CONTINUAÇÃO DE
BRUXAS: AS MULHERES EM CHAMAS
Por Cadu Ladeira e Beth Leite
Cenas e relatos como esses não só foram realidade como contavam com uma robusta fundamentação teórica de uma obra sinistra. Publicado em 1486, o livro Malleus Maleficarum, escrito pelos inquisidores papais alemães Heinrich Kramer e James Sprenger, foi um eficaz instrumento nos tribunais para consolidar a crença de que uma grande conspiração arquitetada por Satã e suas seguidoras, as bruxas, tomava conta do mundo. Até o final do século XV, o manual já era um best seller, recordista absoluto entre qualquer livro anterior ou posterior sobre demonologia, com mais de uma dúzia de edições.Na detalhada obra, que explicava desde os feitiços mais comumente praticados até como localizar a presença das malignas criaturas no seio da sociedade, Kramer e Sprenger não pouparam esforços para mostrar que a mesma mulher que provocou a expulsão do homem do paraíso ainda era uma ameaça presente. O velho temor católico de monges e padres celibatários estava mais forte do que nunca. "A perfídia é mais encontrada nas pessoas do sexo frágil do que nos homens" garantiam os dois. Bruxas eram o mal total: renunciavam ao batismo, dedicavam seus corpos e almas ao demônio e, suprema lascívia, costumavam manter relações sexuais com ele. Principalmente durante os sabás, reuniões em que as forças do mal se reuniam para banquetear-se com criancinhas não batizadas e que sempre terminavam em fabulosas orgias. Testemunhos da época davam notícia de sabás reunindo até 1000 bruxas.
Para provar a propensão natural da mulher à maldade não faltavam argumentos aos autores do Malleus. A começar por "uma falha na formação da primeira mulher, por ser ela criada a partir de uma costela recurva, ou seja, uma costela no peito, cuja curvatura é, por assim dizer contrária à retidão do homem. A própria etimologia da palavra feminina confirmava essa fraqueza original: segundo eles, femina, em latim, reunia em sua formação as palavras fide e minus, o que quer dizer menos fé.Defender idéias assim não era exclusividade dos dois inquisidores alemães. A aversão à mulher como ser mais fraco e, portanto, mais propenso a sucumbir à tentação diabólica era moeda corrente em todas as regiões da Europa - dos pequenos vilarejos camponeses aos grandes centros urbanos. Nos sermões de padres por toda a Europa, proliferava a concepção de que a bruxaria estava ligada à cobiça carnal insaciável do "sexo frágil", que não conhece limites para satisfazer seus prazeres. Com seu "furor uterino", para o homem a mulher era uma armadilha fatal, que podia levá-lo à destruição, impedindo-o de seguir sua vida tranqüilamente e de estar em paz com sua espiritualidade.
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