BORA LÁ SALTAR NO ESCURO -
Confissões duma Mulher para lá da Meia-Idade
Não é coisa fácil fragilizarmo-nos... até porque o papel de vítima assoma logo prontinho para ser assumido... Tinha publicado e apagado, mas hoje tive de novo a coragem de postar... acho que há coisas que simplesmente devem ser ditas, ponto final. Acho que a coragem me foi dada pela autora que estou a ler neste momento, Lucy Pearce, Burning Woman (Mulher em Chamas), um arquétipo do feminino que a autora acha que ainda não foi visto senão por ela... tem a ver com isto. Depois falarei deste livro que é best seller neste momento no Reino Unido...
Sou uma mulher de 67 anos. Fui professora e continuo a sê-lo, embora a estrutura da instituição tenha mudado radicalmente ou já nem exista. Não trabalho com rede, como aconteceu por largos anos. Não tenho rede. Afirmo a minha visão por mim própria, dou a cara por ela, como se diz, embora por outro lado possa dizer que tenho uma vasta rede de apoio, constituída pelas mulheres que me precederam ou que são minhas contemporâneas no Movimento da Deusa, mulheres com as quais comungo da mesma perspectiva das coisas, da mesma devoção à Deusa, da mesma certeza de que sem a Sua representação no panteão divino da humanidade actual, as mulheres nunca poderão aspirar a assumir verdadeiro poder neste mundo (ver Carol Christ “Por que é que as mulheres precisam da Deusa”). Mulheres que comungam do mesmo sonho dum futuro sustentável, para a concretização do qual o papel das mulheres é decisivo; Mulheres que sabem que é preciso resgatar a Deusa antiga, nas Suas várias faces ou arquétipos, que reflectem a nossa humanidade, nas Suas múltiplas denominações e qualidades; que precisamos de refazer a nossa cultura própria, de reinventar as nossas tradições, a nossa forma própria de ser e de estar no mundo, antes da domesticação patriarcal, de levantar do chão e de limpar da ignomínia o nosso poder de dar e de cuidar da vida, de redescobrir e de sacralizar o poder do sangue menstrual, de sacralizar o corpo e toda a natureza de que somos parte.
Sou uma mulher de 67 anos. Fui professora e continuo a sê-lo, embora a estrutura da instituição tenha mudado radicalmente ou já nem exista. Não trabalho com rede, como aconteceu por largos anos. Não tenho rede. Afirmo a minha visão por mim própria, dou a cara por ela, como se diz, embora por outro lado possa dizer que tenho uma vasta rede de apoio, constituída pelas mulheres que me precederam ou que são minhas contemporâneas no Movimento da Deusa, mulheres com as quais comungo da mesma perspectiva das coisas, da mesma devoção à Deusa, da mesma certeza de que sem a Sua representação no panteão divino da humanidade actual, as mulheres nunca poderão aspirar a assumir verdadeiro poder neste mundo (ver Carol Christ “Por que é que as mulheres precisam da Deusa”). Mulheres que comungam do mesmo sonho dum futuro sustentável, para a concretização do qual o papel das mulheres é decisivo; Mulheres que sabem que é preciso resgatar a Deusa antiga, nas Suas várias faces ou arquétipos, que reflectem a nossa humanidade, nas Suas múltiplas denominações e qualidades; que precisamos de refazer a nossa cultura própria, de reinventar as nossas tradições, a nossa forma própria de ser e de estar no mundo, antes da domesticação patriarcal, de levantar do chão e de limpar da ignomínia o nosso poder de dar e de cuidar da vida, de redescobrir e de sacralizar o poder do sangue menstrual, de sacralizar o corpo e toda a natureza de que somos parte.
Sou uma mulher de 67 anos, activista da Deusa, e há partes
de mim cansadas, quase esgotadas… Sou uma mulher. Ser uma mulher com uma visão
ou ser um homem com uma visão são realidades muito distintas. Na tradição
masculina, na androcracia em que vivemos, por trás dum homem, grande ou
pequeno, há sempre uma mulher – quanto mais não seja para levar com as culpas –
que está lá quando ele chega a casa cansado, que o apoia, que diz ámen à sua
visão, que torce por ele e fica orgulhosa quando as coisas correm bem. Ela faz
a sopa, mantém o espaço, cuida dos aspectos práticos do quotidiano. Atrás dum
homem está uma Esposa, que é uma espécie de extensão ou substituta da mãe, com
funções acrescidas. Claro
que isto é o quadro clássico, ou seja, já era, hoje em dia em que tudo está
mais fluído, o que temos é a Companheira, que poderá ser mais intermitente,
descartável, mas eventualmente bem mais talentosa e tecnologicamente funcional.
Sempre existe uma ou mais para suprir as necessidades de apoiar, gerir, manter
o espaço, dizer ámen, ajudar, torcer, e de forma cada vez mais prática e eficiente.
Embora também existam, são raros, raríssimos, convenhamos,
os casos em que estes papéis se invertem. Por norma, atrás duma mulher com uma
visão não está ninguém a proteger o seu espaço nem a dar-lhe energia. O mais
certo é que aconteça precisamente o contrário. Atrás dela pode estar o próprio marido a
disputar a sua atenção e energia, ou o resto da família, que não acha a mínima
graça à sua originalidade, que a conhece demasiado bem e por isso sabe que é um
fake, que sempre foi. “Quem é que pensas que és?”. Óbvio que se ela fosse um
homem, sim, aí teria toda a legitimidade para escrever e publicar livros, por
exemplo, com toda a família a assistir orgulhosa ao seu lançamento. Já uma
mulher sozinha a lançar um livro pode acontecer não ter uma única pessoa da
família a assistir e a apoiá-la nesse momento. Ninguém. Não se fala nessa
bizarrice, “Mas quem és tu afinal?”.
Pode ser que atrás dela estejam pessoas que continuam a ver
nela a mãe, cujo dever é apenas o de dar, e é bem possível até que nem ela
própria saiba receber, que tacteie no escuro à procura do mais básico
sentimento humano que é a sensação de que a sua existência é legítima, de que
tem o direito de existir. E não se pode existir sem ter voz própria. E esta não
é uma questão que amadureça saudável à medida que flui o tempo e se sucedem as
estações, muito pelo contrário. Duvida sempre quando te disserem que a esperança de vida tem vindo a aumentar...
As suas dúvidas existenciais como mulher são também projectadas sobre pessoas que contestam a sua autoridade, desvalorizando tudo
aquilo que com tanto esforço e trabalho, enfrentando tantos desafios, conseguiu,
desmontando uma a uma todas as suas possíveis zonas de conforto. Uma mulher sozinha,
recusando um enterro em vida, com a sua visão e voz própria, tem de ser capaz
de conviver e de abraçar a Impostora que se lhe colou à pele e à imagem, tem de
poder olhar para ela no espelho e sossegá-la: “Bora lá saltar no escuro,
segura-te!”. É a impostora em si que tem a coragem para aguentar a parte das mil e uma razões para
não, nunca estar à altura daquela Anciã longínqua, duma qualquer cultura
exótica, idealizada pelo fotoshop e enquadrada pelas frases prontas a servir do
fast food verbal new-age. Uma mulher real a partir de certa idade é por norma suspeita, e se algum poder conquistou com o seu esforço, discernimento e coragem vai
ser-lhe pedido que trate de o repartir, pedacinho a pedacinho, até não sobrar mais
nada, ou que o use para promover outras pessoas. Afinal se já não és a mãe que se sacrifica como a vela se consome e arde para
que haja luz, para que serves?
Contudo nesta escuridão criativa da alma, abençoada seja, a luz da Deusa nítida se recorta: “Pára de resmungar, de lamber as feridas, avança”… Pois… talvez, quem sabe, abrindo
caminhos...
Luiza Frazão
Imagem: Imagem e Templo da Deusa Maia, criado pelas alunas da Primeira Espiral do Treino de Sacerdotisa da Deusa do Jardim das Hespérides para a primeira Conferência da Deusa Portugal, realizada em maio de 2019, em Sintra, nos jardins do Almáa Hostel, Quinta dos Lobos
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