar voltando para casa quando sintonizou seu especialista ou site favorito?
Cultos, exércitos e estados policiais dependem do controle da informação. À medida que as partes em conflito armam os fatos, aprendemos a desconsiderar todas as fontes de informação. Nós nos perguntamos qual é a agenda por trás de um determinado "fato". Sabendo que os guerreiros narrativos selecionam, distorcem ou inventam fatos, o cidadão astuto tende a perguntar "Quem disse isso?" antes de perguntar "O que eles disseram?" e então descrer do que eles disseram se servir a uma parte ou propósito desagradável. Em tais circunstâncias, como qualquer conversa é possível?
A falsidade rotineira dos políticos nas últimas décadas desolou os cidadãos cívicos, antes um rico domínio de amplos acordos sobre o que é real, o que é importante e o que é legítimo. Não podemos culpar apenas os políticos, é claro. De campanhas de relações públicas corporativas a operações psicológicas de agências de inteligência, de censura na internet a programas secretos do governo, estamos inundados de mentiras, engano, segredos, meias-verdades, mentiras, fraude e manipulação. Não admira que tenhamos tanta tendência a acreditar em conspirações. Seus blocos de construção estão em toda parte.
Aqui está o espelho escuro. O aumento das teorias da conspiração reflete um sistema de poder envolto em mentiras e segredos, que persegue ferozmente qualquer um que, como Edward Snowden e Julian Assange, puxe o véu de lado.
Esta crise na comunicação e na construção de sentido há muito tempo está se formando. A tentativa de dobrar a verdade para servir a outros fins prejudicou a alma da linguagem, desviando o poder criativo da palavra para a manutenção de ilusões. Conseqüentemente, nossa sociedade como um todo é incapaz de mudar seu curso. Isso exigiria um acordo, cujos blocos de construção se transformaram em areia. Tenho visto essa paralisia se intensificar há 20 anos. Em 2007, escrevi um ensaio chamado The Ubiquitous Matrix of Lies , no qual disse: “À medida que nos aclimatamos a uma matriz onipresente de mentiras, as palavras significam cada vez menos para nós, e não acreditamos mais em nada. Também não deveríamos! Estamos enfrentando uma crise de linguagem que está subjacente e reflete todas as outras crises convergentes da era moderna. ”
Nossos principais motores de produção de conhecimento - ciência, jornalismo e artes - já desfrutaram de uma legitimidade social robusta e quase universal. Agora, cada culto respira através do restolho do conhecimento comum em busca de grãos de fatos ainda acordados para adicionar ao celeiro de seu exército. As partes em conflito requisitam rapidamente qualquer nova safra que o cientista, jornalista ou filósofo independente possa semear. Se eles resistirem, sua colheita será totalmente queimada. Assim é que os melhores jornalistas hoje são todos independentes ou contribuem para publicações marginais: Matt Taibbi, Glenn Greenwald, Diana Johnstone, Seymour Hersch .... Eles desafiam a narrativa de ambos os cultos (direita e esquerda) e, portanto, porque nos desiludem da caricatura colada no espelho, nos dê a chance de ver algumas verdades sombrias.
Quando o ódio sequestra a raiva
O significado da crise tem causas econômicas diretas. É difícil acreditar no projeto social quando se é economicamente inseguro, politicamente destituído de direitos, privado de dignidade e privado de participação na sociedade como membro pleno. Esta tem sido a condição dos afro-americanos e de outras pessoas morenas na América, junto com as mulheres e aqueles que se desviam das normas sociais. Hoje, as mesmas forças econômicas que exigiram sua opressão e lucraram com ela se voltaram para a classe média branca. A Máquina que antes dependia do racismo branco para manter uma subclasse marrom agora devora a sua própria, mastigando vastas áreas da América central e cuspindo cartilagem e ossos no monte de lixo da irrelevância privada.
Ouço o leitor protestar por eu traçar uma equivalência entre as minorias oprimidas, que têm apenas circunstâncias externas para culpar por sua pobreza e desespero, e os QAnons principalmente brancos que, apesar de ter muito mais privilégios, chafurdam em sua fragilidade branca, culpando a todos mas a si mesmos por suas vidas sem saída, seu celibato involuntário e seus vícios em videogames? Este tipo de avaliação hipócrita, que é comum em tópicos de comentários de mídia social de tendência esquerdista, espelha exatamente os canards racistas padrão sobre negros preguiçosos e irresponsáveis que culpam o sistema e se recusam a assumir responsabilidade pessoal. Ambos se recusam a olhar para as condições que geram as escolhas que condenam.
A questão relevante aqui não é quem sofreu mais, quem é a maior vítima, quem é o mais oprimido e, portanto, o mais merecedor de compaixão. A questão é: quais são as condições que deram origem ao trumpismo e como podemos mudá-las? Devemos fazer essa pergunta, a menos que nossa estratégia seja uma guerra sem fim contra aqueles que consideramos irremediavelmente maus.
Assistindo a uma entrevista com o fundador extremamente penitente do 8chan (fórum principal da QAnon), Frederick Brennan, fiquei comovido com sua descrição de usuários típicos do 8chan, particularmente os “Incels” e aqueles que engoliram a “pílula preta”. O primeiro termo refere-se a homens involuntariamente celibatários; o último se refere ao niilismo. Isso não define de forma alguma o movimento QAnon inteiro, mas oferece uma janela para alguns dos traumas sociais que o conduzem.
Exibindo vários graus de misoginia, os Incels atraem muitas críticas. Eles são denunciados por se considerarem “com direito ao sexo” e insultados por transferirem a culpa de suas próprias falhas para as mulheres. Podemos denunciá-los e combatê-los online, denunciá-los e cancelá-los, mas podemos vê-los como humanos? Podemos ver seu desejo frustrado de amar uma mulher, de constituir família, de contribuir de forma significativa para a vida? O desejo frustrado naturalmente se transforma em violência, dirigida aos outros, a si mesmo ou a ambos.
Mais uma vez, ouço um protesto: “Tudo bem para você, como um homem branco heterossexual, pedir compaixão por esses perpetradores e seu avatar, o criminoso-chefe Donald Trump, mas e quanto à compaixão pelas vítimas? Eles precisam ainda mais. ” A isso eu digo: por uma questão de pura praticidade, é precisamente a compaixão pelas vítimas que requercompaixão pelos perpetradores. A compaixão nos permite reprimir a violência em sua fonte. Compaixão não é o mesmo que dar passe livre a alguém ou permitir que continue prejudicando outras pessoas. Compaixão é a compreensão da condição interna e externa de outro ser. Com esse entendimento, pode-se efetivamente mudar as condições que geram danos. É precisamente a mesma lógica que os esquerdistas usam quando falam sobre o crime. Em vez de travar uma guerra sem fim contra os criminosos, vamos examinar as condições que geram o crime. O que torna alguém um traficante de drogas, um ladrão, um membro de gangue? Quais são as condições de trauma e pobreza? Seguindo a trilha dessas perguntas, pode-se chegar a respostas de nível raiz.
Quer estejamos falando sobre a juventude do centro da cidade crescendo em extremo trauma e privação, ou o Incel branco vivendo no porão de seus pais apenas com seu desespero, sua dívida de estudante e seus videogames como companhia, devemos ter cuidado para não imputar desamparo para essas vítimas das circunstâncias. Não existe circunstância opressora demais para o ser humano transcender. Existe um lugar para mensagens como “Pare de ser uma vítima. Assuma o controle de sua vida. Pare de pedir caridade. ” Porém, de maneira crucial, essas mensagens serão inúteis, até contraproducentes, se vierem de uma posição de superioridade ou repulsa. Não pode ser, por exemplo, a pessoa branca privilegiada dizendo ao morador do gueto para começar a agir. Essas mensagens devem vir de uma apreciação completa da angústia e miséria da condição oprimida, e uma visão genuína da grandeza daqueles que estão nele. Sim, grandeza. É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Sim, grandeza. É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Sim, grandeza. É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece são corajosos.
Uma das minhas citações favoritas, de Viktor Frankl, vai ajudar a ilustrar esses pontos: “Nós, que vivíamos em campos de concentração, podemos nos lembrar dos homens que caminhavam pelas cabanas confortando os outros, dando seu último pedaço de pão. Eles podem ter sido poucos em número, mas oferecem prova suficiente de que tudo pode ser tirado de um homem, exceto uma coisa: a última das liberdades humanas - escolher sua atitude em qualquer conjunto de circunstâncias, escolher seu próprio caminho ”. Pode-se sentir a verdade ressoando por meio dessas palavras. No entanto, obviamente, seu pedido não seria visitar um campo de concentração, citá-lo aos prisioneiros e depois ir embora. A aplicação correta é para nossas próprias circunstâncias. As palavras soam como o sino da bravura; tendo agido a partir dele, pode-se então chamá-lo para outros que possam estar em circunstâncias semelhantes.
Vamos deixar claro que compaixão não é ausência de raiva. Não estou pedindo aos abusados ou oprimidos que não fiquem com raiva. Muito pelo contrário - a raiva é uma força sagrada. Surge em resposta ao confinamento, violação ou ameaça (a si mesmo ou em testemunho a outro). É a chave para a mudança social, porque fornece a energia e a coragem para se libertar dos padrões de retenção familiares.
O ódio é o resultado de uma narrativa que sequestra a raiva e a canaliza para inimigos convenientes. O ódio preserva o status quo. O Dr. Martin Luther King disse uma vez: “Em algum lugar, alguém deve ter algum bom senso. Os homens devem ver que a força gera força, o ódio gera ódio, resistência gera resistência. E tudo é uma espiral descendente, terminando em destruição para todos e todos. Alguém deve ter bom senso e moralidade o suficiente para cortar a cadeia do ódio e a cadeia do mal no universo. E você faz isso por amor. ”
Uma vez que a raiva se transforma em ódio, a pessoa não tem mais uma compreensão precisa da situação. O ódio interpõe uma projeção na frente de um adversário, fazendo-o parecer mais terrível e mais desprezível do que realmente é. Portanto, o ódio é um obstáculo para a vitória em uma luta. Para vencer, é preciso estar na realidade, entendendo exatamente o adversário. Com esse entendimento, a luta pode não ser mais necessária - outra resposta pode se apresentar. Ou não. Às vezes, uma intervenção vigorosa é necessária para prevenir danos. Às vezes, o abusado, o perseguido e o oprimido precisam revidar, ir ao tribunal, fugir ou impor um limite. Às vezes, eles precisam de aliados para fazer isso. Às vezes, os abusadores precisam ser contidos fisicamente para que não causem mais danos. Mas quando se trata do ódio, em vez da raiva, o objetivo da força sofre uma mudança sutil. Torna-se não mais impedir o dano, mas infligir dano - vingar, punir, dominar - em nome de parar o dano. Para citar o Dr. King mais uma vez, “Como um câncer incontrolado, o ódio corrói a personalidade e corrói sua unidade vital. O ódio destrói o senso de valores de um homem e sua objetividade. Faz com que ele descreva o belo como feio e o feio como belo, e confunda o verdadeiro com o falso e o falso com o verdadeiro. ” Por favor, medite sobre essas palavras. Parece-me que esse tipo de câncer está se espalhando na América, precisamente com os efeitos em sua “personalidade” nacional que King previu. O ódio destrói o senso de valores de um homem e sua objetividade. Faz com que ele descreva o belo como feio e o feio como belo, e confunda o verdadeiro com o falso e o falso com o verdadeiro. ” Por favor, medite sobre essas palavras. Parece-me que esse tipo de câncer está se espalhando na América, precisamente com os efeitos em sua “personalidade” nacional que King previu. O ódio destrói o senso de valores de um homem e sua objetividade. Faz com que ele descreva o belo como feio e o feio como belo, e confunda o verdadeiro com o falso e o falso com o verdadeiro. ” Por favor, medite sobre essas palavras. Parece-me que esse tipo de câncer está se espalhando na América, precisamente com os efeitos em sua “personalidade” nacional que King previu.
No final das contas, a fórmula para “salvar o mundo” não pode ser a vitória em uma batalha épica do Bem contra o Mal. (Essa é de fato a fórmula de QAnon.) Visto que os dois lados parecem, a partir da eleição apertada, ser quase iguais, se vier a guerra, então o Bem, a fim de superar o Mal, deve se tornar melhor na guerra do que o Mal - melhor na violência , melhor na manipulação, melhor na propaganda, melhor no engano. Em outras palavras, deve deixar de ser bom. Quantas vezes vimos isso acontecer na história, quando o movimento de libertação do povo se torna a nova tirania?
Já está acontecendo. Na minha juventude, foram os conservadores os principais instigadores da censura, queimando álbuns dos Beatles, removendo a evolução dos livros de ciências, suprimindo a sexualidade na literatura. Eles também foram os principais fabricantes de consentimento, manipulando a mídia para manter um estado de guerra constante. Agora é a “esquerda” que mais entusiasticamente pegou nas armas da guerra de informação, com suas campanhas deplatáveis, cultura de cancelamento e supressão da dissidência. Eu coloquei "esquerda" entre aspas porque a esquerda real foi a primeira vítimada nova censura, que começou com o rebaixamento de sites socialistas e anti-guerra na busca do Google e nas redes sociais. Facebook e Google ainda suprimem esse tipo de site dando peso em seus algoritmos a “fontes autorizadas”; ou seja, a voz das autoridades. Agora as fileiras dos censurados se expandem para incluir sites de medicina alternativa, céticos da vacina, críticos da tecnologia 5G e dissidentes da política de saúde pública da Covid-19.
Certamente, alguns dos censurados estão fornecendo informações falsas; com a mesma certeza, nem todosdisso é falso. Verdadeiro ou falso, os pontos de vista suprimidos têm uma coisa em comum - eles se chocam com as narrativas e os interesses de poderes políticos e corporativos estabelecidos. Falando propriamente, a oposição a esses poderes define a esquerda, não a direita. É como se estivéssemos nos aproximando de uma reversão do pólo político. Tal como acontece com a reversão dos pólos magnéticos da Terra, um caos considerável precede esse realinhamento. Ainda não aconteceu, mas não me surpreenderia se em poucos anos o Partido Republicano se tornasse o partido dos pobres e da classe trabalhadora, enquanto o Partido Democrata se tornasse o principal representante das elites, Wall Street, grandes corporações, e o complexo militar-industrial. A julgar pelas escolhas de gabinete de Joe Biden, este processo está bem encaminhado. Isso seria uma mudança bem-vinda em relação à situação dos últimos 30 anos, em queambas as partes defendem o povo da boca para fora, ao mesmo tempo que servem os interesses da elite militar-financeira-corporativa.
Resgatando a pílula preta
Anteriormente, usei o termo “Black Pill”. O niilismo, é claro, não é uma mera posição filosófica, mas a fachada intelectual de um estado psicológico de desespero. Na verdade, esse desespero está sempre latente na sociedade moderna, porque (1) Seu reducionismo reinante torna o universo um rabisco sem sentido de átomos e vazio; (2) Sua teoria da vida reinante nos diz que estamos aqui para sobreviver e nos reproduzir; (3) Sua economia reinante direciona nossas energias criativas para o trabalho insatisfatório e o consumo irracional, e (4) Seus padrões sociais dominantes nos isolam da natureza, da comunidade, do lugar e da experiência de pertencer. Por um tempo, aumentos rápidos na riqueza e realizações técnicas deslumbrantes mantiveram o desespero sob controle. Mas ele esteve lá durante muito tempo, um vazio corroendo o cerne da ideologia do progresso. Estava lá o tempo todo, uma pobreza interior que espelha o progresso da miséria infligido a outras culturas e seres não humanos. Estava lá o tempo todo, nossa própria sombra que nos seguia enquanto corríamos em direção a uma utopia sempre no horizonte. Agora, à medida que o glamour do progresso se dissolve, à medida que nossa exaustão aumenta e enfrentamos a compreensão séria de que o horizonte não se aproxima, não importa o quão rápido corramos, o desespero finalmente nos domina.
O niilismo é uma resposta natural aos mitos de má qualidade e cansados que nos são oferecidos como fontes de significado. Quantos de nós tivemos experiências que contradizem diretamente o que nossa principal autoridade epistêmica (ciência) nos diz ser possível? Quantos de nós sequestramos pontos de dados destruidores de narrativas em um compartimento mental separado, vivendo mais ou menos na realidade oficial, mas incapazes de acreditar de todo o coração nela?
Uma das razões pelas quais os cultos e as teorias da conspiração são tão atraentes é que eles reúnem fios cortados da realidade oficial e os tecem em outro tecido. Alguns desses fios podem ter sido cortados porque são simplesmente falsos e não têm lugar na realidade de ninguém. Outros podem ter sido cortados porque não combinam com o esquema de cores do tecido principal; isto é, eles perturbam instituições e paradigmas reinantes. Esses são os fios que devemos tecer em qualquer trama de significado que possa ser um sucessor satisfatório para as narrativas políticas dominantes de hoje.
O que estou dizendo é que algumas das afirmações que permeiam a narrativa da conspiração merecem atenção. A natureza delirante da narrativa não invalida todos os seus fios, e não devemos descartar tudo o que os teóricos da conspiração dizem apenas porque o disseram - especialmente quando nossos guardiões da informação caluniam e suprimem a dissidência genuína como teorias da conspiração, desinformação e propaganda russa.
A partir de 2017, o governo dos Estados Unidos publicou uma série de divulgações de numerosos avistamentos de OVNIs por observadores militares treinados, às vezes acompanhados por vídeo. Basicamente, confirmou a teoria de que ela e a grande mídia haviam, por décadas, vigorosamente ridicularizado como território de excêntricos, malucos e teóricos da conspiração. Esta revelação se junta a várias outras conspirações governamentais e corporativas publicamente reconhecidas: COINTELPRO, Operação Paperclip, armas iraquianas de destruição em massa, Irã-Contra, o transporte de drogas da CIA para dentro das cidades americanas, a sabotagem do FBI de grupos de direitos civis e muitos mais. Apesar desse recorde, a mídia e o governo fingem que tudo isso ficou no passado e hoje não enganam o público a serviço de seu próprio poder. Vamos lá pessoal.
Quando o significado que nos é oferecido exclui fatos óbvios, experiência direta e o reconhecimento da verdade por nossos corações, não é de se admirar que tantos de nós caímos no niilismo, pensando que a vida e o próprio universo não têm sentido. Esse niilismo e o desespero latente que o impulsiona foram o terreno de desova de QAnon. O mesmo terreno gera o consumismo estúpido, o fetichismo da tecnologia, o mito hipnótico do progresso e os espetaculares pseudodramas da política, dos esportes e do entretenimento. Estes são a desova e também o solo, compreendidos no que Guy Debord chamou de "A Sociedade do Espetáculo". Qualquer edifício de significado desmorona em torno do núcleo oco de sua inautenticidade fundamental.
A fome de real que corrói os temas do Espetáculo não pode ser satisfeita de dentro do próprio Espetáculo. As experiências online podem amenizar o niilismo e o desespero, mas não podem enfrentá-lo totalmente. Apenas o relacionamento direto, sensorial e multidimensional pode. Em última análise, isso, e não o intelecto, é a fonte do significado.
A pílula negra é a destilação do desespero cultural. Ele se espalha de uma pessoa despossuída para outra, lixiviando seu veneno no corpo político. O desejo frustrado dos Incels se transforma facilmente em ódio racial e violência sexual. O niilismo das Black Pills encontra alívio nas grandiosas histórias fascistas de grandezas passadas e futuras.
A situação é intimamente análoga, como Chris Hedges a descreve, para a Alemanha dos anos 1930, onde assim como hoje "... os espiritualmente e politicamente alienados, aqueles deixados de lado pela sociedade, [eram] os principais recrutas para uma política centrada na violência, ódios culturais e ressentimentos pessoais." Sua raiva, ele observa, então como agora, foi dirigida em particular aos intelectuais políticos liberais que abdicaram de seu papel adequado dentro do capitalismo, que é suavizar suas arestas, mitigar suas piores tendências e arrancar uma parte justa de sua riqueza para A classe trabalhadora. Os liberais americanos desempenharam esse papel admiravelmente desde 1930 até 1960 e mesmo na década de 1980, antes, como Hedges coloca, eles "se retiraram para as universidades para pregar o absolutismo moral da política de identidade e do multiculturalismo enquanto viravam as costas à guerra econômica travada contra a classe trabalhadora e ao ataque implacável às liberdades civis". Na década de 1990, o Partido Democrata (como o Trabalhismo no Reino Unido e vários partidos social-democratas na Europa) começou a namorar Wall Street e as corporações transnacionais. Eles consumaram seu casamento na era Obama e tiveram um filho chamado corporativismo totalitário, que rivaliza com seu rival, o neofascismo trumpiano, pelo nosso futuro.
A proximidade da eleição mostra que esses dois futuros estão em equilíbrio quase perfeito. Existe uma terceira opção? Existe, mas depende da construção de pontes entre as falhas mais proibitivas de nossa fragmentada paisagem social.
Os Incels, Black Pills e QAnons nos mostram de forma ampliada a expropriação de uma vasta faixa da América central (destituída de esperança, significado e pertencimento, e cada vez mais despossuída economicamente). Eles se juntam às minorias raciais e étnicas tradicionalmente despojadas, mas não, tragicamente, como seus aliados. Em vez disso, eles voltam sua raiva um para o outro, deixando pouca energia para resistir à pilhagem contínua dos comuns. Cada uma das duas seitas principais oferece a seus seguidores um alvo substituto - uma caricatura do outro lado - para sua raiva.
À luz desse conluio tácito, questiona-se se ambos não são dois braços do mesmo monstro .
The Tide of our Times
Para que tudo isso mude, devemos estar dispostos a ver além das caricaturas. Caricaturas não são desprovidas de verdade, mas tendem a exagerar o que é superficial e pouco lisonjeiro, enquanto ignoram o que é belo e sutil. Mídia social, conforme descrito no documentário da Netflix The Social Dilemma, tende a fazer o mesmo, principalmente agrupando os usuários em câmaras de eco à prova de realidade e mantendo-os na plataforma sequestrando seus sistemas límbicos. Eles fazem parte do aparelho que canaliza a raiva popular - um recurso precioso - para o ódio populista. Na verdade, os manifestantes de QAnons e Black Lives Matter têm muito em comum, começando com uma profunda alienação da política dominante e perda de fé no sistema, mas tendo sido manobrados para uma falsa oposição, eles se cancelam mutuamente. É por isso que a compaixão - ver o ser humano sob os julgamentos, categorias e projeções - é a única saída para o dilema social.
A compaixão é a maré de nossos tempos. Talvez seja por isso que tentativas cada vez mais furiosas de semear o ódio são necessárias para manter as condições psíquicas para uma sociedade baseada no controle. É preciso mais e mais propaganda para nos manter divididos. Uma pessoa da comunidade online que hospedo descreveu sua passagem de porta em porta em Iowa como uma trabalhadora de campanha de Andrew Yang. Sua impressão mais forte foi de um desejo intenso entre essas pessoas comuns de união, o fim da contenda. Talvez estejamos mais próximos da cura social do que o comportamento online, com seu vitríolo e veneno, indicaria. O ódio geralmente fala mais alto do que o amor - na sociedade e dentro de nós. O que acontecerá se ouvirmos as vozes mais baixas?
Por trás das esperanças distorcidas e traídas dos QAnons está a esperança autêntica que deveria estar lá para ser traída e distorcida em primeiro lugar. É a mesma esperança que surgiu com a eleição de Obama: mudança, um novo começo. É a mesma esperança que Trump invocou: Faça a América grande novamente. Hoje, a mesma esperança perene cresce novamente entre os eleitores de Biden.
Como pode a mesma esperança animar forças que parecem diametralmente opostas? É porque a lente distorcida do pensamento nós-eles o difratora em dois, fazendo-nos pensar que a mudança virá através da derrota do inimigo que nos é apresentado. A desumanização é a principal arma de guerra (tornando o inimigo desprezível), assim como é o modelo do racismo, do sexismo e da redução de tudo o que é sagrado. É precisamente o oposto do que é necessário se quisermos nos unir.
Para que os clichês sobre solidariedade, unidade, coerência e reconciliação se tornem reais, temos que olhar no espelho escuro de tudo o que julgamos. Precisamos aprender a extrair significado de uma nova história que não seja sobre o triunfo sobre o outro. Temos que baixar as lentes do julgamento e da ideologia, para ver com novos olhos as pessoas e as informações que nossas histórias baniram. Assim forjaremos um populismo imparável. Deixe o desaprendizado começar."
Dezembro de 2020
POR Charles Eisenstein
"Um espelho escuro mostra características que preferimos não ver. Você contempla o rosto repulsivo na moldura do quadro, a caricatura de tudo o que é desprezível, apenas para perceber com um horror crescente que não está olhando para um retrato, mas para um espelho.
A derrota política de Donald Trump nas eleições de 2020 é uma encruzilhada para o movimento quase político agrupado vagamente em torno do mito da conspiração QAnon e, mais amplamente, em torno do próprio Trump. Porque o homem e o movimento foram um espelho escuro para toda a sociedade, é também uma encruzilhada para a sociedade.
Para aqueles que não estão familiarizados com ele, o movimento QAnon começou no início da administração Trump, quando uma pessoa misteriosa, chamando-se Q e alegando ser um membro da administração, começou a postar mensagens enigmáticas em fóruns de internet, particularmente o 8Chan. Isso consistia em insinuações e promessas de que Donald Trump estava executando um plano magistral para derrotar seus inimigos, desenraizar o Estado Profundo e restaurar a América à grandeza. Seu mantra, pelo qual os seguidores (chamados de QAnons) mantiveram a fé, era "Confie no plano". Por pior que parecesse para Trump, a vitória estava ao virar da esquina.
No momento em que escrevemos (final de novembro de 2020), parece que os QAnons não teriam escolha a não ser abandonar a fé. Não tão. Em vários cantos da mídia alternativa de direita, ainda se pode ler teorias desesperadas sobre como a aparente derrota de Trump é uma manobra para preparar seu golpe de mestre. Mesmo depois de deposto, mesmo que vá para a prisão, o mito só mudará de forma, já que é apenas o afloramento de um mito muito maior e antigo, impulsionado por forças sociais e psicológicas reprimidas. O mesmo vale para o trumpismo em geral. Portanto, é importante olhar para esse espelho escuro e ver o que foi escondido; caso contrário, enfrentaremos uma das duas possibilidades sombrias, cada uma pior que a outra. (1) Em alguns anos, um novo e mais formidável demagogo surgirá para canalizar as forças reprimidas em direção a um golpe fascista.
Eu gostaria de oferecer outra alternativa que se torna possível quando olhamos no espelho e encontramos as mencionadas forças reprimidas em sua origem. A cura, ao invés da vitória, é seu ideal formativo. Eu o chamo de mundo mais lindo que nossos corações sabem que é possível.
Uma mitologia reconfortante
É compreensível que tantas pessoas tenham celebrado a derrota de Trump, um homem que presidiu a separação deliberada dos filhos de imigrantes de seus pais, que provocou desnecessariamente a Rússia e a China, que deram passe livre para algumas das piores tendências racistas americanas, que deu luz verde a novos níveis de destruição ambiental, que impulsionou operações de mudança de regime na Venezuela e na Bolívia, e assim por diante. No entanto, também é verdade que a próxima administração Biden é abundantecom membros de Wall Street, falcões de guerra neoconservadores, funcionários de agências de inteligência, líderes de torcida do complexo industrial da prisão e representantes de Big Pharma, Big Data e praticamente Big Everything. Nem Joe Biden nem o Partido Democrata têm sido um defensor particularmente eficaz da igualdade racial, proteção ambiental, justiça econômica ou paz mundial por muito tempo. O próprio Biden conviveu com racistas declarados no início de sua carreira, foi um arquiteto-chave do encarceramento em massa, tem sido um defensor consistente das guerras estrangeiras da América e prestou inúmeros favores a Wall Street. Uma surpresa desagradável aguarda quem pensa que muito vai melhorar agora que os bandidos estão fora e os mocinhos estão dentro.
Seria conveniente se o problema com a América fosse Donald Trump, pessoas más que trabalharam com ele e ignorantes e idiotas que o apoiaram. Nesse caso, poderíamos dar um suspiro de alívio porque com a eleição uma vitória sobre o mal foi conquistada.
Ironicamente, a ideologia do QAnon é uma versão exagerada dessa mesma forma-pensamento básica. Diz que um grupo de pessoas diabólicas é responsável pelo mal no mundo, e que se eles pudessem ser eliminados, o mundo poderia ser curado. Na mitologia de QAnon, o locus do mal é o Estado Profundo, uma cabala de elite interpenetrando governo, corporações, bancos e outras instituições de elite, e o campeão do Bem é Donald Trump que, com sutileza, previsão e habilidade sobre-humanas, paga um 4D xadrez luta contra eles.
A mitologia QAnon oferece três graus de conforto. Em primeiro lugar, em um momento de colapso social e econômico, ameniza o desconforto da incerteza ao tornar o mundo compreensível. Em segundo lugar, absolve seus seguidores da cumplicidade no problema (em contraste com os sistemas reinantes de culpa, que envolvem quase todo mundo até certo ponto e não admite nenhuma solução pronta). Terceiro, oferece um herói, um salvador, um Bom Pai que acertará as coisas e sobre quem se pode projetar sua própria expressão de grandeza não realizada.
É tão tentador personificar o bem e o mal, localizar cada um na pessoa de quem quer que apareça de forma mais visível nos dramas oferecidos para nosso consumo. Um lado segura Donald Trump exatamente da mesma maneira que o outro segura George Soros e Bill Gates. Personificar o mal oferece o conforto de saber, pelo menos em princípio, como resolver os problemas do mundo. Há alguém para destruir, eliminar, derrotar, cancelar ou silenciar. Problema resolvido. O roteiro padrão de um filme de Hollywood é também o roteiro da guerra e, ao que parece, o roteiro de grande parte do discurso político atual.
Fui aconselhado a denunciar publicamente a QAnon, à qual respondo que não tenho o objetivo de denunciar ninguém. Ao esclarecer quem é amigo e quem é inimigo, a denúncia reduz o alvo à condição de inimigo. Não tomarei partido na guerra cultural, não porque acho que ambos os lados são iguais ou que todos os pontos de vista são igualmente verdadeiros, mas porque (1) acredito que os pontos cegos que ambos os lados compartilham são mais significativos e mais perigosos do que suas discordâncias, e (2) por trás do conflito está uma unidade oculta que surgirá quando todas as partes humildemente tentarem compreender a outra.
QAnon causou danos consideráveis à vida das pessoas e ao corpo político no contexto do neofascismo trumpiano e do racismo sistêmico persistente. No entanto, reduzi-lo e seus seguidores inteiramente a esses termos é cometer o mesmo erro - e obter quase o mesmo conforto - que o próprio QAnon faz ao reduzir uma situação complexa a um drama do bem contra o mal. Ao fazer isso, sacrificamos o entendimento real em favor de uma narrativa que divide o mundo em mocinhos e bandidos.
Daniel Schmactenberger expressa isso bem quando diz: "Se você sente uma combinação de indignado, assustado, emocional e muito certo com uma forte hipótese de inimigo, você foi capturado pela guerra narrativa de alguém e pensa que é o seu próprio pensamento." Visite o território inimigo, ele aconselha, e veja como é o mundo a partir daí.
Quem entre seus críticos pergunta: “Que verdade oculta busca expressão no fenômeno QAnon? Que verdade se apoia em seus mitos? ” Em um ensaio na primavera passada, cataloguei algumas verdades que permeiam o mito da conspiração da Nova Ordem Mundial (do qual QAnon é uma variante); por exemplo, que um poder desumano governa o mundo; que aqueles que chamamos de líderes são seus fantoches; essa autoridade estabelecida traiu nossa confiança. Nele eu escrevi:
O mito da conspiração representa a percepção de uma profunda desconexão entre as posturas públicas de nossos líderes e suas verdadeiras motivações e planos. Ele indica uma cultura política que é opaca para o cidadão comum, um mundo de sigilo, imagem, RP, spin, ótica, pontos de discussão, gerenciamento de percepção, gerenciamento de narrativa e guerra de informação. Não é à toa que as pessoas suspeitam que existe outra realidade operando por trás das cortinas.
O fato de QAnon estar repleto de islamofobia, racismo e outros sabores de intolerância não apaga a validade dessas intuições básicas. No entanto, ele ilustra a natureza trágica do fenômeno QAnon, que desvia uma revolta populista autêntica para sonhos vãos e divisões prontas. Essa é também, em parte, a tragédia de Donald Trump. Muito do que direi sobre QAnon se aplica ao trumpismo em geral.
A explicação simplificadora de por que tantas pessoas votaram em Donald Trump é que ele dá vazão a seu racismo, ódio e medo encobertos. Certamente, os Estados Unidos são o lar de muitos racistas inveterados, e o racismo até hoje exerce uma influência funesta na sociedade americana. No entanto, a caricatura do eleitor racista de Trump, ressentido com seu status declinante em relação às pessoas de cor e na esperança de manter seu domínio e privilégio contra as tendências sociais progressistas, deixa muito de fora. Isso não explica por que milhões de eleitores de Obama votaram em Trump em 2016 e presumivelmente em 2020. Não explica por que Trump ganhou uma porcentagem maior de votos de minorias do que qualquer candidato republicano desde 1960, enquanto seu apoio entre os homens brancos diminuiu de 2016 a 2020.
Se continuarmos a omitir todas essas coisas, temo que mais cedo ou mais tarde seremos confrontados com um aspirante a fascista que é mais jovem, mais suave, mais carismático e mais competente do que Donald Trump. Se não entendermos e abordarmos com precisão a causa raiz do trumpismo, é isso que acontecerá em 2024. Se Trump quase pudesse vencer em 2020, imagine o que tal homem ou mulher poderia realizar se as forças reprimidas que elevaram Trump se intensificassem.
Vícios e cultos
Com fome de quê? Obviamente, algo muito mais nutritivo do que o que as histórias de Q fornecem. É por isso que o QAnon e a mitologia da qual ele se baseia são tão viciantes (qualquer coisa pode ser viciantes que suprima temporariamente a dor de uma necessidade não atendida sem realmente satisfazê-la). Assim, os QAnons desceram a proverbial toca do coelho, aguardando ansiosamente sua próxima correção de um post Q, trocando amigos, alienando família, perdendo o sono, desperdiçando incontáveis horas improdutivas para obter um golpe após o outro de indignação, sentimentos de superioridade, garantia de que estão certo, e o conforto acima mencionado. Amigos e familiares falam em perder entes queridos para QAnon da mesma forma que falam em perdê-los para um vício ou seita.
QAnon realmente exibe muitas características de um culto. Ele atrai as pessoas para uma realidade alternativa, afasta-as de amigos e familiares e explora sua necessidade de pertencer. Isso os liga a um grupo de crentes, a participação no qual depende completamente do que alguém diz e acredita (ao invés da aceitação por quem ele é). No entanto, entender o QAnon e os cultos em geral como parasitas no corpo social corre o risco de ignorar as condições que convidam esses parasitas para começar. Queremos apenas suprimir o surto atual? O que será necessário para curar o corpo social em um nível mais profundo?
Cultos atacam os vulneráveis. O que torna alguém vulnerável? Primeiro, a desintegração de um sistema de crenças que dizia a uma pessoa quem ela é, como o mundo funciona e o que é real. Em segundo lugar, uma necessidade não atendida de pertencer. O candidato perfeito para o recrutamento para um culto é alguém cujo mundo desmoronou, deixando-o solitário e confuso. Não são pessoas fracas e estúpidas que caem em seitas. Qualquer pessoa que mantenha uma atitude hipócrita em relação aos QAnons e aos “teóricos da conspiração” está se iludindo.
Digo isso para remediar qualquer sentimento de superioridade que alguém possa obter lendo minha descrição dos falsos confortos da mitologia QAnon. É bom diagnosticar as patologias espirituais dos outros? Se for assim, pode ser porque nós mesmos sofremos uma versão da mesma fome que vemos no espelho escuro de QAnon. Mas, realmente, quem entre nós hoje não sofreu um colapso de significado ou uma necessidade não atendida de pertencer?
Hoje, a maioria da sociedade são os principais candidatos ao recrutamento para o culto. Nossas histórias geradoras de significado sociais estão em desordem. Cinquenta anos atrás, uma ampla corrente dominante da sociedade ocidental acreditava na marcha do progresso. O mundo estava ficando melhor ano após ano e geração após geração. Em breve, o progresso tecnológico, a democracia liberal, o capitalismo de livre mercado e as ciências sociais eliminariam os antigos flagelos da humanidade: pobreza, opressão, doença, crime e fome. Nessa história, sabíamos quem éramos e como dar sentido ao mundo. A vida fazia sentido dentro de uma narrativa linear de progresso que nos dizia de onde viemos e para onde estávamos indo.
A mitologia do progresso, da qual os Estados Unidos da América eram o paradigma mais importante, dizia-nos que a vida deveria ficar melhor a cada geração. Em vez disso, aconteceu o oposto. A mitologia do progresso nos falou de uma idade de abundância, mas hoje temos extrema desigualdade de renda e pobreza persistente ou crescente no Ocidente. Ele nos disse que seríamos mais saudáveis a cada geração que passasse; novamente, o oposto aconteceu, já que as doenças crônicas agora afetam todas as faixas etárias em níveis sem precedentes. Ele nos disse que a marcha progressiva da razão e do Estado de direito traria um fim à guerra, crime, e da tirania, mas os níveis de ódio e violência não caíram na 21 stséculo. Ele nos falou de uma era de lazer, mas a semana de trabalho e o tempo de férias estagnaram desde meados do século XX. Ele nos prometeu felicidade, mas hoje as taxas de divórcio, depressão, suicídio e dependência aumentam a cada ano que passa.
Acrescentando a tudo isso uma inegável crise ecológica, é difícil agora abraçar totalmente a mitologia do progresso como uma fonte de significado e identidade. Com o fracasso em cumprir suas promessas, a fonte de significado para a sociedade moderna agora seca.
A crise resultante de sentido, significado e identidade não apenas empurra as pessoas para os cultos e teorias da conspiração, mas também torna os sistemas de crenças tradicionais mais semelhantes a um culto. Até certo ponto, os principais meios de comunicação e mídias sociais fornecem exatamente o que o vício QAnon fez (indignação, sentimentos de superioridade, garantia de que eles estão certos ...) Eles também tendem a "atrair as pessoas para uma realidade alternativa, afastá-las de amigos e família e explorar sua necessidade de pertencer. ” Quantas reuniões de família estão arruinadas, quantos membros da família não estão mais se falando, tendo se dissociado em realidades separadas?
Permita-me um pouco de exagero retórico. Nos Estados Unidos, dois cultos dominantes aplicam as ferramentas da guerra de informação para competir pela lealdade pública: (1) o Partido Democrata, New York Times, MSNBC, NPR, culto CNN e (2) o Partido Republicano, Fox News, Breitbart culto. Cada um oferece a seus seguidores o mesmo conforto que Q: eles oferecem uma narrativa que dá sentido ao mundo em meio à mudança; oferecem um diagnóstico de problemas sociais que os justifica, e oferecem pessoas para torcer, campeões da causa da vitória sobre o mal. Eles também oferecem um sentimento de pertença. Você já teve a sensação de estar voltando para casa quando sintonizou seu especialista ou site favorito?
Cultos, exércitos e estados policiais dependem do controle da informação. À medida que as partes em conflito armam os fatos, aprendemos a desconsiderar todas as fontes de informação. Nós nos perguntamos qual é a agenda por trás de um determinado "fato". Sabendo que os guerreiros narrativos selecionam, distorcem ou inventam fatos, o cidadão astuto tende a perguntar "Quem disse isso?" antes de perguntar "O que eles disseram?" e então descrer do que eles disseram se servir a uma parte ou propósito desagradável. Em tais circunstâncias, como qualquer conversa é possível?
A falsidade rotineira dos políticos nas últimas décadas desolou os cidadãos cívicos, antes um rico domínio de amplos acordos sobre o que é real, o que é importante e o que é legítimo. Não podemos culpar apenas os políticos, é claro. De campanhas de relações públicas corporativas a operações psicológicas de agências de inteligência, de censura na internet a programas secretos do governo, estamos inundados de mentiras, engano, segredos, meias-verdades, mentiras, fraude e manipulação. Não admira que tenhamos tanta tendência a acreditar em conspirações. Seus blocos de construção estão em toda parte.
Aqui está o espelho escuro. O aumento das teorias da conspiração reflete um sistema de poder envolto em mentiras e segredos, que persegue ferozmente qualquer um que, como Edward Snowden e Julian Assange, puxe o véu de lado.
Esta crise na comunicação e na construção de sentido há muito tempo está se formando. A tentativa de dobrar a verdade para servir a outros fins prejudicou a alma da linguagem, desviando o poder criativo da palavra para a manutenção de ilusões. Conseqüentemente, nossa sociedade como um todo é incapaz de mudar seu curso. Isso exigiria um acordo, cujos blocos de construção se transformaram em areia. Tenho visto essa paralisia se intensificar há 20 anos. Em 2007, escrevi um ensaio chamado The Ubiquitous Matrix of Lies , no qual disse: “À medida que nos aclimatamos a uma matriz onipresente de mentiras, as palavras significam cada vez menos para nós, e não acreditamos mais em nada. Também não deveríamos! Estamos enfrentando uma crise de linguagem que está subjacente e reflete todas as outras crises convergentes da era moderna. ”
Nossos principais motores de produção de conhecimento - ciência, jornalismo e artes - já desfrutaram de uma legitimidade social robusta e quase universal. Agora, cada culto respira através do restolho do conhecimento comum em busca de grãos de fatos ainda acordados para adicionar ao celeiro de seu exército. As partes em conflito requisitam rapidamente qualquer nova safra que o cientista, jornalista ou filósofo independente possa semear. Se eles resistirem, sua colheita será totalmente queimada. Assim é que os melhores jornalistas hoje são todos independentes ou contribuem para publicações marginais: Matt Taibbi, Glenn Greenwald, Diana Johnstone, Seymour Hersch .... Eles desafiam a narrativa de ambos os cultos (direita e esquerda) e, portanto, porque nos desiludem da caricatura colada no espelho, nos dê a chance de ver algumas verdades sombrias.
Quando o ódio sequestra a raiva
O significado da crise tem causas econômicas diretas. É difícil acreditar no projeto social quando se é economicamente inseguro, politicamente destituído de direitos, privado de dignidade e privado de participação na sociedade como membro pleno. Esta tem sido a condição dos afro-americanos e de outras pessoas morenas na América, junto com as mulheres e aqueles que se desviam das normas sociais. Hoje, as mesmas forças econômicas que exigiram sua opressão e lucraram com ela se voltaram para a classe média branca. A Máquina que antes dependia do racismo branco para manter uma subclasse marrom agora devora a sua própria, mastigando vastas áreas da América central e cuspindo cartilagem e ossos no monte de lixo da irrelevância privada.
Ouço o leitor protestar por eu traçar uma equivalência entre as minorias oprimidas, que têm apenas circunstâncias externas para culpar por sua pobreza e desespero, e os QAnons principalmente brancos que, apesar de ter muito mais privilégios, chafurdam em sua fragilidade branca, culpando a todos mas a si mesmos por suas vidas sem saída, seu celibato involuntário e seus vícios em videogames? Este tipo de avaliação hipócrita, que é comum em tópicos de comentários de mídia social de tendência esquerdista, espelha exatamente os canards racistas padrão sobre negros preguiçosos e irresponsáveis que culpam o sistema e se recusam a assumir responsabilidade pessoal. Ambos se recusam a olhar para as condições que geram as escolhas que condenam.
A questão relevante aqui não é quem sofreu mais, quem é a maior vítima, quem é o mais oprimido e, portanto, o mais merecedor de compaixão. A questão é: quais são as condições que deram origem ao trumpismo e como podemos mudá-las? Devemos fazer essa pergunta, a menos que nossa estratégia seja uma guerra sem fim contra aqueles que consideramos irremediavelmente maus.
Assistindo a uma entrevista com o fundador extremamente penitente do 8chan (fórum principal da QAnon), Frederick Brennan, fiquei comovido com sua descrição de usuários típicos do 8chan, particularmente os “Incels” e aqueles que engoliram a “pílula preta”. O primeiro termo refere-se a homens involuntariamente celibatários; o último se refere ao niilismo. Isso não define de forma alguma o movimento QAnon inteiro, mas oferece uma janela para alguns dos traumas sociais que o conduzem.
Exibindo vários graus de misoginia, os Incels atraem muitas críticas. Eles são denunciados por se considerarem “com direito ao sexo” e insultados por transferirem a culpa de suas próprias falhas para as mulheres. Podemos denunciá-los e combatê-los online, denunciá-los e cancelá-los, mas podemos vê-los como humanos? Podemos ver seu desejo frustrado de amar uma mulher, de constituir família, de contribuir de forma significativa para a vida? O desejo frustrado naturalmente se transforma em violência, dirigida aos outros, a si mesmo ou a ambos.
Mais uma vez, ouço um protesto: “Tudo bem para você, como um homem branco heterossexual, pedir compaixão por esses perpetradores e seu avatar, o criminoso-chefe Donald Trump, mas e quanto à compaixão pelas vítimas? Eles precisam ainda mais. ” A isso eu digo: por uma questão de pura praticidade, é precisamente a compaixão pelas vítimas que requercompaixão pelos perpetradores. A compaixão nos permite reprimir a violência em sua fonte. Compaixão não é o mesmo que dar passe livre a alguém ou permitir que continue prejudicando outras pessoas. Compaixão é a compreensão da condição interna e externa de outro ser. Com esse entendimento, pode-se efetivamente mudar as condições que geram danos. É precisamente a mesma lógica que os esquerdistas usam quando falam sobre o crime. Em vez de travar uma guerra sem fim contra os criminosos, vamos examinar as condições que geram o crime. O que torna alguém um traficante de drogas, um ladrão, um membro de gangue? Quais são as condições de trauma e pobreza? Seguindo a trilha dessas perguntas, pode-se chegar a respostas de nível raiz.
Quer estejamos falando sobre a juventude do centro da cidade crescendo em extremo trauma e privação, ou o Incel branco vivendo no porão de seus pais apenas com seu desespero, sua dívida de estudante e seus videogames como companhia, devemos ter cuidado para não imputar desamparo para essas vítimas das circunstâncias. Não existe circunstância opressora demais para o ser humano transcender. Existe um lugar para mensagens como “Pare de ser uma vítima. Assuma o controle de sua vida. Pare de pedir caridade. ” Porém, de maneira crucial, essas mensagens serão inúteis, até contraproducentes, se vierem de uma posição de superioridade ou repulsa. Não pode ser, por exemplo, a pessoa branca privilegiada dizendo ao morador do gueto para começar a agir. Essas mensagens devem vir de uma apreciação completa da angústia e miséria da condição oprimida, e uma visão genuína da grandeza daqueles que estão nele. Sim, grandeza. É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Sim, grandeza. É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Sim, grandeza. É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece É hipócrita e sem sentido chamar alguém à grandeza sem acreditar na sua grandeza. E essa crença não pode ser uma mera ideologia espiritual. Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Por essas razões, geralmente são apenas outros negros que podem efetivamente exortar os afro-americanos a assumir a responsabilidade por se criarem, e geralmente são outros homens que podem fazer o mesmo pelos Incels. Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece Eu conheço pessoas que dizem que suas vidas foram salvas do vício e do desespero por esse tipo de "amor duro". Nós apenas temos que ter em mente ambas as palavras dessa frase: o amor, assim como a resistência. Se você secretamente despreza aqueles a quem está tentando ajudar com seu amor duro, você atrapalhará, não ajudará. Para transcender as próprias condições requer coragem. É muito mais fácil ser corajoso quando alguém te conhece são corajosos.
Uma das minhas citações favoritas, de Viktor Frankl, vai ajudar a ilustrar esses pontos: “Nós, que vivíamos em campos de concentração, podemos nos lembrar dos homens que caminhavam pelas cabanas confortando os outros, dando seu último pedaço de pão. Eles podem ter sido poucos em número, mas oferecem prova suficiente de que tudo pode ser tirado de um homem, exceto uma coisa: a última das liberdades humanas - escolher sua atitude em qualquer conjunto de circunstâncias, escolher seu próprio caminho ”. Pode-se sentir a verdade ressoando por meio dessas palavras. No entanto, obviamente, seu pedido não seria visitar um campo de concentração, citá-lo aos prisioneiros e depois ir embora. A aplicação correta é para nossas próprias circunstâncias. As palavras soam como o sino da bravura; tendo agido a partir dele, pode-se então chamá-lo para outros que possam estar em circunstâncias semelhantes.
Vamos deixar claro que compaixão não é ausência de raiva. Não estou pedindo aos abusados ou oprimidos que não fiquem com raiva. Muito pelo contrário - a raiva é uma força sagrada. Surge em resposta ao confinamento, violação ou ameaça (a si mesmo ou em testemunho a outro). É a chave para a mudança social, porque fornece a energia e a coragem para se libertar dos padrões de retenção familiares.
O ódio é o resultado de uma narrativa que sequestra a raiva e a canaliza para inimigos convenientes. O ódio preserva o status quo. O Dr. Martin Luther King disse uma vez: “Em algum lugar, alguém deve ter algum bom senso. Os homens devem ver que a força gera força, o ódio gera ódio, resistência gera resistência. E tudo é uma espiral descendente, terminando em destruição para todos e todos. Alguém deve ter bom senso e moralidade o suficiente para cortar a cadeia do ódio e a cadeia do mal no universo. E você faz isso por amor. ”
Uma vez que a raiva se transforma em ódio, a pessoa não tem mais uma compreensão precisa da situação. O ódio interpõe uma projeção na frente de um adversário, fazendo-o parecer mais terrível e mais desprezível do que realmente é. Portanto, o ódio é um obstáculo para a vitória em uma luta. Para vencer, é preciso estar na realidade, entendendo exatamente o adversário. Com esse entendimento, a luta pode não ser mais necessária - outra resposta pode se apresentar. Ou não. Às vezes, uma intervenção vigorosa é necessária para prevenir danos. Às vezes, o abusado, o perseguido e o oprimido precisam revidar, ir ao tribunal, fugir ou impor um limite. Às vezes, eles precisam de aliados para fazer isso. Às vezes, os abusadores precisam ser contidos fisicamente para que não causem mais danos. Mas quando se trata do ódio, em vez da raiva, o objetivo da força sofre uma mudança sutil. Torna-se não mais impedir o dano, mas infligir dano - vingar, punir, dominar - em nome de parar o dano. Para citar o Dr. King mais uma vez, “Como um câncer incontrolado, o ódio corrói a personalidade e corrói sua unidade vital. O ódio destrói o senso de valores de um homem e sua objetividade. Faz com que ele descreva o belo como feio e o feio como belo, e confunda o verdadeiro com o falso e o falso com o verdadeiro. ” Por favor, medite sobre essas palavras. Parece-me que esse tipo de câncer está se espalhando na América, precisamente com os efeitos em sua “personalidade” nacional que King previu. O ódio destrói o senso de valores de um homem e sua objetividade. Faz com que ele descreva o belo como feio e o feio como belo, e confunda o verdadeiro com o falso e o falso com o verdadeiro. ” Por favor, medite sobre essas palavras. Parece-me que esse tipo de câncer está se espalhando na América, precisamente com os efeitos em sua “personalidade” nacional que King previu. O ódio destrói o senso de valores de um homem e sua objetividade. Faz com que ele descreva o belo como feio e o feio como belo, e confunda o verdadeiro com o falso e o falso com o verdadeiro. ” Por favor, medite sobre essas palavras. Parece-me que esse tipo de câncer está se espalhando na América, precisamente com os efeitos em sua “personalidade” nacional que King previu.
No final das contas, a fórmula para “salvar o mundo” não pode ser a vitória em uma batalha épica do Bem contra o Mal. (Essa é de fato a fórmula de QAnon.) Visto que os dois lados parecem, a partir da eleição apertada, ser quase iguais, se vier a guerra, então o Bem, a fim de superar o Mal, deve se tornar melhor na guerra do que o Mal - melhor na violência , melhor na manipulação, melhor na propaganda, melhor no engano. Em outras palavras, deve deixar de ser bom. Quantas vezes vimos isso acontecer na história, quando o movimento de libertação do povo se torna a nova tirania?
Já está acontecendo. Na minha juventude, foram os conservadores os principais instigadores da censura, queimando álbuns dos Beatles, removendo a evolução dos livros de ciências, suprimindo a sexualidade na literatura. Eles também foram os principais fabricantes de consentimento, manipulando a mídia para manter um estado de guerra constante. Agora é a “esquerda” que mais entusiasticamente pegou nas armas da guerra de informação, com suas campanhas deplatáveis, cultura de cancelamento e supressão da dissidência. Eu coloquei "esquerda" entre aspas porque a esquerda real foi a primeira vítimada nova censura, que começou com o rebaixamento de sites socialistas e anti-guerra na busca do Google e nas redes sociais. Facebook e Google ainda suprimem esse tipo de site dando peso em seus algoritmos a “fontes autorizadas”; ou seja, a voz das autoridades. Agora as fileiras dos censurados se expandem para incluir sites de medicina alternativa, céticos da vacina, críticos da tecnologia 5G e dissidentes da política de saúde pública da Covid-19.
Certamente, alguns dos censurados estão fornecendo informações falsas; com a mesma certeza, nem todosdisso é falso. Verdadeiro ou falso, os pontos de vista suprimidos têm uma coisa em comum - eles se chocam com as narrativas e os interesses de poderes políticos e corporativos estabelecidos. Falando propriamente, a oposição a esses poderes define a esquerda, não a direita. É como se estivéssemos nos aproximando de uma reversão do pólo político. Tal como acontece com a reversão dos pólos magnéticos da Terra, um caos considerável precede esse realinhamento. Ainda não aconteceu, mas não me surpreenderia se em poucos anos o Partido Republicano se tornasse o partido dos pobres e da classe trabalhadora, enquanto o Partido Democrata se tornasse o principal representante das elites, Wall Street, grandes corporações, e o complexo militar-industrial. A julgar pelas escolhas de gabinete de Joe Biden, este processo está bem encaminhado. Isso seria uma mudança bem-vinda em relação à situação dos últimos 30 anos, em queambas as partes defendem o povo da boca para fora, ao mesmo tempo que servem os interesses da elite militar-financeira-corporativa.
Resgatando a pílula preta
Anteriormente, usei o termo “Black Pill”. O niilismo, é claro, não é uma mera posição filosófica, mas a fachada intelectual de um estado psicológico de desespero. Na verdade, esse desespero está sempre latente na sociedade moderna, porque (1) Seu reducionismo reinante torna o universo um rabisco sem sentido de átomos e vazio; (2) Sua teoria da vida reinante nos diz que estamos aqui para sobreviver e nos reproduzir; (3) Sua economia reinante direciona nossas energias criativas para o trabalho insatisfatório e o consumo irracional, e (4) Seus padrões sociais dominantes nos isolam da natureza, da comunidade, do lugar e da experiência de pertencer. Por um tempo, aumentos rápidos na riqueza e realizações técnicas deslumbrantes mantiveram o desespero sob controle. Mas ele esteve lá durante muito tempo, um vazio corroendo o cerne da ideologia do progresso. Estava lá o tempo todo, uma pobreza interior que espelha o progresso da miséria infligido a outras culturas e seres não humanos. Estava lá o tempo todo, nossa própria sombra que nos seguia enquanto corríamos em direção a uma utopia sempre no horizonte. Agora, à medida que o glamour do progresso se dissolve, à medida que nossa exaustão aumenta e enfrentamos a compreensão séria de que o horizonte não se aproxima, não importa o quão rápido corramos, o desespero finalmente nos domina.
O niilismo é uma resposta natural aos mitos de má qualidade e cansados que nos são oferecidos como fontes de significado. Quantos de nós tivemos experiências que contradizem diretamente o que nossa principal autoridade epistêmica (ciência) nos diz ser possível? Quantos de nós sequestramos pontos de dados destruidores de narrativas em um compartimento mental separado, vivendo mais ou menos na realidade oficial, mas incapazes de acreditar de todo o coração nela?
Uma das razões pelas quais os cultos e as teorias da conspiração são tão atraentes é que eles reúnem fios cortados da realidade oficial e os tecem em outro tecido. Alguns desses fios podem ter sido cortados porque são simplesmente falsos e não têm lugar na realidade de ninguém. Outros podem ter sido cortados porque não combinam com o esquema de cores do tecido principal; isto é, eles perturbam instituições e paradigmas reinantes. Esses são os fios que devemos tecer em qualquer trama de significado que possa ser um sucessor satisfatório para as narrativas políticas dominantes de hoje.
O que estou dizendo é que algumas das afirmações que permeiam a narrativa da conspiração merecem atenção. A natureza delirante da narrativa não invalida todos os seus fios, e não devemos descartar tudo o que os teóricos da conspiração dizem apenas porque o disseram - especialmente quando nossos guardiões da informação caluniam e suprimem a dissidência genuína como teorias da conspiração, desinformação e propaganda russa.
A partir de 2017, o governo dos Estados Unidos publicou uma série de divulgações de numerosos avistamentos de OVNIs por observadores militares treinados, às vezes acompanhados por vídeo. Basicamente, confirmou a teoria de que ela e a grande mídia haviam, por décadas, vigorosamente ridicularizado como território de excêntricos, malucos e teóricos da conspiração. Esta revelação se junta a várias outras conspirações governamentais e corporativas publicamente reconhecidas: COINTELPRO, Operação Paperclip, armas iraquianas de destruição em massa, Irã-Contra, o transporte de drogas da CIA para dentro das cidades americanas, a sabotagem do FBI de grupos de direitos civis e muitos mais. Apesar desse recorde, a mídia e o governo fingem que tudo isso ficou no passado e hoje não enganam o público a serviço de seu próprio poder. Vamos lá pessoal.
Quando o significado que nos é oferecido exclui fatos óbvios, experiência direta e o reconhecimento da verdade por nossos corações, não é de se admirar que tantos de nós caímos no niilismo, pensando que a vida e o próprio universo não têm sentido. Esse niilismo e o desespero latente que o impulsiona foram o terreno de desova de QAnon. O mesmo terreno gera o consumismo estúpido, o fetichismo da tecnologia, o mito hipnótico do progresso e os espetaculares pseudodramas da política, dos esportes e do entretenimento. Estes são a desova e também o solo, compreendidos no que Guy Debord chamou de "A Sociedade do Espetáculo". Qualquer edifício de significado desmorona em torno do núcleo oco de sua inautenticidade fundamental.
A fome de real que corrói os temas do Espetáculo não pode ser satisfeita de dentro do próprio Espetáculo. As experiências online podem amenizar o niilismo e o desespero, mas não podem enfrentá-lo totalmente. Apenas o relacionamento direto, sensorial e multidimensional pode. Em última análise, isso, e não o intelecto, é a fonte do significado.
A pílula negra é a destilação do desespero cultural. Ele se espalha de uma pessoa despossuída para outra, lixiviando seu veneno no corpo político. O desejo frustrado dos Incels se transforma facilmente em ódio racial e violência sexual. O niilismo das Black Pills encontra alívio nas grandiosas histórias fascistas de grandezas passadas e futuras.
A situação é intimamente análoga, como Chris Hedges a descreve, para a Alemanha dos anos 1930, onde assim como hoje "... os espiritualmente e politicamente alienados, aqueles deixados de lado pela sociedade, [eram] os principais recrutas para uma política centrada na violência, ódios culturais e ressentimentos pessoais." Sua raiva, ele observa, então como agora, foi dirigida em particular aos intelectuais políticos liberais que abdicaram de seu papel adequado dentro do capitalismo, que é suavizar suas arestas, mitigar suas piores tendências e arrancar uma parte justa de sua riqueza para A classe trabalhadora. Os liberais americanos desempenharam esse papel admiravelmente desde 1930 até 1960 e mesmo na década de 1980, antes, como Hedges coloca, eles "se retiraram para as universidades para pregar o absolutismo moral da política de identidade e do multiculturalismo enquanto viravam as costas à guerra econômica travada contra a classe trabalhadora e ao ataque implacável às liberdades civis". Na década de 1990, o Partido Democrata (como o Trabalhismo no Reino Unido e vários partidos social-democratas na Europa) começou a namorar Wall Street e as corporações transnacionais. Eles consumaram seu casamento na era Obama e tiveram um filho chamado corporativismo totalitário, que rivaliza com seu rival, o neofascismo trumpiano, pelo nosso futuro.
A proximidade da eleição mostra que esses dois futuros estão em equilíbrio quase perfeito. Existe uma terceira opção? Existe, mas depende da construção de pontes entre as falhas mais proibitivas de nossa fragmentada paisagem social.
Os Incels, Black Pills e QAnons nos mostram de forma ampliada a expropriação de uma vasta faixa da América central (destituída de esperança, significado e pertencimento, e cada vez mais despossuída economicamente). Eles se juntam às minorias raciais e étnicas tradicionalmente despojadas, mas não, tragicamente, como seus aliados. Em vez disso, eles voltam sua raiva um para o outro, deixando pouca energia para resistir à pilhagem contínua dos comuns. Cada uma das duas seitas principais oferece a seus seguidores um alvo substituto - uma caricatura do outro lado - para sua raiva.
À luz desse conluio tácito, questiona-se se ambos não são dois braços do mesmo monstro .
The Tide of our Times
Para que tudo isso mude, devemos estar dispostos a ver além das caricaturas. Caricaturas não são desprovidas de verdade, mas tendem a exagerar o que é superficial e pouco lisonjeiro, enquanto ignoram o que é belo e sutil. Mídia social, conforme descrito no documentário da Netflix The Social Dilemma, tende a fazer o mesmo, principalmente agrupando os usuários em câmaras de eco à prova de realidade e mantendo-os na plataforma sequestrando seus sistemas límbicos. Eles fazem parte do aparelho que canaliza a raiva popular - um recurso precioso - para o ódio populista. Na verdade, os manifestantes de QAnons e Black Lives Matter têm muito em comum, começando com uma profunda alienação da política dominante e perda de fé no sistema, mas tendo sido manobrados para uma falsa oposição, eles se cancelam mutuamente. É por isso que a compaixão - ver o ser humano sob os julgamentos, categorias e projeções - é a única saída para o dilema social.
A compaixão é a maré de nossos tempos. Talvez seja por isso que tentativas cada vez mais furiosas de semear o ódio são necessárias para manter as condições psíquicas para uma sociedade baseada no controle. É preciso mais e mais propaganda para nos manter divididos. Uma pessoa da comunidade online que hospedo descreveu sua passagem de porta em porta em Iowa como uma trabalhadora de campanha de Andrew Yang. Sua impressão mais forte foi de um desejo intenso entre essas pessoas comuns de união, o fim da contenda. Talvez estejamos mais próximos da cura social do que o comportamento online, com seu vitríolo e veneno, indicaria. O ódio geralmente fala mais alto do que o amor - na sociedade e dentro de nós. O que acontecerá se ouvirmos as vozes mais baixas?
Por trás das esperanças distorcidas e traídas dos QAnons está a esperança autêntica que deveria estar lá para ser traída e distorcida em primeiro lugar. É a mesma esperança que surgiu com a eleição de Obama: mudança, um novo começo. É a mesma esperança que Trump invocou: Faça a América grande novamente. Hoje, a mesma esperança perene cresce novamente entre os eleitores de Biden.
Como pode a mesma esperança animar forças que parecem diametralmente opostas? É porque a lente distorcida do pensamento nós-eles o difratora em dois, fazendo-nos pensar que a mudança virá através da derrota do inimigo que nos é apresentado. A desumanização é a principal arma de guerra (tornando o inimigo desprezível), assim como é o modelo do racismo, do sexismo e da redução de tudo o que é sagrado. É precisamente o oposto do que é necessário se quisermos nos unir.
Para que os clichês sobre solidariedade, unidade, coerência e reconciliação se tornem reais, temos que olhar no espelho escuro de tudo o que julgamos. Precisamos aprender a extrair significado de uma nova história que não seja sobre o triunfo sobre o outro. Temos que baixar as lentes do julgamento e da ideologia, para ver com novos olhos as pessoas e as informações que nossas histórias baniram. Assim forjaremos um populismo imparável. Deixe o desaprendizado começar."
Sem comentários:
Enviar um comentário