COMO OS HOMENS IDEALIZAM UMA MULHER...
"Dúnia lhe era simplesmente indispensável; renunciar a ela era inconcebível para ele. Já fazia muito, já se iam alguns anos que ele sonhava deliciado com o casamento, mas não parava de juntar dinheiro e esperava. Sonhava extasiado, no mais profundo segredo, com uma donzela bem-educada e pobre (necessariamente pobre), muito jovenzinha, muito bonitinha, de caráter nobre e instruída, muito intimidada, que tivesse sofrido infortúnios em excesso e se anulasse completamente diante dele, que a vida inteira o considerasse a sua salvação, que o venerasse, que se sujeitasse a ele e se sentisse maravilhada com ele e somente com ele. Quantas cenas, quantos episódios doces criara na imaginação para esse tema sedutor e brejeiro nos momentos de ócio depois do trabalho! E eis que o sonho de tantos anos estava quase se realizando: a beleza e a instrução de Avdótia Románovna o haviam deixado pasmo; a situação de desamparo dela o incitara ao extremo. Nela havia até um pouco além daquilo com que ele sonhara: uma moça altiva, de caráter, virtuosa, em educação e desenvolvimento superior a ele (ele percebia isso), e a vida inteira uma criatura dessas iria lhe devotar uma gratidão servil pela proeza dele e anular-se de modo reverente, enquanto ele reinaria infinita e absolutamente!...
- Fiódor Dostoiévski, em Crime e Castigo
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