O SORRISO DE PANDORA

“Jamais reconheci e nem reconhecerei a autoridade de nenhuma pretensa divindade, de alguma autoridade robotizada, demoníaca ou evolutiva que me afronte com alguma acusação de pecadora, herege, traidora ou o que seja. Não há um só, dentre todos os viventes, a quem eu considere mais do que a mim mesma. Contudo nada existe em mim que me permita sentir-me melhor do que qualquer outro vivente. Respeito todos, mas a ninguém me submeto. Rendo-me à beleza de um simples torrão de terra, à de uma gotícula de água, à de uma flor, à de um sorriso de qualquer face, mas não me rendo a qualquer autoridade instituída pela estupidez evolutiva da hora. Enfim, nada imponho sobre os ombros alheios, mas nada permito que me seja imposto de bom grado Libertei-me do peso desses conceitos equivocados e assumi-me como agente do processo de me dignificar a mim mesma, como também a vida que me é dispensada. Procuro homenageá-la com as minhas posturas e atitudes e nada mais almejo. É tudo o que posso dizer aqueles a quem considero meus filhos e filhas da Terra. “ In O SORRISO DE PANDORA, Jan Val Ellam

sexta-feira, janeiro 06, 2023

NA FILOSOFIA PAGÃ...

"Na filosofia pagã, Pandora não é a fonte do mal; ela é a fonte da força, da dignidade e da beleza, portanto, sem adversidade o ser humano não poderia melhorar.
O nome "Pandora" possui vários significados: panta dôra, a que possui todos os dons, ou pantôn dôra, a que é o dom de todos/as (dos/as deuses/as).
...também significa a jarra (pithos) que “nada mais é que uma simples ânfora: um vaso muito grande, que serve para guardar grãos.
Este vaso só fica cheio através do esforço, do trabalho no campo, seu conteúdo então simboliza a condição humana.
Por consequência, será a Mulher que a abrirá e a servirá, para alimentar a família." W.

 Porque escrevo só para mulheres...

Pensei que seria oportuno e por varias razões, abordar a questão que me é posta tantas vezes porque não trato do "masculino sagrado" nem falo sobre "o poder do homem" - e eu escrever só para as mulheres - e também porque me lembrei que de facto eu me afasto e tenho afastado sempre de todos os movimentos e grupos de mulheres que incluem na sua linha um trabalho paralelo com o masculino, partindo do principio de que a mulher e o homem estão em harmonia e equiparados em relação aos princípios feminino e masculino e não estão...
O Principio masculino e o Homem reina e domina em todos os aspectos da expressão humana e social há milhares de anos e o Principio feminino e a mulher foram não só aglutinadas ao Homem como os seus valores sonegados e as mulheres aculturadas, suprimida a Deusa Mãe da sua história e a mulher privada da sua expressão natural, de médium ou mediadora das forças cósmica e telúricas.
E é ai justamente que todo o problema da mulher começa, pois toda a questão do FEMININO ESTÁ VICIADA E INCOMPLETA. .
Por um lado, compreendo que a mulher queira incluir nesta busca de si o homem, como par, mas então ela vai ter de passar por cima do padrão e ignorar, como aliás o faz, a que todos os homens e mulheres ainda estão sujeitos e a forma como secularmente a mulher foi totalmente submetida a todos os níveis ao Homem e continua a ser ainda hoje.
O perigo de um trabalho conjunto neste estado de coisas é que todas nós sabemos e assistimos vulgarmente a esta cena: desde que haja um homem presente numa sessão de trabalho ou se destaque por qualquer motivo a energia das mulheres vai forçosamente colocar-se na busca amorosa prioritariamente e a mulher fica de novo sujeita à atracção do do homem por sujeição sexual e emocional. Ela ai perde o discernimento e o sentido de identidade para dar lugar à fêmea...procriadora...tal como tem sido sempre e isso é também da natureza da mulher. Tenho visto e constatado como reuniões de mulheres onde existam homens se transformam em culto do homem...mesmo que inconscientemente. As mulheres estão prisioneiras dessa pulsão e não conseguem ter discernimento ou distanciamento. As mulheres vivem como se não tivessem uma individualidade própria porque são incapazes de se pensarem e sentir-se como entes separadas da programação patriarcal secular. Todas as religiões massacraram a mulher e a reduziram a um verbo de encher...e a dividiram entre a santa e a puta.
Por isso penso que a mulher deve seguir um caminho espiritual de encontro consigo mesma sozinha, e independentemente do homem. Não estou a dizer que não tenha marido ou um amante ou filhos. São coisas diferentes. Estou a falar do objectivo do trabalho sobre si e consigo enquanto mulher e individuo e não como uma função, de amante ou mãe, pois ser Mãe é maravilhoso e pode preencher completamente uma mulher, mas...a mulher tem de aprender a ser una em si e por si...

O trabalho que defendo e sobre o qual escrevo é exclusivamente sobre a "cisão da mulher", e sei que se esse trabalho não é feito, sem que a mulher seja consciencializada da sua divisão em duas, o que considero de suma importância, pois sem essa consciência nada vai conseguir. Se a mulher se entregar a qualquer pratica sem estar consciencializada desse conflito em si mesma, é esse conflito que vai refletir sobre as outras mulheres, e não vai conseguir atingir nenhuma realização numa dessas abordagens. Seja a xamânica, seja a tântrica ou a de qualquer abordagem pagã, ou mesmo no caminho da deusa, pois todas partem de uma ideia de equilíbrio já existente entre os dois sexos e os seus respectivos polos sem ter em conta quer a cisão da mulher quer o domínio ainda do homem e portanto ela não entende que séculos de negação do seu ser se possa resgatar em conjunto com o homem sem que o homem também faça um trabalho profundo consigo mesmo e em separado. Na realidade há ainda todo um trabalho de resgate da mulher em si e em primeiríssimo lugar até ela chegar à sua essência feminina da qual se afastou, a sua natureza ctónica e telúrica, para depois se poder ligar ao masculino ou poder trabalhar em conjunto com os homens.

Isto não quer dizer que eu não respeite e não ame os homens ou lhes seja adversa por si só. Não. Simplesmente a natureza da relação padrão inscrita no ADN dos homens e mulheres é ainda de sujeição e dependência da mulher e supremacia do homem sobre a mulher e os filhos. Até que a mulher se liberte desses padrões de submissão e sujeição e obediência implícita ao homem e ao macho, vergada ao peso dos valores vigentes, e uma sexualidade primária, o trabalho conjunto torna muito mais difícil senão impossível a mulher chegar a sua integralidade como mulher consciente.

Este caminho da mulher sozinha, é bem difícil de se fazer porque há que ter consciência da nossa prisão - primeiro a pulsão sexual primária e depois à sedução do masculino - e como o casamento por natureza a aprisiona social e biologicamente à natureza obrigatória de mãe e esposa...a qual exige da mulher toda a atenção e dádiva e assim não lhe resta tempo nem espaço nem vontade de se SABER OU SENTIR EM SI. O amor da mulher pelo filho ou pelo amante é dominante. E perguntamos, consegue a mulher viver sem um homem? Não...
Ora é aqui que travamos uma batalha....em que urge a mulher SER MULHER por si só sem apêndices e sem sucedâneos - para poder assim recuperar a sua natureza selvagem e ctónica e à sua identidade primeva - sem dúvida Lilith, a Mulher inteira que não se submeteu nem dependia do homem para nada, nem de deus... contra o qual se revoltou e se deu a s mesma a condição de Mulher Pandora.

Encarar esta perspectiva da mulher sozinha é para muito poucas mulheres a não ser as já maduras porque as jovens mulheres são totalmente seduzíveis e permeáveis à manipulação do macho...e esse é o curso natural dos sexos, mas urge hoje mais do que nunca uma tomada de consciência do Ser Mulher a nível mundial num momento em que há uma guerra silenciosa declarada contra as mulheres!

RLP

1 comentário:

rosaleonor disse...

Muito interessante a sua exposição...gostaria de falar-conversar consigo sobre este tema - tenho neste momento alguma preguiça em "argumentar" ou trazer elementos que justifiquem aminha tese...mas de facto tenho uma visão singular desta questão toda do feminino e que deixo de alguma forma penso que clara no meu livro, Lilith A Mulher Primordial e que responde exaustivamente a muitas das cosias que refuta ou contrapõe... Se acaso lhe interessar ler o meu livro gostaria muito de depois conversarmos pois penso que seria muito salutar colocar os nossos pontos de vista em dinâmica... e penso que mabas ficariamos enriquecidas. É rara haver mulheres que pensem no feminino... e claro que eu não quero dizer que a mulher tem de abdicar do amor de ser mãe e do sexo ou do homem para SER, mas que sim, é mais dificil entender a mulher na sua essência enquanto ela se vê em função dele e do filho e não dela mesma como mulher integrada, isto é, uma mulher plena. A minha tese, diria, é de que a cisão da mulher nesses estereotipos, da santa e da prostituta continua, embora bastante alargados em variantes do mesmo e que correspondem a uma versão moderna e até invertida dos mesmos...
Deixo-lhe o desafio...e agradeço a sua intervenção.
Sim, o google complicou as coisas...
rosa leonor