O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quinta-feira, janeiro 31, 2019

O MEDO DE SER MULHER...



"Sobre medo de falar

Já fui acusada de transfobia por muitos motivos e tantas vezes que perdi a conta.

Fui acusada de transfobia por literalmente perguntar o que é mulher.

Fui acusada de transfobia por discordar que sou CIS (me inventam mais uma categoria para mim e eu não tenho nem posso ter voz nisso... de novo).

Fui acusada de transfobia por dizer que ser mulher não é um sentimento (falar sobre a minha condição e realidade na sociedade é proibido porque fere pessoas).

Fui acusada de transfobia por dizer que não existe privilégio em nascer do sexo feminino no Patriarcado Capitalista, em que até meus órgãos reprodutivos são comodificados.

Fui acusada de transfobia por dizer que a prostituição é violência contra a mulher.

Fui acusada de transfobia por dizer que aborto é uma pauta prioritária para o movimento de mulheres no Brasil (é a 4a causa de morte de mulheres no país!)

É, este é o nível.

Eu já falei e publiquei aqui várias vezes prints de ataques que recebi com mensagens misóginas me chamando de vadia, vagabunda e depósito de poh@ de macho. Mas tudo isso para me chamar de transfóbica. Eu não fui a primeira, a única ou a última. Temos várias aqui pra contar sobre isso. Já teve mulher perdendo bolsa de investigação na universidade por compartilhar post com teoria crítica de gênero. Teve mulher (tem! tá rolando nesse momento) respondendo na justiça por dizer que não era cis. Mulheres lésbicas sendo acusadas de transfobia por recusar sexo com quem tem pénis.

Joga pedra na Geni!

Bom, com todas essas situações, eu aprendi a falar. Falar sem medo de ser jogada na fogueira das TERFs transfóbicas que têm sangue de pessoas trans nas mãos. Aprendi que isso era uma forma de silenciar mulheres. Aprendi que isso era uma colonização do nosso movimento, o neopatriarcado. Porque, de repente, eu sou mulher e não posso falar sobre isso. Não posso falar das minhas opressões. E as minhas opressões são chamadas privilégios. E pessoas que não foram empurradas para essa categoria política desde o nascimento, como eu, me ensinam e dizem o que é ser mulher e eu tenho de acatar caladinha para não ser jogada na fogueira.

De tanto levar, fiquei calejadas e endureci. Aprendi a falar sem medo do contra-ataque.

E esse post é sobre isso. Porque pela primeira vez depois desses anos em que aprendi a falar sem medo, eu volto a me ver com medo de falar. Para não ser mal interpretada, para não ver minhas palavras distorcisas, para não ser jogada na fogueira.

Por quê?

Porque existe um projeto de lei tramitando no Brasil que pode ser um cavalo de Tróia para mulheres. É um projeto que criminaliza a homofobia e a transfobia.

Claro que quero ver a criminalização da homofobia. Claro que quero vida digna para pessoas trans. Vocês percebem o meu medo, não?

Eu e muitas outras fomos jogadas na fogueira da transfobia por questionar, pensar, debater e criticar. Não por atacar, não por insultar, não por agredir. Por colocar questões que são, intrinsecamente, sobre a NOSSA PRÓPRIA CONDIÇÃO.

E agora? Quem é por nós?"

Por Aline Rossi

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