O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

sexta-feira, abril 26, 2002

PARA NÃO ESQUECER


"BRUXAS : AS MULHERES EM CHAMAS"
Por Cadu Ladeira e Beth Leite

Escritos da época registram o quase inacreditável. Na diocese italiana de Como, 1000 execuções em um ano. Em Toulouse, na França, 400 cremações são contadas em um único dia. No arcebispado francês de Trier, em 1585, 306 bruxas delataram cerca de 1500 cúmplices. Embora a maior parte das acusadas tenha escapado à morte, isso não impediu que duas aldeias da região ficassem à beira do extermínio: sobraram apenas duas mulheres em cada uma delas.O mais impressionante é que a maior parte dessas mulheres, e mesmo dos homens, condenadas chegaram às fogueiras por confissão própria, graças à tortura. Durante esses quase três séculos de morte, conseguir uma confissão era apenas questão de tempo. Quando acontecia de o acusado resistir muito durante uma sessão de maus tratos, isso só aumentava a convicção de culpa dos interrogadores: afinal, tamanha resistência só podia ter por trás o auxílio de forças que não eram apenas naturais. Hoje, sabe-se que o uso indiscriminado desse instrumento macabro se confunde com o próprio mapeamento da caça às bruxas pela Europa.
O predomínio do temido Tribunal de lnquisição, por exemplo, serviu para atenuar os casos de condenação à morte de bruxas nos países da Península Ibérica e na Itália. Embora tenha ficado famoso na Idade Média pela prática da tortura, na época em que começou a grande repressão européia, a partir do século XV, os inquisidores já haviam elaborado uma extensa reforma jurídica que garantia não só assistência legal aos acusados como restringia a ação dos torturados a casos muito especiais. Na Inglaterra, onde suspeitos de bruxaria só podiam ser submetidos à tortura com autorização dos conselhos superiores de Justiça, a caça às bruxas também teve pouca expressão. Já na Alemanha, dividida em dezenas de ducados e principados independentes política ejudicialmente, a caça às bruxas ganhou proporções assustadoras. Nada menos de 50% dos processos contra elas aconteceram em terras germânicas, e a maior parte resultou em morte.
Às vezes, a descoberta de uma fraude conseguia evitar que a perseguição chegasse a um final dramático. Em 1633, o jovem inglês Edmund Robinson denunciou uma mulher que o teria levado a um sabá de bruxas, onde estavam reunidas cerca d sessenta feiticeiras. O menino deu o nome de dezessete delas, todas imediatamente presas e condenadas. Algumas dúvidas sobre o depoimento, no entanto, levaram o bispo de Chester a interrogar Edmund e ele acabou admitindo ter forjado a história por sugestão do pai, que havia indicado todos os nomes "por inveja, vingança e desejo de tirar vantagem", descobriram os juízes. Na Escócia, o ensaio de uma grande repressão nacional em 1661 entrou em colapso quando os eméritos caçadores de bruxas John Kincaid e John Dick foram flagrados dando picadas em mulheres acusadas de bruxaria: nos tribunais, essas pequenas marcas eram a prova de que elas haviam feito pacto com o diabo.
Foram poucas, porém, as caças detidas por evidência de fraudes. Normalmente, quando uma perseguição se instalava, nada conseguia detê-la e o pânico tomava conta da população. A princípio, todos estavam sob suspeita e a melhor defesa era o ataque. Uma vez iniciada a caça, delações não paravam mais. Assustadas com a perseguição, muitas pessoas logo se punham a entregar as vizinhas na tentativa de livrar a própria pele de potenciais acusações. Cada possível bruxa levada a julgamento, por sua vez, não tardava a incriminar mais uma lista de acusadas num efeito dominó que levava grandes levas de pessoas diante dos juízes.

CONTINUA

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