O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

quinta-feira, abril 13, 2023

SOMOS TODOS E TODAS...



Traficantes Virtuais

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"A sociedade nutritiva do capitalismo terminal teve mais um impulso involutivo com o advento das redes sociais, as chamadas ‘social network’. Perigosas ferramentas de controlo e manipulação da mente, fruto envenenado das grandes empresas de informática estado-unidenses. Penetrando subtilmente na psique das massas, rapidamente se tornaram um hábito inevitável com efeitos tóxicos aos quais é difícil de fugir.
Produzem lucros imensos para os seus criadores e danos cerebrais viciantes para os utilizadores dos serviços, como é prática habitual na pátria lucro como única razão de vida.
Estas comunidades virtuais povoadas de falsos amigos são a vitrina dos impulsos exibicionistas mais básicos, uma expressão característica do narcisismo contemporâneo, em que a exibição a todo o custo é essencial para a percepção do próprio eu. Publicam-se fotografias de si próprio alteradas por truques tecnológicos para ser mais belo e desejável, de férias de sonho para se tornar invejado, de pratos de comida que não se provam, mas que se exibem como fetiches. Imagens do próprio sucesso social, económico, afectivo, do qual se quer convencer os outros, na realidade para se tranquilizar a si próprio.
Mostras falsas de felicidade artificial que são obsessivamente espiadas por outros que vivem a vida dos outros, na ausência de uma própria pela qual valha a pena viver. Imagens cintilantes de actores, cantores, futebolistas, influencers e outras variedades de palhaços coloridos da sociedade do vazio, muitas vezes personagens problemáticas presas dos piores vícios e angústias mentais. Mas que, não obstante, são todos invejados e tomados como modelo, eleitos como exemplo por indivíduos frustrados e descontentes que aspiram a entrar no Olimpo dos VIP ilustrados.
Não importa quem se é ou o que se faz, mas como se apresenta, para se fazer notado, para se sentir vivo e apreciado numa sociedade desprovida de valores e referências superiores.
As redes sociais são arena de polémicas inúteis, de vis ataques anónimos, um antidepressivo para combater o vazio interior e descarregar a raiva e a frustração da forma mais grosseira. O contacto ilusório com este mundo desencadeia aquelas emoções indispensáveis à vida de relações hoje raras na realidade devido ao progressivo isolamento social.
Os plutocratas progressistas de Silicon Valley usaram as estratégias mentais da psicologia cognitivo-comportamental e os conhecimentos da neurociência para induzir a dependência dos seus perigosos produtos.
A consulta à rede informática é compulsiva, os utilizadores acedem-lhe várias vezes ao dia, por automatismo inconsciente, trocando a realidade verdadeira pela realidade virtual, ou melhor, irreal.
As mesmas técnicas usadas para provocar a dependência do tabaco, das substâncias psicotrópicas, do vício do jogo, são utilizadas para induzir comportamentos coagentes dos quais não se consegue fugir.
O agrado expressado com corações e outros sinais de partilha estimula os centros corticais na área límbica, o núcleo accumbens, cujos neurónios segregam dopamina, o neurotransmissor do prazer. Outros hormonas, endorfinas, serotonina e norepinefrina, regulam o humor, dando bem-estar e excitação. O prazer experimentado como recompensa pela acção consumada virtualmente acciona o mecanismo de reforço que induz a repetição compulsiva do comportamento gratificante.
Instaura-se o círculo vicioso da dependência, do qual é sempre difícil e doloroso sair, a vida reduz-se a padrões comportamentais estereotipados e forçados, anulando a vontade e a liberdade.
Nos ratos, a administração de alimentos e a atividade sexual causam a produção de dopamina e os humanos, como animais experimentais, respondem aos mesmos estímulos recebendo os "gosto".
Os efeitos devastadores da frequentação das redes sociais e da inteligência artificial, em particular nos adolescentes, aumentaram perigosamente o número de suicídios, a automutilação, o transtorno de ansiedade generalizado e a depressão maior. Cada vez mais os jovens se fecham nos seus quartos em muda conversa com o mundo exterior mediada por ferramentas informáticas que os separam da realidade.
O ‘hikikomori’, isolamento patológico que já tinha surgido há algum tempo no Japão, posto avançado americanizado da sociedade da dissolução, espalhou-se rapidamente por toda parte, sinal de medo e rejeição ao verdadeiro contacto humano. Gerações cada vez mais frágeis, desprovidas de referências e de exemplos, filhos de famílias desfeitas ou disfuncionais, rejeitam a vida real para se refugiarem numa dimensão aparentemente protectora porque inexistente.
Sem provas nem oposição, sem esforço físico, até os desportos se tornam simulacros virtuais e ridículos de disciplinas feitas de esforço e fadiga. A repressão destes sintomas patológicos não resolve o problema, não se sai da dependência proibindo o uso de ferramentas tecnológicas, que se tornarão ainda mais atraentes, mas substituindo-as por atividades fascinantes da vida real. Relações afectivas, desportos, actividades sociais e a redescoberta da espiritualidade, da imersão na natureza com sua benéfica vibração: o Genius loci.
Os donos das grandes empresas de informática americanas são obrigados a admitir a perigosidade da inteligência artificial, da utilização indiscriminado de computadores, da frequentação continuada das suas redes sociais. Obrigam os seus filhos a escrever à mão, a ler livros, a brincar como se fazia antigamente, desenvolvendo a inteligência humana e não a artificial.
Como sempre, os traficantes, mesmo os das emoções virtuais, não se drogam, conhecem perfeitamente a perigosidade dos venenos que difundem e afastam-se deles.
A realidade virtual é um oxímoro, é uma contradição, se algo é efectivamente real não pode ser virtual.
Deixemos a ilusão e voltemos à realidade, ao prazer de estar vivo, de amar, de lutar, de sermos humanos e não mutantes biónicos."

Roberto Giacomelli

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