Mãe!
Mãe! a oleografia está a entornar o amarelo do Deserto por cima da minha vida. O amarelo do Deserto é mais comprido do que um dia todo!
Mãe! eu queria ser o árabe! Eu queria raptar a menina loira!
Eu queria saber raptar.
Dá-me um cavalo, mãe! Até a palmeira verde está esmeralda! E o anel?!
A minha cabeça amolece ao sol sobre a areia movediça do Deserto!
A minha cabeça está mole como a minha almofada!
Há uns sinais dentro da minha cabeça, como os sinais do Egípcio, como os sinais do Fenício. Os sinais destes já têm antecedentes e eu ainda vou para a vida.
Não há muros para que haja estrada! Não há muros para pôr cartazes!
Não está a mão de tinta preta a apontar — por aqui!
Só há sombras do sol nas laranjeiras da outra margem, e todas as noites o sono chega roubado!
Mãe! As estrelas estão a mentir. Luzem quando mentem. Mentem quando luzem. Estão a luzir, ou mentem?
Já ia a cuspir para o céu!
Mãe! a minha estrela é doida! Coube-me nas sortes a Estrela-doida!
Mãe! dá-me um cavalo! Eu já sou o galope! Há uma palmeira, Mãe!
O que quer dizer um anel? Tem uma esmeralda.
Mãe! eu quero ser as três oleografias!
Almada Negreiros, in 'Antologia Poético
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