NÃO SOU ESPÍRITA NEM CRENTE EM DEUS...mas creio na reencarnação, na imortalidade da alma e no carma. Por isso este ponto de vista do Espiritismo parece-me muito próximo do que pessoalmente sinto.
EUTANÁSIA: SIM OU NÃO?
UM paradoxo existencial
"De tal forma era temida a morte repentina que podemos ler numa ladainha dos Santos daquela época «De uma morte repentina livrai-nos Senhor». Mas, na época atual, a boa morte é aquela que chega de repente, aquela que chega sem avisar. Na verdade vivemos como se a morte não existisse. Quando nos deparamos com esta inevitabilidade, não a suportamos e chegamos ao ponto de a querer antecipar. Cria-se assim um paradoxo existencial. E é nesse contexto que surge o conceito de eutanásia como a morte intencional de um doente, a seu pedido (firme e consistente), através da intervenção direta de um profissional de saúde, pressupondo-se a livre expressão da vontade individual."EUTANÁSIA: SIM OU NÃO?
Estando a eutanásia a ser discutida em Portugal, a Associação Médico Espírita do Norte (AME Norte Portugal) reuniu e debateu o tema, tendo concluído que deve comunicar o seu ponto de vista.
A AME Norte agrega um grupo de médicos e de outros técnicos ligados à área da saúde que, fora da sua atividade profissional, se interessa por espiritualidade, considerando importantes os dados proporcionados pela doutrina espírita.
O assunto é complexo pelo que não é de admirar que a maior parte das pessoas que sobre ele dão a sua opinião careçam de uma ideia mais esclarecida.
Refira-se que esta comunicação resulta de uma reflexão alargada e engloba vários tópicos: Introdução; Argumentos a favor e contra; O ponto de vista espírita; Conclusão.
INTRODUÇÃO
Eutanásia de forma simples quer dizer boa morte – ευθανασία: ευ "bom", θάνατος "morte”.
No entanto, a relatividade dos critérios do que seja uma boa morte revela-se até em determinadas culturas e em determinadas épocas. Nas culturas guerreiras, como a dos vikings ou a dos samurais, uma morte boa seria a que sucedia em combate, revestida de honra. Já na Europa da Idade Média a boa morte devia fazer-se anunciar a fim de que o moribundo pudesse tomar as suas últimas decisões. De tal forma era temida a morte repentina que podemos ler numa ladainha dos Santos daquela época «De uma morte repentina livrai-nos Senhor». Mas, na época atual, a boa morte é aquela que chega de repente, aquela que chega sem avisar. Na verdade vivemos como se a morte não existisse. Quando nos deparamos com esta inevitabilidade, não a suportamos e chegamos ao ponto de a querer antecipar. Cria-se assim um paradoxo existencial. E é nesse contexto que surge o conceito de eutanásia como a morte intencional de um doente, a seu pedido (firme e consistente), através da intervenção direta de um profissional de saúde, pressupondo-se a livre expressão da vontade individual.
Esta é, sem dúvida, uma questão controversa, sendo vários os argumentos contra e a favor do ponto de vista bioético. A doutrina espírita, com base nos princípios da existência de Deus, da imortalidade da alma, da pluralidade das existências e da lei de causa e efeito, estabelecendo uma ponte segura entre ciência e espiritualidade, acrescenta importantes argumentos contra a eutanásia.
ARGUMENTOS A FAVOR E CONTRA
Margaret Battin, Professora de Filosofia e Professora Adjunta de Medicina Interna da Universidade de Utah, debruçou-se sobre esta temática.
Através do apanhado que faz neste campo, sublinha que os argumentos a favor e contra a eutanásia divergem basicamente entre dois vetores – o direito de autonomia do ser e o valor da vida humana.
Os principais argumentos a favor ligam-se ao respeito pela autodeterminação da pessoa, bem como ao alívio da dor e do sofrimento, sugerindo na sua origem uma ideia de compaixão.
Por sua vez, os principais argumentos contra espraiam-se entre o caráter inviolável da vida humana, a integridade da profissão médica e o potencial abuso (rampa deslizante).
PRINCIPAIS ARGUMENTOS A FAVOR
Embora não concordando, constituindo estes os principais argumentos a favor da eutanásia, consideramos importantes referi-los permitindo, assim, uma reflexão mais abrangente e profunda.
Princípio da Autonomia:
O artigo 5.º da Comissão Nacional da UNESCO é invocado nas coordenadas da autonomia e responsabilidade individual: «A autonomia das pessoas no que respeita à tomada de decisões, desde que assumam a respetiva responsabilidade e respeitem a autonomia dos outros, deve ser respeitada». Este princípio de respeito pela autonomia e autodeterminação relaciona-se também com a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos.
Princípio da dignidade:
Invoca-se o chamado direito de morrer com dignidade, numa vertente de alívio de sofrimento, ou seja, a morte assistida seria um direito do doente que sofre e a quem não resta outra alternativa, por ele tida como aceitável ou digna, para pôr termo ao seu sofrimento. É um último recurso, uma última liberdade, um último pedido que não se pode recusar a quem se sabe estar condenado. Nestas circunstâncias, a morte assistida é um ato compassivo e de beneficência.
Por sua vez, John Harris descreve a teoria do utilitarismo, defendendo que, de acordo com essa teoria, a eutanásia pode ser eticamente adequada, chegando a dizer que é moralmente errado encurtar a vida de uma pessoa se desta forma se estiver a privar essa pessoa de alguma coisa que ela valoriza especialmente (tal como a vida). Contudo, obtido o consentimento, e se a pessoa deixar de valorizar a vida em si própria, não existe nada de intrinsecamente errado em permitir a morte assistida.
PRINCIPAIS ARGUMENTOS CONTRA
Inviolabilidade da vida humana:
As Constituições de vários países do mundo proclamam o direito à vida como direito fundamental. A Constituição da República Portuguesa (art. 24º) consagra a inviolabilidade do direito à vida.
A vida, pois, é um bem que a Constituição se obriga a manter e proteger. Por outras palavras podemos dizer que a legislação tem leis que visam proteger as pessoas de si próprias, como por exemplo, a obrigatoriedade de usar cinto de segurança no automóvel ou capacete numa mota. O "direito inalienável à liberdade" não se aplica em matérias de proteção da vida.
Princípio da Dignidade
O importante para se morrer com dignidade é permitir que se viva com dignidade. Não é o sofrimento que torna a morte indigna mas sim tudo aquilo que deixa de se fazer para o seu alívio, tendo em conta a sua dimensão física, psicológica, social, existencial e espiritual.
Estado mental do doente
Os doentes que solicitam a eutanásia estão frequentemente deprimidos ou sob o efeito de outra doença afetiva tratável, o que dificulta a avaliação e a decisão quanto à sua capacidade de tomada de decisões.
Walter Osswald a este propósito afirma que “na realidade, e na perspetiva da ética personalista, a eutanásia nunca é uma solução, dado que nenhuma pessoa nas suas plenas capacidades cognitivas e emocionais desejaria morrer. Assim, quem pede a eutanásia não quer viver naquela situação específica, pelo que se trataria apenas de um grito de desespero quanto à vida que está a ser vivida” .
Aqui novamente percebemos que é o estado do sofrimento não tratado, que leva a um desespero e a insuportabilidade da situação. Ou seja, questões de ordem psíquica como acolhimento e cuidados afetivos, ajudam a suportar o quadro clínico e a fomentar a esperança no tratamento. Torna-se importante termos consciência de que para além dos cuidados médicos que são necessários e indispensáveis, são necessários também os cuidados afetivos, já que estes alimentam um estado de ânimo fundamental para enfrentar o processo de adoecimento e morte.
Preservação da relação médico-doente:
Walter Osswald destaca a integridade da profissão médica afirmando que o pensamento médico não pode deixar de ser unívoco, como o tem sido através dos séculos: “a função e missão do médico consiste em curar ou aliviar e não em matar. A prática da eutanásia é considerada contrária aos objetivos nucleares da medicina, colocando em causa a sua essência e a sua moralidade interna”.7
Perigo da rampa deslizante
A teoria da rampa deslizante define que à medida que o tempo vai passando os critérios vão sendo menos restritos perdendo o rigor na sua regra de aplicação, ou seja quando generalizamos a utilização de um processo vamos banalizando e modificando o critério da sua aplicabilidade. No caso da eutanásia este alargamento de critérios pode estender-se ao nível social, familiar e individual, tornando-se na prática de eutanásia não voluntária.
Esta teoria demonstra que não existem mecanismos efetivos de controlo social que impeçam a prática da eutanásia em doentes que não tenham prestado consentimento livre e esclarecido para o efeito e, por isso, constitui má política pública a sua legalização.
A este propósito Pedro Vaz Patto afirma que “A experiência dos Estados que legalizaram a eutanásia revela que não é possível restringir essa legalização a situações raras e excecionais; o seu campo de aplicação passa gradualmente da doença terminal à doença crónica e à deficiência, da doença física incurável à doença psíquica dificilmente curável, da eutanásia consentida pela própria vítima à eutanásia consentida por familiares de recém-nascidos, crianças e adultos com deficiência ou em estado de inconsciência.”
(...)Os doentes que solicitam a eutanásia estão frequentemente deprimidos ou sob o efeito de outra doença afetiva tratável, o que dificulta a avaliação e a decisão quanto à sua capacidade de tomada de decisões.
Walter Osswald a este propósito afirma que “na realidade, e na perspetiva da ética personalista, a eutanásia nunca é uma solução, dado que nenhuma pessoa nas suas plenas capacidades cognitivas e emocionais desejaria morrer. Assim, quem pede a eutanásia não quer viver naquela situação específica, pelo que se trataria apenas de um grito de desespero quanto à vida que está a ser vivida” .
Aqui novamente percebemos que é o estado do sofrimento não tratado, que leva a um desespero e a insuportabilidade da situação. Ou seja, questões de ordem psíquica como acolhimento e cuidados afetivos, ajudam a suportar o quadro clínico e a fomentar a esperança no tratamento. Torna-se importante termos consciência de que para além dos cuidados médicos que são necessários e indispensáveis, são necessários também os cuidados afetivos, já que estes alimentam um estado de ânimo fundamental para enfrentar o processo de adoecimento e morte.
Preservação da relação médico-doente:
Walter Osswald destaca a integridade da profissão médica afirmando que o pensamento médico não pode deixar de ser unívoco, como o tem sido através dos séculos: “a função e missão do médico consiste em curar ou aliviar e não em matar. A prática da eutanásia é considerada contrária aos objetivos nucleares da medicina, colocando em causa a sua essência e a sua moralidade interna”.7
Perigo da rampa deslizante
A teoria da rampa deslizante define que à medida que o tempo vai passando os critérios vão sendo menos restritos perdendo o rigor na sua regra de aplicação, ou seja quando generalizamos a utilização de um processo vamos banalizando e modificando o critério da sua aplicabilidade. No caso da eutanásia este alargamento de critérios pode estender-se ao nível social, familiar e individual, tornando-se na prática de eutanásia não voluntária.
Esta teoria demonstra que não existem mecanismos efetivos de controlo social que impeçam a prática da eutanásia em doentes que não tenham prestado consentimento livre e esclarecido para o efeito e, por isso, constitui má política pública a sua legalização.
A este propósito Pedro Vaz Patto afirma que “A experiência dos Estados que legalizaram a eutanásia revela que não é possível restringir essa legalização a situações raras e excecionais; o seu campo de aplicação passa gradualmente da doença terminal à doença crónica e à deficiência, da doença física incurável à doença psíquica dificilmente curável, da eutanásia consentida pela própria vítima à eutanásia consentida por familiares de recém-nascidos, crianças e adultos com deficiência ou em estado de inconsciência.”
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