"Não há risco zero" - lê-se agora a propósito da AstraZeneca. Sim, não há. Mas todos os que são a favor do confinamento disseram o contrário neste ano. Estamos em prisão domiciliária e adolescentes sem ir à escola quando o risco é próximo de zero. Todas as vacinas têm alguns riscos, qual o risco destas não conheço (nem a rigor ninguém a esta altura, seja desta, da Pfizer - não há tempo para o calcular). Decidimos tomar algumas delas porque o benefício é maior do que o risco, não porque não tenham riscos. Mas esta premissa - não há risco zero - estamos há 1 ano, os que somos contra o confinamento pelo mal sistémico que ele implica para a sociedade, a dizer. A taxa de morte de Covid-19 abaixo os 80 anos é 0,1% - é este o risco. Não é zero, mas é muito baixo.
Não se confina uma sociedade por este risco. Nem por risco algum. Da mesma forma que não fechamos as estradas porque há acidentes, nem as fábricas e escolas onde há muito se morre de doenças ligadas ao desgaste e burnout, à cabeça AVC e doenças cardiovasculares. Podemos e devemos ter um SNS forte que actue aos primeiros sintomas de Covid (em vez de monotorizar por telefone doentes que em horas ficam sem oxigénio enquanto ligam para a famosa saúde 24...); podemos e devemos com urgência acabar com as estradas bárbaras que temos, perigosas, e com a condução irracional que subsiste com a passividade do Estado; podemos e devemos lutar para reduzir o horário de trabalho e melhorar as condições de trabalho para acabar com o burnout (sim, é possível viver e trabalhar sem burnout). O que não podemos é prender cidadãos em nome de um risco zero, que não existe. Atenção: mesmo que esse risco fosse máximo, e não mínimo, eu seria contra confinamentos e Estados de exceção. Na URSS foi instituída uma ditadura porque havia risco de ameaça estrangeira e, depois, de um ataque nuclear - em 1962, na crise dos mísseis, esse risco foi máximo e real; nos EUA foi instituída a perseguição às correntes trotskistas e comunistas depois da II Guerra porque em plena guerra fria tinham força nos sindicatos e ameaçavam, com sucesso, parar a produção - foi o período conhecido como Macarthismo.
O Estado de Emergência é um atentado à democracia e o confinamento, como afirma o filósofo Giorgio Agamben, uma estrutura sociológica de controlo social, e sem qualquer efeito no controlo da pandemia (cuja evolução em cada país depende de outros factores como serviços de saúde, idade média da população, taxa de obesidade, etc). Mas se tivesse efeito, eu seria contra.
A liberdade não pode sucumbir à segurança - mínima, ou máxima, real ou mágica. O risco zero é o pensamento mágico da ditadura máxima - nada é controlado, mas todos vivem na ilusão que controlam tudo, que uns mandam em tudo e outros obedecem a tudo - o que é sempre falso, mesmo na pior das ditaduras nada funciona, o que se cria é a censura de quem mostra que nada funciona. De facto cria-se uma situação de anomia em que a sociedade se desestrutura nos seus laços de cooperação - e a cooperação é a base de qualquer sociedade funcional, que só pode existir com base na confiança entre pares, e jamais na restrição, confinamento ou medo.
A liberdade não pode sucumbir à segurança - mínima, ou máxima, real ou mágica. O risco zero é o pensamento mágico da ditadura máxima - nada é controlado, mas todos vivem na ilusão que controlam tudo, que uns mandam em tudo e outros obedecem a tudo - o que é sempre falso, mesmo na pior das ditaduras nada funciona, o que se cria é a censura de quem mostra que nada funciona. De facto cria-se uma situação de anomia em que a sociedade se desestrutura nos seus laços de cooperação - e a cooperação é a base de qualquer sociedade funcional, que só pode existir com base na confiança entre pares, e jamais na restrição, confinamento ou medo.
Raquel Varela - historiadora
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