O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

terça-feira, outubro 21, 2008

QUEM DIZ QUE EU EXAGERO???


Feminicídio ao vivo - o que nos clama Eloá Maria Dolores de Brito Mota - Socióloga, professora da Universidade Federal do Ceará.

Maria da Penha Maia Fernandes - Inspiradora do nome da Lei Federal 11340/2006 - Lei Maria da Penha e Colaboradora de Honra da Coordenadoria de Políticas para Mulheres da Prefeitura de Mulheres. Tudo o que o Brasil acompanhou com pesar no drama de Eloá, em suas cem horas de suplício em cadeia nacional, não pode ser visto apenas como resultado de um ato desesperado de um rapaz desequilibrado por causa de uma intensa ou incontrolada paixão. É uma expressão perversa de um tipo de dominação masculina ainda fortemente cravada na cultura brasileira.

No Brasil, foram os movimentos feministas que iniciaram nos anos de 1970, as denúncias, mobilização e enfrentamento da violência de gênero contra as mulheres que se materializava nos crimes cometidos por homens contra suas parceiras amorosas. Naquele período ainda estava em vigor o instituto da defesa da honra, e desenvolveram-se ações de movimentos feministas e democráticas pela punição aos assassinos de mulheres. A alegação da defesa da honra era então justificativa para muitos crimes contra mulheres, mas no contexto de reorganização social para a conquista da democracia no país e do surgimento de movimentos feministas, este tema vai emergir como questão pública, política, a ser enfrentada pela sociedade por ferir a cidadania e os direitos humanos das mulheres.

O assassinato de Ângela Diniz em dezembro de 1976, por seu namorado Doca Street, foi o acontecimento desencadeador de uma reação generalizada contra a absolvição do criminoso em primeira instância, sob alegação de que o crime foi uma reação pela defesa da "honra". Na verdade, as circunstâncias mostravam um crime bárbaro motivado pela determinação da vítima em acabar com o relacionamento amoroso e a inconformidade do assassino com este fim. Essa decisão da justiça revoltou parcelas significativas da sociedade cuja pressão levou a um novo julgamento em 1979 que condenou o assassino. Outro crime emblemático foi o assassinato de Eliane de Grammont pelo seu ex-marido Lindomar Castilho em março de 1981. Crimes que motivaram a campanha "quem ama não mata".

Agora, após três décadas, o Brasil assistiu ao vivo,
testemunhando, o assassinato de uma adolescente de 15 anos por um ex-namorado
inconformado com o fim do relacionamento. Um relacionamento que ele mesmo tomou
a iniciativa de acabar por ciúmes, e que Eloá não quis reatar. O assassino,
durante 100 horas manteve Eloá e uma amiga em cárcere privado, bateu na vitima,
acusou, expôs, coagiu e por fim martirizou o seu corpo com um tiro na virilha,
local de representação da identidade sexual, e na cabeça, local de representação
da identidade individual.
Um crime onde não apenas a vida de um corpo foi assassinada, mas o significado que carrega - o feminino. Um crime do patriarcado que se sustenta no controle do corpo, da vontade e da capacidade punitiva sobre as mulheres pelos homens. O feminicídio é um crime de ódio, realizado sempre com crueldade, como o "extremo de um continuum de terror anti-feminino", incluindo várias formas de violência como sofreu Eloá, xingamentos, desconfiança, acusações, agressões físicas, até alcançar o nível da morte pública.
O que o seu assassino quis mostrar a todas/os nós? Que como homem tinha o controle do corpo de Eloá e que como homem lhe era superior? Ao perceber Eloá como sujeito autônomo, sentiu-se traído, no que atribuía a ela como mulher (a submissão ao seu desejo), e no que atribuía a si como homem (o poder sobre ela - base de sua virilidade). Assim o feminicídio é um crime de poder, é um crime político. Juridicamente é um crime hediondo, triplamente qualificado: motivo fútil, sem condições de defesa da vítima, premeditado. Se antes esses crimes aconteciam nas alcovas, nos silêncios das madrugadas, estão agora acontecendo em espaços públicos, shoppings, estabelecimentos comerciais, e agora na mídia. Para Laura Segato[i] é necessário retirar os crimes contra mulheres da classificação de homicídios, nomeando-os de feminicídio e demarcar frente aos meios de comunicação esse universo dos crimes do patriarcado. Esse é o caminho para os estudos e as ações de denúncia e de enfrentamento para as formas de violência de gênero contra as mulheres. Muita coisa já se avançou no Brasil na direção da garantia dos direitos humanos das mulheres e da equidade de gênero, como a criação das Delegacias de Apoio às Mulheres - DEAMs, que hoje somam 339 no país, o surgimento de 71 casas abrigo, além de inúmeros núcleos e centros de apoio que prestam atendimento e orientação às mulheres vítimas, realizando trabalho de denúncia e conscientização social para o combate e prevenção dessa violência, além de um trabalho de apoio psicológico e resgate pessoal das vítimas. Também ocorreram mudanças no Código Penal como a retirada do termo "mulher honesta" e a adoção da pena de prisão para agressores de mulheres, em substituição às cestas básicas. A criação da Lei 11.340, a Lei Maria da Penha, para o enfrentamento da violência doméstica contra as mulheres. Mas, ainda assim as violências e o feminicídio continuam a acontecer. Vejamos o exemplo do Estado do Ceará: em 2007, 116 mulheres foram vítimas de assassinato no Ceará; em 2006, 135 casos foram registrados; em 2005, 118 mortes e em 2004, mais 105 casos[ii].
As mulheres estão num caminho de construção de direitos e de autonomia, mas a instituição do patriarcado continua a persistir como forma de estruturação de sujeitos.
É preciso que toda a sociedade se mobilize para desmontar os valores e as práticas que sustentam essa dominação masculina, transformando mentalidades, desmontando as estruturas profundas que persistem no imaginário social apesar das mudanças que já praticamos na realidade cotidiana.
O comandante da ação policial de resgate de Eloá declarou que não atirou no agressor por se tratar de "um jovem em crise amorosa", num reconhecimento ao seu sofrer. E o sofrer de Eloá? Por que não foi compreendida empaticamente a sua angústia e sua vontade (e direito) de ser livremente feliz?

5 comentários:

Anónimo disse...

Rosa, aqui esta todo um conjunto de ideias s/ o tema muito bem estruturadas.
Claro que darei destaque.
A verdade é que tambem adorava discorrer sobre algumas partes do texto consigo, "face to face".
Introduzir em tudo isto uma teoria muito "minha", que anda a amadurecer e cada vez vou tropecando em mais e mais evidencias que a confirmam...

Abraco
Marian

Anónimo disse...

qUANDO É QUE VAI ACONTECER?
Gostava de saber a sua teoria...vamos lá combinar esse encontro para breve..no dia 22 de Novembro? espero...

abraço e obrigada

rosa leonor

Anónimo disse...

muitos homens talves se sintam agredidos ao ler o texto.....
mas nao tamto quanto as mulheres nascidas num sistema patriarcal aonde a femininidade e vista com desprezo e inclusive denominada de passividade .uma mulher nao é passiva coisa nenhuma uma mulher carrega em si todos os aspectos da deusa senhora da caçada selvagem diviuna mãe e ancia sempre. os homens que me desculpem mas a força da transformação é uma força feminina

Anónimo disse...

Olha sou homem,
E acrdito que vc esta certa na maioria das coisas que diz,
Mas se acha que os homens de hoje não aquentam as tais mulheres maravilhosas que aparecem na televião eu digo:
Só se for aqueles que te pegaram.
conheço pessoalmente mulheres daquelas que desmaiaram durante o ato sexual,
e não estou falando de brutalidade na cama não, é prazer mesmo.
acho que vc é uma feminista, e como toda feminista só vê o homem como um objeto sexual, vc tambem deve ser assim, e tudo isso que vc escreve é sua justificativa para ser assim.

rosaleonor disse...

meu deus...homens que fazem desmaiar de prazer uma mulher, mas que bem que você pega...as mulheres!!!

- que ego de machinho a defender os seus dotes...e eu é que sou feminista e mal "pegada"? Olha, por cá de onde eu sou, disse lisboeta, quem se pega de caras são os touros na arena pelos forcados...muito machos e cheios de ego de tais façanhas. Já agora pode ir apregoar as suas qualidades para um blogue menos feminista...mais aberto a homens tão habilidosos como você.

rl